Em resposta às questões colocadas pela TVI, José Sócrates afirmou que não tinha sido confrontado com factos quando foi interrogado pelo juiz Carlos Alexandre e que dava esta entrevista “em legítima defesa contra uma agressão feita cobardemente”.

O ex-primeiro-ministro avançou que a corrupção pela qual o indiciam é uma “pura invenção”, “uma hipótese de trabalho teórica da investigação” e que tinha sido detido sem lhe terem sido referidos factos ou provas. “É uma imaginativa cascata de presunções. Mas não passa disso“, referiu.

“A prisão preventiva foi aqui utilizada para investigar, mas também para aterrorizar, para despersonalizar e para calar”, disse.

José Sócrates afirmou que não tinha a mínima dúvida de que a sua prisão preventiva era ilegal e que desse ponto à suspeita de perseguição política era apenas “um pequeno passo”. Sobre as prisões de Carlos Santos Silva e de João Perna, o ex-primeiro-ministro referiu que tinham sido ordenadas, tal como a sua, sem terem sido apresentados factos que as fundamentassem.

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“Grave é que se tenham degradado tanto os valores do nosso Estado de Direito a ponto de se ter instalado uma cultura de tolerância para com tudo isto: prisões sem provas ou sequer fortes indícios de crimes, que ao menos se perceba quais são! Lamento dizê-lo, mas daqui à suspeita de perseguição política não é um passo de gigante, é um pequeno passo”, disse José Sócrates.

José Sócrates confirmou que recorreu várias vezes a empréstimos que Carlos Santos Silva lhe concedeu para que pudesse pagar algumas despesas, “face a algumas dificuldades de liquidez”, mas que não lhe parecia que pedir dinheiro emprestado a um amigo fosse crime. “Sempre foi, como continua a ser, minha intenção pagar-lhe o que for devido, apesar da informalidade da nossa relação e da grande amizade pessoal que nos une”, reforçou.

Sobre as malas de dinheiro que João Pernas terá levado a Paris, o ex-primeiro-ministro adianta que essa é a “dimensão galáctica da investigação”. “Nunca o meu motorista foi a Paris; nunca me levou nenhuma mala de dinheiro; e nunca o meu carro foi além de Espanha”, disse.

Quanto às casas de Paris, Sócrates refere que, “além de falsa, é um verdadeiro monumento ao absurdo” e que a verdade é que viveu apenas durante 10 meses no apartamento de Carlos Santos Silva, a convite do amigo, acabando por sair quando as obras de valorização começaram.

“Enquanto as obras não começaram, aproveitei o convite e fiquei lá; assim que as obras começaram, tive de sair e procurar por mim outras soluções. Há suspeitas que só existem quando se quer muito acreditar nelas!”

A venda da casa da mãe e os negócios de futebol com Rui Pedro Soares não ficaram fora das respostas do ex-primeiro-ministro. Sobre o primeiro assunto, Sócrates revelou que a venda não tinha aumentado “em nada” o seu património ou o da família” e que o processo de venda não tinha sido “simulado”, como é dito. “Esta é apenas outra história mal contada por quem conduz esta investigação contra mim”, revelou.

Quanto aos negócios com Rui Pedro Soares, o ex-governante adianta que não tem nada que ver com os negócios que existiram entre Carlos Santos Silva e o empresário do Porto. “Este ponto, se não fosse trágico, era de rir à gargalhada”, disse, acrescentando que o que mais o impressionava era “o fantástico silogismo da investigação, de extraordinário alcance”. E exemplifica: “Carlos e Rui fazem negócios; Carlos e Rui são amigos de José; logo, José está envolvido nos negócios. Notável, não vos parece?”, ironiza.

José Sócrates esclareceu ainda que não fazia “a mínima ideia” de que estava a a ser investigado até acontecerem as buscas à casa onde o filho mora e que o processo tem “contornos políticos”. “Veremos quais. Como já disse, isto ainda agora começou”, concluiu.

 

A entrevista exclusiva de Sócrates à TVI esta sexta-feira à noite transcrita, na íntegra, abaixo.

