É “rápido” e “cabeceia muito bem”. Dizia que era “agressivo”, que jogava à esquerda ou à direita com a mesma qualidade. Aliás, com “muita qualidade”. E mais: era “lesto”. Ou seja, desembaraçado e ágil, segundo o dicionário. Eis Maurício Nascimento. Ficou conhecido pelo primeiro nome e, em junho de 2013, era assim que Argélico Fucks, conhecido por Argel, descrevia o defesa central que o Sporting acabara de caçar no Brasil. O mesmo, o brasileiro, que em outubro de 2014 embaraçou os leões em 14 minutos.

Nem um quarto de hora demorou. E até aí a equipa estava bem. E sentia-se bem. Via-se. Era como se a bola fosse amparada por pantufas quando estava em pés leoninos: a equipa de Marco Silva trocava a bola, repetia passes, até os arriscava e obrigava o Schalke 04 a recuar e a encolher-se junto à sua área. O motor de Nani até foi o primeiro a aquecer, logo aos 2’, quando um remate que tentou, na esquina da área, fez a bola passar perto do poste direito da baliza alemã. O leão queria ser mandão.

O percalço, o primeiro, apareceu ao tal 14.º minuto. E pintou-se de amarelo. Da mesma cor do cartão que o árbitro sacou do bolso e mostrou a Maurício. Não fazia mal. Pelo menos dois minutos depois, quando um canto, marcado por João Mário, deu uma alegria. Mas não parecia — o médio marcou-o com um passe rasteiro, a rolar numa relva irregular que fez a bola saltitar até perto da marca de penálti. A inércia invadiu os jogadores do Schalke. Nem se mexeram. Mexeu-se Nani, que pontapeou a bola de primeira e, mesmo com um remate frouxo, acabou por marcar. 1-0 e, afinal, começava bem.

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A equipa de Marco Silva estava bem. A outra, a germânica, só agora começava a acordar da cautela com que Roberto di Matteo a amarrara. Nada de novo. Em 2012 foi assim, à espera do que o adversário pudesse fazer e a contra ataca-lo quando este errasse, que o italiano vencera a Liga dos Campeões com o Chelsea. Agora era preciso acordar. E o Schalke fê-lo, logo aos 17’, quando Julian Draxler, o jovem alemão, craque da equipa — e campeão do Mundo pela Alemanha — rematou de primeira a bola vinda de um cruzamento de Obasi, na direita. Não acertou na baliza. Três minutos depois, Adrien, com uma avenida aberta à frente, rematava para Fährmann defender.

Depois o jogo acalmou. Ninguém parecia conseguir inventar coisas perigosas para a baliza contrária. Tudo estagnara. Até Maurício agitar. Como? Ao saltar contra as costas de Kevin-Prince Boateng, quando o ganês já cabeceara a bola, a uns 30 metros da baliza. Perigo não havia nenhum. Calma também se viu pouca. O árbitro apitou, a falta foi dura e o amarelo voltou-se a ver. Ou seja, depois veio o vermelho que tirou Maurício do jogo aos 33 minutos — era a primeira expulsão do central brasileiro em 40 jogos pelo Sporting. Agora sim, a coisa piorava.

E piorou mesmo. No minuto seguinte, no livre que a falta deu, os germânicos empataram. Obasi, de costas para a baliza, cabeceou a bola e fê-la bater mesmo à frente das mãos que Rui Patrício esticara, quando estava já na relva, deitado. O plano seria agarrar a bola logo ali. O que saiu foi um frango do forno, quando a bola lhe ressaltou nas mãos, saltou por cima do obstáculo e se enfiou na baliza. Era o 1-1 e o sétimo encontro consecutivo de Rui Patrício a sofrer golos na Europa.

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Até ao intervalo foi aguentar, aguentar e aguentar. William fez de central até João Mário sair, Naby Sarr entrar e os leões se fecharem a defender. Depois, para a segunda parte, a missão era a mesma, com um olho guardado para contra atacar sempre que possível e aproveitar os turbos de Nani e Carrillo que Marco Silva optara por deixar no relvado. A primeira novidade, porém, foi outro golo do Schalke. Um contra ataque chegou a Draxler, na esquerda, que teve tempo para dominar a bola, levantar o olhar, pensar e passá-la para Choupo-Moting. O camaronês, ao ver Huntelaar desmarcar-se, meteu-lhe a bola no caminho, viu o holandês derrubar Jonathan Silva com o corpo e marcar o 2-1.

Era preciso reação. Com menos era complicado, claro, mas ela teria que aparecer. Mas nada. Aos 60’, o que surgiu foi mais um golo alemão, agora de Benedikt Höwedes, central que, num canto, saltou alto para cabecear uma bola que nenhum leão conseguiu cortar. De novo uma bola que começou parada feria o leão com um golo. 3-1 e tudo mais difícil. Bem difícil. Até que, do nada, uma correria de André Carrillo, com bola, acaba com o peruano a ser derrubado por Höwedes dentro da área. Penálti — e sinónino de pontapé de Adrien Silva. Um remate que deu resultado. Apareceu o 3-2, o Sporting reduzia a desvantagem e o médio marcava o 9.º golo de grande penalidade enquanto leão.

O rastilho da esperança acendia-se aos 64’. E doze minutos depois incediava-se. No entretanto os germânicos tremeram. Sentiram o adversário a perder a timidez, a arriscar ao invés de se resguardar no homem que tinha a menos. Deu resultado. Numa das poucas jogadas que conseguiu pensar e desenhar com calma, na segunda parte, a bola chegou a Cédric, na direita, pedindo-lhe que a cruzasse pelo ar. O lateral obedeceu e enviou-a para a zona do segundo poste, onde apareceu a cabeça de Adrien Silva. Golo, 3-3 e, agora sim, esperança em vencer.

Faltava pouco para o jogo fechar a pestana e o Sporting jogava como se, em número de pernas, estivesse de igual para igual. Até aos 90’, contudo, pouco mais fez. O cansaço era muito, a cabeça para pensar pouca e a desorganização fazia-se notar. Idem para o Schalke, que nada de perigoso conseguia criar contra um adversário que acordara do pesadelo. Ou seja, nada se passou. Nada até aos 93’, ao terceiro minuto para lá da hora — quando um cruzamento caiu na área do Sporting e Huntelaar, de cabeça, atirou a bola contra a cara de Jonathan Silva.

Uns alemães gritaram, o árbitro manteve-se calado e a jogada ia prosseguir. Mas não: o oficial de baliza, aquele que está ali, em cima da linha de fundo, viu um penálti. Disse-o ao árbitro principal e ouviu-se um apito. Era mesmo grande penalidade. O lateral argentino nem queria acreditar. Mas teve de o fazer quando Choupo-Moting, segundos depois, rematava para o lado contrário para onde Rui Patrício se atirara. O 4-3 batia à porta e entrara com a ajuda do árbitro de baliza.

Pouco depois, o fim. Sem que os leões conseguissem fazer algo mais. “É inglório para os jogadores”, lamentava Marco Silva, no final, já depois de Adrien ver como “demasiado óbvio” o erro de arbitragem. Agora já nada muda. O Sporting sai da Alemanha com a segunda derrota seguida na fase de grupos, permanece com um ponto no bolso — igual ao Maribor, que foi a Londres perder 6-0 frente ao Chelsea — e fica a três do Schalke 04. Nada está partido. Só fica mais difícil. Como ficou em Gelsenkirchen, onde os leões conseguiram, pela primeira vez, marcar três golos num relvado alemão. Onde só tombaram com um penálti que uma pessoa viu.