A escola de samba Beija-Flor, do Rio de Janeiro, alega, em nota oficial, que o patrocínio da Guiné Equatorial para o Carnaval deste ano tem um propósito somente cultural, reagindo às críticas de apoio do regime ditatorial.

A Guiné Equatorial apoiou em 10 milhões de reais (três milhões de euros) a marcha da escola, que este ano dedica o seu tema àquele país, governado por uma ditadura, considerada por várias organizações de direitos humanos como uma das mais violentas do continente africano.

O apoio do regime de Teodoro Obiang, alega a Beija-flor, “tem viés estritamente cultural e não aborda o formato de governo do país”, que aderiu em 2014 à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

No desfile da madrugada de segunda, o embaixador da Guiné Equatorial em Brasília, Benigno-Pedro Matute Tang, irá participar no último carro alegórico da escola e o vice-presidente do país, Teodoro Obiang Mangue (conhecido como Teodorín e filho do Presidente, Teodoro Obiang), é esperado em um camarote na avenida Marquês de Sapucaí, com outras cerca de 40 autoridades do governo.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A Beija-Flor é a escola de samba favorita do regime, como indica o facto de o Presidente Obiang reservar, desde há quatro anos, um camarote em frente à agremiação para assistir aos desfiles do Grupo Especial, a elite do Carnaval do Rio de Janeiro.

Segundo o jornal carioca ‘O Globo’, o ditador costuma ver o espetáculo sentado numa poltrona de couro, especialmente colocada para o efeito. O espaço já foi todo revestido em tecido vermelho e ostentaria até uma foto do presidente. Obiang ainda não confirmou presença este ano.

Em 2013, a Beija-Flor fez uma apresentação para a elite da Guiné Equatorial em uma festa no país africano e as negociações para o patrocínio ao enredo deste ano teriam começado ali.

No Brasil, a escola de samba – 12 vezes campeã do Carnaval – é ela própria alvo de polémicas.

A agremiação foi criada e sustentada pela família de Anísio Abrahão David, um dos líderes da criminalidade no Rio de Janeiro. Além de controlar jogos ilegais e grupos de extermínio em cidades pobres em redor da capital, a família já tem ramificações na política e na Justiça.

O patrocínio “é um dinheiro que traz a interrogação de ter vindo com sangue. A simples dúvida já seria mais do que suficiente para recusar. Mas não é da tradição das escolas, até pela origem da direção delas, muitos deles ligados ao crime. Você acaba por não poder exigir muito de pessoas como essas, que não vão ter a ética de fiscalizar a origem das verbas”, disse ao Globo a juíza Denise Frossard, que, nos anos 1990, se notabilizou por mandar prender os principais líderes criminais no Rio de Janeiro, entre eles o patrono da Beija-Flor.

O patrocínio também foi alvo de críticas de organizações de direitos humanos. A ONG SOS Brasil Racismo, que promove ações de igualdade racial, repudiou o apoio do governo da Guiné Equatorial.

“Nas questões de direitos humanos não há o que titubear, Teodoro Obiang é o ditador mais antigo num país africano e, apesar das riquezas e recursos da Guiné Equatorial, mais da metade de seus habitantes vivem na extrema miséria e sob um regime de terror”, refere a organização.