“Dou esta entrevista em legítima defesa contra a sistemática e criminosa violação do segredo de justiça e contra a divulgação de “informações” manipuladas, falsas e difamatórias, em legitima defesa, contra a transparência do julgamento para uma praça pública onde só pode fazer-se ouvir uma voz e onde só pode circular livremente uma versão deturpada das coisas. Em legítima defesa contra uma agressão feita cobardemente, a coberto do anonimato, como é típico dos aparelhos burocráticos onde reina o “governo de ninguém” – “ninguém” o exerce, “ninguém” presta contas. Esse poder obscuro é puro arbítrio e despotismo: impunidade absoluta, limitação infundada e desproporcionada de direitos fundamentais, segredo imposto apenas à defesa, proibição de entrevistas, impossibilidade de contraditório, condenação antes de qualquer julgamento, sansão antes de qualquer sentença.

Este poder, quero crer, não durará. É precário como todos os poderes assentes no medo e sobreviverá apenas até à plena tomada de consciência do perigo que representa para o processo penal justo, fundamento primeiro do Estado de Direito. No que me diz respeito, responsabilizo diretamente os que, tendo o processo à sua guarda, não o guardaram como deviam. Como está à vista de todos, não estiveram à altura das suas responsabilidades e não fizeram bem o seu trabalho. O que não me deixa outra alternativa senão fazer tudo o que estiver ao meu alcance para defender a minha honra e o meu bom nome.

Faço-o aqui, respondendo às perguntas que me foram entregues através do meu advogado, porque foram as primeiras a chegar. Lamento que o jornal Expresso, com o qual combinei uma entrevista tenha decidido publicar as suas perguntas (antes mesmo de eu as conhecer) desacompanhadas das respetivas respostas. mas que fique claro: não deixarei nenhuma pergunta assim, a pairar no ar, acrescentando dúvidas sem obter a devida resposta.”

Foi confrontado com provas, quando foi interrogado pelo juiz Carlos Alexandre?

Essa é a questão essencial. Não, não fui – nem confrontado com factos quanto mais com provas. E isto é válido para todos os crimes que me imputam, que considero gravíssimos para quem exerceu funções públicas. Tomemos, por exemplo, e por economia de resposta, o crime de corrupção que é, para mim, mais detestável, o mais ignominioso que pode ser imputado a um ex-governante. Pois bem, apesar da minha insistência, nunca, em nenhum momento, nem a acusação nem o juiz foram capazes de me dizer quando e como é que fui corrompido, onde ou sequer em que país do mundo essa corrupção aconteceu, nem por quem, a troco de quê, qual a vantagem que obtive ou qual a que concedi, lícita ou ilícita.

Nada, rigorosamente nada! Esta é a verdade, por estranho que pareça – e deve parecer estranho porque não conheço nenhum caso semelhantes de corrupção – a corrupção em nome da qual me sujeitaram à infâmia desta prisão preventiva é uma pura invenção, uma “hipótese de trabalho” teórica da investigação, de um crime presumido, sem qualquer concretização ou referência no tempo ou no espaço e do qual não há nem podem existir indícios ou provas.

O que afirmo, portanto, é que fui detido e preso (preventivamente) sem me terem sido referidos nem factos nem provas de que tenha cometido quaisquer crimes, a começar pelo crime de corrupção que estaria na origem de tudo. A partir daí, este processo é todo ele uma caixinha de presunções em que as presunções assentam umas nas outras numa construção elaborada, absolutamente delirante. Começando por presumir, sem qualquer sustentação digna desse nome que o dinheiro do eng.º Carlos Santos Silva é afinal meu, deu-lhes para presumir, embora sem qualquer prova ou indício, que obtive esse dinheiro através de corrupção, sabe-se lá quando nem onde. E é com base nesta teoria, toda ela inventada, que presume também os outros crimes, porque a partir daí, todas as movimentações financeiras daquele dinheiro são entendidas como operações minhas que configuram branqueamento de capitais e fraude fiscal. É uma imaginativa cascata de presunções. Mas não passa disso.

Como já escrevi, a prisão preventiva foi aqui utilizada para investigar mas também para aterrorizar, para despersonalizar – e para calar. Hoje, quero dizer mais: neste caso, prendeu-se também para, em certo sentido, para “provar”. Porque quem quis esta prisão infundada sabe bem que a prisão funciona como prova aos olhos da opinião pública – “Se está preso alguma coisa deve ter feito”, é o que as pessoas tenderão a pensar. E muitas, na sua boa-fé, estarão convencidas que para haver prisão preventiva é porque hão de existir, na parte ainda secreta do processo – que por azar, logo aquela única parte a que os jornais não conseguiram ter acesso… – “provas muito sólidas” ou pelo menos “indícios muito fortes da prática dos tais crimes graves. Mas a verdade é que não há. E todos sabemos que se isso existisse já teria sido publicado nos jornais do costume! Só que, entretanto, aos olhos da opinião pública a prisão substituiu-se ao processo, à investigação, à instrução, aos indícios, às provas, ao contraditório, ao julgamento – e até à sentença.

