O Tribunal de Lisboa aceitou a providência cautelar interposta pela ANTRAL – Associação Nacional dos Transportes Rodoviários em Automóveis Ligeiros e determinou a proibição, de imediato, da atividade da Uber em Portugal, com página web e aplicações encerradas, confirmou Florêncio de Almeida, presidente da ANTRAL, ao Observador.
Rui Bento, responsável pela Uber (plataforma que liga utilizadores e motoristas através de uma aplicação para smartphone) em Portugal, disse ao Observador que soube da decisão do tribunal pela comunicação social.
“Ainda não recebemos nenhuma notificação por parte de nenhum tribunal. Não sabíamos absolutamente de nada. Estou completamente surpreendido”, revelou. Foi Rui Bento quem alertou os advogados da Uber para o que se estava a passar.
“Neste momento, estamos a tentar perceber o que se passa. Os nossos advogados não tinham conhecimento desta providência cautelar”, disse. Florêncio de Almeida explicou que a ação foi entregue ao Tribunal de Relação de Lisboa há cerca de um mês.
De acordo com o documento disponibilizado pela ANTRAL, o Tribunal determinou que a Uber encerrasse, de imediato, a página web, a aplicação móvel, bem como a atividade de transporte de passageiros em automóveis ligeiros por meio de aplicações destinadas a esse fim.
A angariação de meios e a execução de contratos de transporte de passageiros, sob a designação “Uber”, também ficam proibidas. Tal como a utilização de cartões de crédito e sistemas de pagamento pela internet na plataforma da empresa.
Caso a empresa não cumpra com o que foi determinado pelo tribunal terá de pagar uma multa diária de 10 mil euros.
A decisão do Tribunal de Lisboa “ainda está muito longe de ser definitiva”, explicou o advogado Miguel Santos Pereira ao Observador.
Neste momento, a Uber pode reagir de duas formas: apresentar, dentro do prazo de 15 dias, um recurso no tribunal que proferiu a decisão (caso entenda que os argumentos apresentados pela ANTRAL são suficientes, mas que o tribunal decidiu mal) ou apresentar oposição à decisão, no prazo de 10 dias, caso queira apresentar novos factos ou um argumento de defesa (considerando que os argumentos não são suficientes), explicou o especialista.
“Dezenas de milhares de pessoas” utilizam Uber em Lisboa e no Porto
A decisão do tribunal de Lisboa não é isolada e a polémica não é nova. Pelos países por onde passa, a empresa já conheceu vários processos em tribunal. No centro da questão, tem estado o serviço UberPop, uma plataforma de ridesharing (partilha de boleias) que permite que os utilizadores se liguem a pessoas que estão dispostas a partilhar os seus carros, explicou Rui Bento ao Observador. O responsável voltou a dizer, esta terça-feira, que esse serviço não se encontrava em Portugal.
A provocar a ira dos taxistas tem estado o facto de a empresa não ter licença ou alvará para transporte de passageiros e não pagar os impostos que os profissionais do setor são obrigados. “Não é admissível que eles não paguem imposto ao Estado, quando as empresas de táxi pagam IRS, pagamento especial por conta, pagamento por conta, IVA e as contribuições dos empregados à Segurança Social”, dizia Carlos Ramos, presidente da Federação portuguesa do Táxi ao Observador, no final do mês de janeiro.
Perante estes argumentos, Rui Bento explicava que a empresa atua na área tecnológica e que, por isso, não emprega nem licencia motoristas. É antes uma plataforma online que trabalha com empresas parceiras, que estão licenciadas para efetuar o transporte comercial de pessoas com motorista privado.
A Uber está presente em Portugal desde julho de 2014. Rui Bento diz ao Observador que já há “várias dezenas de milhares de pessoas que utilizam regularmente o serviço, em Lisboa e no Porto, e centenas de motoristas que, se isto for verdade, deixam de poder trabalhar nisto”.
