“O vinil morreu”, ouve-se dizer desde que apareceu o Compact Disc (CD) no final dos anos 1980. Os números comprovaram esse vaticínio, mas passados alguns anos a nostalgia fez com que a venda do vinil voltasse a subir. Alguns defendem que não se trata apenas do suporte negro contra os bits e bytes da música digital, ou da beleza das capas grandes dos álbuns de vinil em confronto com as caixas (minúsculas) dos CD, ou até do som único e envolvente da rodela de vinil e da rotação hipnotizante no prato do gira-discos a 33 ⅓. A música está para além do som que sai das colunas, defendem os puristas.

O vinil não está morto (tem até um dia anual dedicado – 12 de agosto), os números demonstram que as vendas deste suporte continuam a subir, muito à custa de edições especiais. Há até artistas que começam por publicar os seus trabalhos primeiro em vinil (e até em cassete) antes de os disponibilizarem nos serviços digitais — tais como o iTunes ou o Spotify. Jogada de marketing ou manifesto cultural, é também uma maneira de fazer dinheiro a partir do suporte musical, numa altura em que a indústria ainda não encontrou soluções sólidas para rentabilizar o negócio da música. O paradigma mudou, primeiro do físico para o digital, depois da música para a experiência que se lhe soma nos espetáculos ao vivo; é aí que a maioria dos artistas fazem dinheiro. Ao vivo e no YouTube.

Para provar que, ao contrário da música digital, cada vinil é uma peça única, o artista Rutherford Chang apresentou há um ano em Nova Iorque a exposição “We Buy White Albums” (Nós Compramos Álbuns Brancos). A referência é literal ao disco homónimo dos Beatles que ficou conhecido por “The White Album” (1968), do qual tem vindo a adquirir cópias (já vai em 1019). Nesse evento fez uma experiência para demonstrar a exclusividade sonora de cada peça, realçando a impressão digital única que fica registada pela utilização de cada rodela de vinil (bem como as subtis diferenças entre edições). Gravou o som de 100 exemplares do “The White Album” e colocou-os a tocar exatamente ao mesmo tempo. O resultado foi um início harmónico e audível, mas à medida que o tempo (o disco) avança desenvolve-se uma cacofonia que seria impossível de obter com idêntica sobreposição de música digital. O resultado foi este:

https://soundcloud.com/rc428/side-1-x-100

A explicação é simples: com o uso, os sulcos impressos no vinil vão sendo alterados pelas irregularidades provocadas pela pressão da agulha, pelos pequenos riscos que resultam do uso e do tempo (e da sujidade) que vão modificando o perfil das trilhas do vinil e na prática isso provoca ligeiros atrasos na reprodução, que se vão acentuando à medida que o disco avança (clique para a frente — aos poucos — na faixa acima e perceberá essa alteração mais facilmente). Este efeito é impossível de reproduzir com faixas digitais, porque “zeros e uns” não se riscam ou desaparecem. Esta experiência feita por Rutherford Chang demonstra que cada disco de vinil é único e que guarda, como se fosse uma memória, o registo da sua utilização e hábito do utilizador.

Uma vez mais, o vinil não está morto e além disso, está a ser reinventado. O álbum “Lazzaretto” de Jack White (o disco de vinil mais vendido desde 1994) foi publicado numa edição chamada de “Ultra LP”, por conter muito além de música. Toca do lado de dentro para fora, inclui um loop, tem dois começos diferentes para uma mesma canção (uma acústica e outra elétrica), tem música impressa por baixo da rodela de papel do centro do disco e toca a diferentes velocidades. A maioria destas características nunca foram usadas num vinil e demonstram que a tecnologia (e a imaginação) estão a rejuvenescer a indústria. Veja neste vídeo as explicações e detalhes técnicos pela voz do próprio Jack White:

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