Afinal, se ele está preso, que mais é que é preciso provar? A resposta, porém, por estranho que pareça, é esta: tudo. Falta provar rigorosamente tudo. Isto, obviamente, é gravíssimo. Mas não é, ao contrário do que alguns têm dito, um problema da lei, que até evoluiu no sentido de contrariar o abuso da prisão preventiva. Não tenho a mínima dúvida de que esta prisão preventiva é ilegal e por isso confio no sucesso do recurso que a minha defesa apresentou. Grave é que se tenham degradado tanto os valores do nosso Estado de Direito a ponto de se ter instalado uma cultura de tolerância para com tudo isto: prisões sem provas ou sequer fortes indícios de crimes, que ao menos se perceba quais são! Lamento dizê-lo, mas daqui à suspeita de perseguição política não é um passo de gigante, é um pequeno passo.

Como encara o que está a acontecer? E, caso tenha acesso, como encara o que tem sido publicado?

Ao que já foi dito, junto apenas a observação seguinte: à prisão física sempre quiseram somar, em certo sentido, a prisão na opinião pública. De um lado, podem ser divulgadas todas as mentiras e todas as falsidades; do outro, são proibidas as entrevistas e coartado o direito de defesa da honra. Não me submeto a tal imposição, que é contrária aos direitos fundamentais. Mas sei que quando decidiram proibir-me de falar, o que pretendiam conseguir era que tudo estivesse do lado deles – o procurador, o juiz, os jornais. E podem, de facto, ter muito do lado deles. Menos a verdade. Essa, não está do lado deles. E é pelo triunfo da verdade que lutarei.

Como classifica a prisão do seu amigo Carlos Santos Silva e do seu motorista João Perna?

Ambas são, cada uma à sua maneira, injustas e injustificadas. No fundo, essas prisões foram ordenadas, como a minha, sem factos que as possam fundamentar. E isso é terrível! No caso de João Perna, tratou-se, patentemente, de utilizar a prisão para aterrorizar uma pessoa que julgavam vulnerável de modo a tentar obter sabe-se lá que informação. Um abuso. No caso do engenheiro Carlos Santos Silva, dói-me profundamente a sua situação, que permanece. Somos amigos há 40 anos, a nossa amizade é anterior ao início da nossa atividade profissional. É uma relação especialmente fraterna. E não posso esquecer que este meu amigo está a sofrer na prisão essencialmente por ser meu amigo e por me ter ajudado quando precisei.

Que comentário lhe merece as suspeitas que têm surgido a propósito do apartamento de Paris e do seu estilo de vida, da venda das casas da sua mãe, dos negócios com Rui Pedro Soares, das entregas de dinheiro que Carlos Santos Silva lhe fez, e das idas a Paris do seu motorista alegadamente com malas de dinheiro?

Respondo, um a um, aos vários pontos referidos, porque é preciso que nada fique por esclarecer. Mas não quero deixar de chamar a atenção para o mais importante: os “factos circunstanciais” que me imputam não têm rigorosamente nenhuma conexão com crimes. Nenhuma. Por vezes chega a ser difícil separar a investigação e as notícias que têm vindo a ser publicadas da pura bisbilhotice (ou devassa). Mas vamos por partes.

A) As “entregas de dinheiro” do Eng. Carlos Santos Silva

Confirmo, sem qualquer problema, que face a algumas dificuldades de liquidez que atravessei em certos momentos, sobretudo desde que tive parte da minha família em Paris e eu próprio vivi entre Lisboa e aquela cidade, recorri várias vezes a empréstimos que o meu amigo Carlos Santos Silva me concedeu para pagar despesas diversas. Mas, sinceramente, não me parece que pedir dinheiro emprestado a um amigo seja crime, nem aqui nem em nenhuma parte do Mundo! Sempre foi, como continua a ser, minha intenção pagar-lhe o que for devido, apesar da informalidade da nossa relação e da grande amizade pessoal que nos une desde há muitos anos. É um assunto que resolverei com ele e que só a nós diz respeito.

