“O que acontece com a atenção, a memória e a perceção do tempo quando vemos alguém atraente?” Esta é a pergunta-chave que André Silva tem de tentar responder durante o doutoramento em Psicologia Básica na Universidade do Minho. Para encontrar uma resposta aceitável o investigador precisa de 320 fotografias de qualidade, mas André Silva quis ir mais longe e propôs-se criar a maior base de dados de fotografias de faces.
“Esperamos num mês ultrapassar as 1.100 fotografias”, diz ao Observador André Silva, comparando este projeto com a maior base de dados atual – a do National Institute of Standards and Technology (NIST), uma agência do Departamento de Comércio dos Estados Unidos – que tem esse número. Mas o investigador recorda que as fotografias do NIST não estão padronizadas e que as últimas recolhas já são de 1996.
Como se pode fazer um estudo comparativo de observação de fotografias se o fundo muda de cor, se as fotografias não têm o mesmo enquadramento ou se os tons das fotografias são diferentes? A proposta de André Silva é correr Portugal continental e insular – e quem sabe outros países da Europa – a fotografar voluntários sempre com o mesmo fundo cinzento, o mesmo equipamento fotográfico e o mesmo kit de luz.
Mas correr o país de lés a lés implica gastos com deslocações e estadias que André Silva espera ver financiado através da plataforma de financiamento público PPL Crowdfunding Portugal, onde cada pessoa pode contribuir a partir de um euro. Se não conseguir chegar aos 1.500 euros necessários, os donativos serão devolvidos, mas caso o ultrapasse o investigador vai alargar o número de locais a visitar, tanto em Portugal como no estrangeiro, e tentar chegar às três mil fotografias.
ESTUDAR A ATRAÇÃO COM FOTOGRAFIAS
Os investigadores que usam fotografias de rostos para estudos de psicologia, por exemplo, vão criando as bases de dados à medida das necessidades que têm. Mesmo que esse conjunto de fotografias siga o mesmo padrão, podem não ser comparáveis a fotografias tiradas com outro objetivo. Com a maior base fotográfica de faces, André Silva vai disponibilizar fotografias padronizadas a investigadores de várias partes do mundo, ao mesmo tempo que terá todo o material necessário para concluir o doutoramento.
Depois de ter recebido críticas sobre a base de dados pouco padronizada que usava e que podia distrair a atenção, André Silva tentou com imagens geradas por computador, mas as pessoas não reagem da mesma maneira a uma imagem de computador como a uma fotografia de uma pessoa.
O doutoramento só acaba em junho de 2016, mas o investigador espera já ter a base de dados disponível em setembro deste ano e, quem sabe, deixar margem para que continue a ser enriquecida por outros colegas. Entretanto vai tentando perceber como é que ver uma pessoa atraente influencia a atenção, a memória e a perceção de tempo.
“A atratividade é relativa”, conforme explica o investigador. As fotografias são mostradas a 30 a 50 pessoas que as classificam de um a sete consoante a atratividade. Consoantes as classificações obtidas as fotografias são agrupadas em atraentes e não atraentes. André Silva lembra que normalmente “somos mais atraídos por pessoas mais próximas da média populacional”.
Atenção
São mostrados cinco conjuntos de 16 fotografias – oito atraentes e oito não atraentes – em simultâneo durante dois segundos. Ao detetar onde o olhar se fixa é possível perceber se as pessoas se fixam mais nas pessoas atraentes ou não.
“Formamos impressões em menos de meio segundo”, explica André Silva. “O primeiro segundo é na realidade tão poderoso que temos dificuldade em desligar-nos da primeira impressão que guardamos de uma pessoa.”
Memória
Mostrando aleatoriamente fotografias de faces atraentes ou não atraentes e, em ambos os casos, fotografias que já tinham sido vistas e fotografias novas, é pedido às pessoas que identifiquem as que reconhecem.
A primeira fase desta experiência, já realizada, mostra, como esperado que as pessoas tendem a a dizer que reconhecem mais vezes as fotografias que já tinham visto do que as que nunca tinham visto. O que os investigadores estranharam é que as pessoas diziam muitas vezes reconhecer fotografias de pessoas atraentes que não tinham visto antes.
Só a repetição da experiência com as fotografias padronizadas permitirá perceber se haveria algum fator não relacionado com a face que estivesse a condicionar a perceção.
Perceção do tempo
Também neste ponto a base de dados padronizada traz vantagens. Eliminando os fatores que podem contribuir para distrair os observadores, os investigadores podem confirmar se as pessoas consideram que passaram mais tempo a olhar para as imagens atraentes ou para as não atraentes.
“Muita da nossa investigação pode parecer de senso comum”, diz André Silva, lembrando alguns comentários que já ouviu, mas acrescenta que desta forma se encontra a justificação científica para certas afirmações mais populares.
Correção: a maior base de dados atual é do NIST (atualizado às 17h30)