O autarca da Praia da Vitória, na ilha Terceira, classificou neste sábado a ameaça do primeiro-ministro de propor a revisão do acordo técnico bilateral em relação à Base das Lajes é apenas “artificialismo mediático”. “Infelizmente, eu vejo este tipo de declarações, numa fase em que tudo está decidido, meramente como um artificialismo mediático para demonstrar que algo está a fazer de contraponto”, salientou o presidente da Câmara Municipal da Praia da Vitória, Roberto Monteiro, em declarações aos jornalistas, à margem de uma reunião com a UGT, em Angra do Heroísmo.

O primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, defendeu, na sexta-feira, que os EUA “não podem deixar de atender” ao impacto económico da redução da sua presença na Base das Lajes e admitiu suscitar a revisão do acordo técnico bilateral.

Para o autarca da Praia da Vitória, concelho em que está localizada a Base das Lajes, colocar em causa a permanência dos Estados Unidos da América na base ou rever as facilidades que são dadas só no final do processo “leva ao descrédito e à falta de credibilidade”. “Este tipo de posição deveria ter sido tomada quando arrancou a primeira fase da redução. Quando avançou a redução, automaticamente deveriam ter sido colocadas na mesa estas cartas, se houvesse uma verdadeira intenção de o fazer”, frisou.

Para a Comissão Representativa dos Trabalhadores portugueses na Base das Lajes (CRT), faz sentido rever o acordo técnico, porque “a dimensão da remodelação” em termos de infraestruturas é tal que o torna “desajustado” como ele está atualmente. No entanto, João Ormonde, da CRT, que também participou na reunião com a UGT, salientou que a revisão do acordo técnico não é suficiente para resolver o problema dos trabalhadores portugueses e do impacto económico da redução militar na Base das Lajes.

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“Não se pode esperar que os americanos procedam com esta reestruturação para depois é que Portugal reagir. Portugal tem que parar este processo de reestruturação, tem que negociá-lo com os Estados Unidos, preferencialmente sem despedimentos, sem redução, mas se tiver que acontecer despedimentos e redução que isto seja feito de forma consensual entre as partes envolvidas”, frisou.

Os trabalhadores reclamam mais tempo de “ajustamento”, à semelhança do que foi concedido a outras bases europeias que também serão reestruturadas, lembrando que o peso da redução militar na Base das Lajes para a poupança dos Estados Unidos na reestruturação total na Europa é de 6%.

João Ormonde defendeu que os Estados Unidos deviam aplicar nas Lajes o que fazem quando desmantelam bases dentro do seu território, em que são constituídos grupos de trabalho, envolvendo entidades locais, desde governantes a eventuais investidores, que debatem a forma como as infraestruturas passam de militares a civis, durante um período habitualmente de cinco anos.

O acordo técnico bilateral define, por exemplo, regras de construção de infraestruturas e de autorizações para a utilização de valências, mas para Álvaro Monjardino, advogado e ex-presidente da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, não é possível rever o acordo técnico sem rever o Acordo de Cooperação e Defesa entre Portugal e os Estados Unidos, em que está integrado esse acordo técnico. “Mexer na parte técnica é forçosamente mexer no acordo”, frisou Álvaro Monjardino, que foi presidente da Assembleia Legislativa dos Açores entre 1976 e 1984, tendo acompanhado de perto a revisão do acordo de 1983.

Álvaro Monjardino defendeu que o Estado português deve dizer aos americanos que esta situação “implica uma revisão total” do acordo, mas admitiu ter “as maiores dúvidas” de que isso aconteça, tendo em conta a história da diplomacia portuguesa. “Tenho muito pouca fé na nossa diplomacia, na sua informação e na sua preparação”, frisou, lembrando que, por exemplo, em 1991, foi incluída “à última hora” uma cláusula imposta pelos americanos no acordo, que permitiu aos cidadãos norte-americanos trabalharem na Base das Lajes, em concorrência com os locais.