Para o caso, o que importa deixar claro é que o facto de o Engenheiro Carlos Santos Silva me ter emprestado dinheiro, muito ou pouco, não transforma o dinheiro dele em dinheiro meu! Isso, convenhamos, é um completo disparate! Acontece que o Engº Carlos Santos Silva detém, como é sabido, meios próprios de fortuna pessoal fruto da sua diversificada atividade empresarial em vários países do Mundo. E, sendo meu amigo, esteve disponível para me ajudar quando eu precisei. Estou-lhe grato por isso. Mas não deixarei de lhe pagar! A afirmação de que o dinheiro dele é meu é simplesmente absurda e não tem qualquer fundamento.

B) O motorista, Paris e as “malas de dinheiro”

Aqui entramos na dimensão galáctica da investigação. A verdade, como já foi explicado pelo meu advogado, é esta: nunca o meu motorista foi a Paris; nunca me levou nenhuma mala de dinheiro; e nunca o meu carro foi além de Espanha (onde fui passar curtos períodos de férias e pouco mais). Mas o que acho curioso é que certos jornais e certos jornalistas se tenham disponibilizado para escrever que haveria no processo fotografias fatais do motorista a transportar as tais “malas de dinheiro” para Paris. Porque é exatamente aqui que toda esta história passa do cinzento filme policial para o mundo fantástico da ficção científica: o momento memorável em que surgem em cena essas máquinas fotográficas tão espantosas e tão avançadas que tiram fotografias onde até se consegue ver o que vai dentro das malas…!

O facto de a acusação ter posto a correr nos jornais esta pura invenção diz muito sobre os métodos de uns e de outros. E mostra bem até onde estão dispostos a ir para me atingir. Não tenho, hoje, a menor dúvida: para alguns, vale tudo.

C) O “apartamento de luxo” em Paris

Factos. Em 2011, depois de sair do Governo, aluguei um apartamento em Paris, onde vivi um ano. Só mais tarde, a partir de meados de 2012, e por cerca de 10 meses, habitei num outro apartamento, o tão falado “apartamento de luxo” de que é proprietário o meu amigo Engº Carlos Santos Silva. Residi aí apenas enquanto não começaram as obras de restauro que ele tinha planeado para recolocar esse apartamento no mercado (como de facto fez, a partir de finais de 2013). Assim, quando as obras começaram (Verão de 2013), saí desse apartamento, tendo a minha família passado a viver num aparthotel, durante cerca de 4 meses (Setembro a Dezembro de 2013). Depois, desde Janeiro de 2014, aluguei um novo apartamento, onde vivi, e viveu também a minha família, ao longo do último ano. No momento em que escrevo, ainda estou a pagar essa renda (sendo que o contrato termina em 31 de Dezembro de 2014).

A tese que me imputa ser eu o dono do famoso “apartamento de luxo” de Paris, para além de não ter a mais pequena sustentação – que não tem – é também completamente absurda! Como será óbvio para quem esteja de boa-fé, se eu quisesse realmente comprar uma casa para ficar durante o período do meu curso em Paris (cerca de dois anos) não iria escolher, já quase no final do primeiro ano, um apartamento a precisar de obras, para depois ter de enfiar a minha família durante meses num aparthotel! E menos sentido faz que eu, sendo alegadamente proprietário (por interposta pessoa) desse tal “apartamento de luxo”, tenha precisado de alugar um novo apartamento a partir de Janeiro de 2014, quando já estavam concluídas as obras no fantástico apartamento que dizem ser “meu”!! Por aqui se vê que toda a tese da investigação sobre as casas de Paris, além de falsa, é um verdadeiro monumento ao absurdo. Vejamos: através do meu amigo, eu teria comprado um apartamento de luxo para morar durante o meu curso em Paris; por razões que a razão desconhece, em vez de escolher um apartamento pronto a habitar, fui logo escolher um apartamento que precisava de obras; e quando terminaram as obras, em vez de ir morar para lá, “à grande e à francesa”, acabei afinal por ir morar para outro lado, um apartamento mais pequeno que aluguei e tive de pagar! Creio que todos já terão compreendido o óbvio: nada disto faz sequer sentido.

