Nem mais, nem menos. As opiniões não variavam. Era “bom”, não se desviava dos procedimentos, sempre certinho e “considerado excecional”. São adjetivos, palavras que mostram o que os olhos de outros viam em Iriyanto — neste caso os de Hadi Tjahjanto, um colega que consigo treinara mos tempos da Força Aérea indonésia. Mas os números, esses, não enganam — o indonésio, de 53 anos, acumulara já mais de 20 mil horas no ar, a voar e a pilotar aviões. Iriyanto destacava-se no que fazia. E foi o último voo que fez a destacar o seu nome.

Terá sido, porventura, o único que correu mal. Iriyanto até o terá antevisto já que, minutos antes das 7h24, hora a que o AirBus 320-200 perdeu contacto com o controlo de tráfego aéreo, pediu para alterar a altitude na qual mantinha o voo QZ8501 da AirAsia. Nada feito: os controladores aéreos responderam com um não. Ou um “nim”, já que apenas autorizaram o avião a subir até aos 34 mil pés. Assim o comunicaram, via rádio, mas nunca chegaram a obter uma resposta. Iriyanto, sabe-se hoje, pediu para elevar o AirBus até aos 38 mil, para evitar uma tempestade que se ia cruzar no caminho do avião.

Seria a última vez que Iriyanto ouviria um não. A primeira fora anos antes, muitos, quando quis despedir-se da adolescência com uma entrada academia de voo da Força Aérea da Indonésia. Não conseguiu. Por isso recorreu à paciência. Esperou e, durante uma década, foi subindo de patentes na Força Aérea, como conta a Bloomberg. Chegaria a tenente, sem nunca largar o sonho. “Era mais feliz quando pilotava aviões a jato. É o seu sonho”, revelou o pai, Suwarto. Chegou a cumpri-lo na Força Aérea, onde lá conseguiu pilotar jatos F-16 e F-5.

Ainda fala e conjuga frases no presente. “É muito esperto. E a sua experiência a pilotar aviões a jato torna-o muito capaz de voar em aviões comerciais”, prossegue. Com razão, pois Iriyanto, depois de abandonar a Força Aérea indonésia, trabalhou em duas companhias aéreas antes de, em 2008, se juntar à AirAsia. Foi lá, na transportadora que se transformaria na maior low-cost do continente asiático, que Iriyanto acumularia 6.053 horas de voo. Daí ter sido ele o comandante do AirBus que desapareceu na madrugada de domingo.

O segundo piloto, por exemplo, tinha no registo apenas 2.247 horas de voo. Nenhuma hora, entre os dois, evitou o que todos já veem como uma tragédia. A segunda, neste caso, para Iriyanto — a 20 de dezembro perdera o irmão. O momento em que todos se juntaram para chorar a sua morte foi a última vez que Iriyanto viu a sua família. “Quando estou com os miúdos tenho que ser forte, enfrentar a vida e seguir em frente”, confessou Widiya Sukati Putri, mulher com quem Iriyanto teve dois filhos: Arya, de sete anos, e Angela, de 25.

Iriyanto, por norma, até entrava num avião para o voar até Kuala Lumpur, capital da Malásia. Este tinha como destino a Singapura. “As rotas estão sempre a mudar”, desabafa Widiya, conformada, tal como o pai do piloto, ao sublinhar que, quer “um homem viva ou morra”, só “Deus decide”. Iriyanto sonhou, quis e decidiu pilotar aviões. E quis o trabalho que fosse ele a comandar a aeronave que, agora, o mundo quer descobrir onde está.

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