Terça-feira foi dia de ensaio geral e, apesar de faltarem apenas três dias para a estreia, o nervosismo dos atores, se o há, não transparece para quem está a assistir, de tal maneira tudo corre de forma organizada e fluida, não deixando de haver pormenores a afinar, como, aliás, em qualquer ensaio.
Cláudia Rocha interpreta Madalena e, em conversa com a Lusa, revelou que para ela é “uma emoção fazer teatro”, negando as dificuldades próprias de quem tem um dos papéis principais no famoso musical dos anos 1970. “Para mim não é complicado. Eu apanho tudo bem”, diz, admitindo, no entanto, que teve algumas dificuldades num momento da peça, quando tem de se virar e dirigir-se à tenda onde descansa Jesus Cristo. “Eu tenho desequilíbrio, mas consegui. Quando me desequilibrava, parava e depois continuava”, explicou.
Cláudia encontrou também rapidamente solução para outro problema, o nervosismo que chega com a estreia da peça e que aumenta só de pensar em todas as pessoas que vão estar na plateia do Coliseu dos Recreios, em Lisboa. “Eu não olho para elas”, revelou.
Em entrevista à Lusa, o encenador do musical, que é também o diretor técnico da instituição, explicou que este trabalho é o culminar de um processo com cerca de doze anos, entre ensaios e adaptação do musical à realidade das pessoas com deficiência. “As primeiras versões experimentais tiveram lugar no ginásio do Elo social e quando vimos que já era digno de mostrar ao público em geral e dar visibilidade a estes atores, apresentámo-nos em estreia no cinema São Jorge, pela primeira vez, em 2011”, adiantou António Martins.
A segunda vez que subiram a palco acontece em 2013, por altura dos trinta anos da instituição, quando esgotaram os 800 lugares do Cinema São Jorge em cada um dos dias em que atuaram. “Cada pessoa que participa, cada ator destes, teve de ser um trabalho muito individualizado, que leva 10, 12 anos de ensaio, de trabalho”, explicou o encenador.
Segundo o responsável, desde a primeira vez que montaram o espetáculo até agora, foram aumentando gradualmente o número de cenas, estando prontos para mostrar ao público do Coliseu dos Recreios um musical com 20 cenas.
“Esse trabalho é árduo, apurado, moroso, porque muitas destas pessoas, para além da deficiência intelectual, têm multideficiência, têm deficiências sensoriais, têm paralisias cerebrais, alguns não ouvem, outros têm muita dificuldade na visão, não falam, e por isso a cada caso temos de nos adaptar”, explicou António Martins.
A adaptação a cada caso e a cada ator passa, segundo o responsável, por orientações através de gestos ou instruções verbais para que cada um dos atores possa dar o seu melhor. “Eles são extremamente ricos do ponto de vista de sentimentos, de emoções, a parte afetiva é muitas vezes a riqueza maior destas pessoas”, apontou.
António Martins não tem dúvidas de que este trabalho artístico “é uma parte extremamente marcante” da vida daquelas pessoas, tanto pela realização pessoal, como profissional e revelou que há já quem diga que a sua profissão é ser ator.
O espetáculo estreia sexta-feira, dia 20, às 21:00, e a instituição tem já cerca de 1.700 lugares preenchidos, havendo ainda para vender cerca de 400 bilhetes. “Venham até ao Coliseu, venham ver este espetáculo especial, único em Portugal”, rematou António Martins.