Em contrapartida, a verdade, talvez por não ser inventada, tem também a vantagem de ser muito mais compreensível do que a absurda teoria da investigação: durante a minha permanência em Paris, entre outras soluções em apartamentos que aluguei e em aparthoteis em que fiquei, houve um período de apenas 10 meses em que, a convite do meu amigo Engº Carlos Santos Silva, residi num apartamento que ele ali comprou como investimento imobiliário, com a intenção de o valorizar (fazendo obras) e depois revender com lucro – como está, de facto, a tentar fazer. Enquanto as obras não começaram, aproveitei o convite e fiquei lá; assim que as obras começaram, tive de sair e procurar por mim outras soluções. Há suspeitas que só existem quando se quer muito acreditar nelas!

D) A venda da casa da minha mãe

Respondo à questão da venda do apartamento da Rua Braamcamp, já que a venda dos outros dois (no Cacém) foi conduzida pelo meu falecido irmão e não tenho ainda comigo todos os elementos (só poderia citar os pormenores de memória, por ouvir dizer, e não quero correr o risco de errar). Mas da venda da casa da minha mãe em Lisboa ocupei-me eu e conto rapidamente a história, que é simples. Em 2011, quando fui viver para Paris, a minha mãe ficou a viver sozinha no prédio da Braancamp. Em 2012, comunicou-me que queria ir viver para outro apartamento que tem em Cascais, onde teria pessoas queridas por perto. Uns tempos depois, eu próprio falei com o Eng. Carlos Santos Silva e contei-lhe da vontade da minha mãe, tendo ele manifestado interesse em comprar o apartamento que iria ficar disponível em Lisboa, desde que o preço fosse razoável.

Assim, pediu-se uma avaliação prévia do valor do imóvel, estabeleceu-se o preço, fez-se a escritura e o apartamento mudou de dono – que, julgo eu, o renovou e o alugou em seguida. Do dinheiro da venda, a minha mãe, como é seu direito e é normal entre pais e filhos, fez-me doação dos 75% que podia dar-me em vida (sendo eu filho único, depois do falecimento dos meus dois irmãos). E faço notar o seguinte, que me parece importante: esta venda não aumentou em nada o meu património ou o da minha família. O que se fez foi trocar o imóvel que a minha mãe já tinha pela liquidez correspondente ao seu verdadeiro valor. O património que já estava na família permaneceu na família, agora convertido em liquidez. Uma venda, aliás, é isso mesmo. E foi o que foi feito.

Acho espantoso que alguém pretenda ver nisto uma “venda simulada”, como agora dizem. Tanto quanto imagino, as vendas verdadeiramente simuladas não se fazem pelo preço de mercado, não obrigam ao abandono do imóvel pelo vendedor e não acabam no aluguer a terceiros pelo novo proprietário! Esta é apenas outra história mal contada por quem conduz esta investigação contra mim.

E) Negócios do futebol com Rui Pedro Soares

Bom, este ponto, se não fosse trágico, era de rir à gargalhada. A resposta é simples: não tenho nada que ver com os negócios entre o Eng. Carlos Santos Silva e o Dr. Rui Pedro Soares. Ponto. Não tive deles conhecimento, nem tinha que ter; não conheço as empresas de que falam, nem sei quem são os seus gerentes ou administradores. Em suma, nada sei e nada tenho que ver com tais negócios. Mas o que mais me impressiona nesta história é o fantástico silogismo da investigação, de extraordinário alcance: Carlos e Rui fazem negócios; Carlos e Rui são amigos de José; logo, José está envolvido nos negócios. Notável, não vos parece?

É verdade que sabia que estava a ser investigado? Desde quando?

Não, não sabia, não fazia a mínima ideia (até às buscas em casa do meu filho). Tento não ligar muito aos rumores e dou algum desconto às notícias de certos jornais. De qualquer modo, depois do episódio da revista Sábado, com o desmentido da Procuradoria Geral da República, nunca mais liguei a isso.

A menos de um ano de eleições, considera que este processo pode ter fins políticos?

Desconheço as motivações deste estranho processo sem indícios nem provas, onde todos os crimes são vagamente presumidos e só a prisão é concreta. Mas já disse e mantenho: este processo, pela sua natureza, tem contornos políticos. E digo mais: este processo é, na sua essência, político. No sentido em que tem que ver com o poder, os seus limites e o seu exercício; o poder de deter para interrogar e o poder de prender preventivamente pessoas inocentes. Já para não falar nas consequências que este processo inevitavelmente terá na disputa política. Veremos quais. Como já disse, isto ainda agora começou.