O conselho de administração do BPI decidiu, por unanimidade, não aceitar a oferta pública de aquisição (OPA) geral lançada pelo CaixaBank, sob o argumento de que o preço oferecido, de 1,329 euros por ação, “não reflete o valor atual” do banco. Num documento datado de 5 de março e entregue à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), em que o órgão de gestão da instituição alvo analisa as condições propostas para se fazer a operação, o BPI não recomenda aos acionistas que aceitem a oferta, considerando que, do seu ponto de vista, cada ação do banco vale 2,04 euros. Representante de Isabel dos Santos fez declaração de voto em que diz que o Conselho de Administração deveria “ter ido mais longe” na rejeição da oferta do CaixaBank.
O preço tido como justo pela administração da instituição financeira é decomposto no documento. A atividade doméstica do BPI contribui com 1,12 euros por ação e a atividade internacional vale 0,92 euros. A estas parcelas, a gestão do banco considera que tem de ser acrescentado o valor “resultante da partilha”, de metade para cada lado, “das sinergias anunciadas” pelo CaixaBank, de 0,22 euros. Aquelas sinergias, recorda a administração do BPI, são avaliadas pelo banco espanhol em 650 milhões de euros, isto é, 0,44 euros por cada ação da entidade alvo da OPA. “Em operações de consolidação, é comum partilhar sinergias com os accionistas da sociedade visada. Caso essa partilha fosse de 50%, para este montante de sinergias, o valor correspondente por ação do BPI seria de 0,223 euros”, defendem os gestores desta instituição.
A administração do BPI considera, pois, que o preço oferecido corresponde apenas “ao preço mínimo fixado na regulamentação para ofertas públicas de aquisição obrigatórias” e que o banco “está valorizado à cotação média” dos seis meses anteriores à data do anúncio preliminar da OPA e não inclui “qualquer prémio face aos preços de mercado”.
No documento, a administração do BPI analisa a evolução recente da cotação das ações da instituição em bolsa. “Analisando a evolução dos preços de mercado do BPI, verifica-se que a partir de 16 de Dezembro de 2014 a cotação do BPI foi significativamente penalizada pelo comunicado divulgado nesse dia, relativo à perda de equivalência de supervisão em Angola”, consideram os administradores, sublinhando que “a cotação média das ações do BPI de 31 de Dezembro de 2013 até 16 de Dezembro de 2014 foi de 1,581 euros”. Após 16 de Dezembro de 2014 e até à data do anúncio preliminar da OPA, prosseguem, “a cotação média foi de 0.944 euros” por ação, “o que penalizou significativamente o preço médio dos últimos seis meses e o valor mínimo exigido para uma oferta pública de aquisição obrigatória”.
Os 1,329 euros por ação que o CaixaBank ofereceu a 17 de fevereiro também não refletem, de acordo com o documento enviado à CMVM, o valor das operações do banco nas várias geografias onde está presente: Portugal, Angola e Moçambique. O prazo para que a administração do BPI se manifestasse sobre a OPA do CaixaBank terminava nesta quinta-feira. Ao mesmo tempo que arranca a OPA do CaixaBank, que já detém 44% do capital do BPI, o BPI tem, também, em cima da mesa uma proposta da acionista Isabel dos Santos (Santoro Finance) para que o BPI avalie uma fusão com o BCP.
OPA “pode pressupor a saída de mais de 1800 colaboradores da atividade doméstica” do BPI, afirma Mário Leite da Silva, gestor do banco que representa os interesses de Isabel dos Santos.
O documento divulgado nesta quinta-feira inclui, aliás, uma declaração de voto de Mário Leite da Silva, administrador que representa os interesses da empresária angolana no BPI, que considera que o relatório não inclui “um conjunto de sugestões e propostas de alteração em matérias” que reputa como “fundamentais”. No texto, Leite da Silva dirige diversas críticas aos termos da OPA lançada pelo CaixaBank e diz, entre outras considerações, “ser obrigação do Conselho salientar os riscos que são gerados para os trabalhadores” pela oferta.
“Propondo-se o oferente alcançar no ano de 2017 um valor de sinergias de 130 milhões de euros”, escreve Mário Leite da Silva, “isso poderá implicar, no pressuposto que as sinergias decorram essencialmente de sinergias de custos e que o nível das amortizações não irá baixar, uma redução expectável de 42 milhões de euros de custos com fornecimentos e serviços de terceiros e uma redução expectável de 88 milhões de euros com custos com pessoal, o que corresponde a cerca de 30% do total com custos com pessoal recorrentes da atividade doméstica em 2014, ou seja, pode pressupor a saída de mais de 1800 colaboradores da atividade doméstica”.
O administrador sublinha, também, que, no anúncio preliminar da OPA, não são “completos e objetivos” os “planos estratégicos do CaixaBank para os mercados em que o BPI está presente”. Como tal, Leite da Silva afirma que “deveria o conselho de administração do BPI ter emitido a sua opinião sobre matérias tão importantes e fundamentais como o destino dos projetos em curso em Angola e Moçambique e a falta de proximidade cultural do CaixaBank em relação a esses projetos”, bem como “o destino da parceria com o Grupo Allianz”.
A declaração de voto prossegue com a defesa da proposta de fusão defendida por Isabel dos Santos, entre o BCP e o BPI. No “atual momento do setor financeiro português – em particular face ao ambiente de baixas taxas de juro e margens reduzidas – é meu entendimento que a estratégia para o futuro da banca passa por movimentos de consolidação”, argumenta o gestor.
“Ora, como é do conhecimento público, o Banco BPI estava, à data do anúncio preliminar de OPA, a analisar um processo de consolidação nacional, o qual pode ser prejudicado pelo lançamento desta oferta, já que o calendário de implementação desta oferta pode não ser compatível com os calendários anunciados para esse processo”, acrescenta Mário Leite da Silva. E remata: “Esta oferta é, na minha opinião, inoportuna e não alinhada com os melhores interesses da Instituição, dos seus acionistas, dos seus trabalhadores e demais stakeholders, devendo o Conselho de Administração regressar tão prontamente quanto possível à análise das opções de consolidação“.
O responsável conclui dizendo que ainda que o relatório do Conselho de Administração diga que “a oferta tem um cariz oportunístico, é meu entendimento que se devia ter ido mais longe“.
Isabel dos Santos já defendeu, também, que a oferta do CaixaBank não reflete o potencial de crescimento do BPI. Trata-se de um valor que corresponde sensivelmente à média dos seis meses anteriores e um prémio de 27% face ao fecho do dia anterior ao lançamento da oferta. Mas, como notou o Observador na altura, o valor corresponde a dois terços do que o BPI valia em abril, quando Portugal se aproximava do final do programa da troika e antes do colapso do Banco Espírito Santo, que penalizou as ações de todo o setor bancário nacional.
O CaixaBank está, com a OPA lançada em fevereiro, a tentar aproveitar uma fase menos boa das ações para redobrar o investimento num banco em que já tem uma parte muito expressiva do capital mas onde o controlo está limitado a um quinto dos direitos de voto. É certo que as perspetivas para a banca nacional continuam a ser pouco animadoras, mas existem sinais de melhoria que os analistas têm dito que poderão vir a impulsionar as ações no futuro. É por isso que alguns acionistas estarão céticos quanto a uma venda a este valor. Um valor que, diz Isabel dos Santos, não só não reflete o potencial de crescimento do BPI como “não partilha com os acionistas do BPI o adequado valor das sinergias” numa eventual investida do CaixaBank.