Em Lisboa e no Porto, estão disponíveis dois serviços: o UberBlack e o UberX. O primeiro é considerado um serviço de luxo, porque só funciona com carros de gama alta, como Audi A6, BMW série 5 ou Mercedes Benz Class E. Com uma tarifa base de dois euros, cobra 30 cêntimos por minuto e 1,10 euros por quilómetro. A tarifa mínima é de oito euros.
O UberX, por sua vez, é a versão low-cost do serviço, que começa com uma tarifa base de um euro, em carros Volkswagen Golf, Opel Astra ou Seat Leon. À tarifa base, acresce 10 cêntimos por minuto e 65 cêntimos por quilómetro. No mínimo, os utilizadores têm de pagar 2,50 euros pela viagem.
Em ambos os serviços, não há dinheiro envolvido. Quando o utilizador cria uma conta na Uber associa o seu cartão de crédito e o custo da viagem é descontado na conta bancária. Mas antes de solicitar o serviço, pode fazer uma estimativa. Só depois decide se finaliza o serviço.
Como tudo funciona? Através de uma aplicação para smartphone que funciona por geolocalização. Quando o utilizador cria uma conta e efetua o pedido, o motorista sabe exatamente o sítio onde se encontra.
Uber proibida nalguns países. Comissão Europeia quer regulamentar o serviço
No início de abril, a Comissão Europeia, anunciou que quer regular os serviços de transporte com motorista a nível europeu, para que a decisão não fique ao critério de cada país. Em causa, esteve a queixa que a Uber apresentou contra França, Alemanha e Espanha, que baniram, ou tentaram banir, os serviços da Uber dentro de fronteiras.
Apesar de os governos serem responsáveis pelas suas políticas de transporte, Bruxelas quer que os fornecedores de serviços sejam tratados sem discriminação e livres de apresentar novos serviços. O objetivo é o de abrir a porta ao serviço da Uber, mas num quadro europeu que inclua legislação sobre as possibilidades oferecidas pelas novas tecnologias.
Em França, o governo tentou impedir o serviço UberPop de operar no país, mas a 31 de março o Wall Street Journal noticiava que a ação não tinha sido aceite pelo tribunal, remetendo-a para uma instância superior. Em Espanha, o serviço foi proibido em dezembro de 2014 por ser um serviço “de concorrência desleal”.
Na Alemanha, o serviço foi proibido em setembro de 2014, mas esta terça-feira, a Bloomberg noticiava que o polémico serviço de partilha de boleias ia ser substituído pelo UberX (que recorre a motoristas com licença para transporte privado de passageiros), que é um dos serviços disponíveis em Portugal.
Fonte próxima da empresa disse à Bloomberg que o serviço UberX começaria a funcionar no país assim que a empresa conseguisse contratar os motoristas que estejam certificados pelas autoridades locais.
A 15 de abril, o presidente do Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT), João Carvalho, pediu no Parlamento uma mudança na lei, porque à luz da atual, a tecnológica incorre “numa violação” do serviço de transportes. “Não podemos parar ou tentar atrasar aquilo que é o futuro”, referiu, apelando aos deputados e Governo que legislem sobre este novo tipo de serviço de transporte de passageiros.
Proibir o serviço é “ridículo e atrasado”
Miguel Leite tem 27 anos e utiliza os serviços da Uber desde janeiro de 2015. Costuma utilizá-los cerca de três vezes por semana, sobretudo para se deslocar em trabalho e para ir para o aeroporto. Em janeiro, disse ao Observador que tinha ficado tão impressionado com o serviço que não tinha voltado a utilizar os serviços de táxi.
Esta terça-feira, disse que continua a utilizar o serviço, que não tem queixas a fazer e que não tem notado nenhuma diferença no serviço ao longo do tempo. “Acho ridículo e atrasado proibirem a atividade da Uber”, acrescentou.
Miguel Andrade também conversou com o Observador em janeiro. E voltou a fazê-lo esta terça-feira. Conta que continua a utilizar o serviço cerca de três vezes por semana, que gosta muito do serviço, que é “muito prático” e que continuaria a utilizá-lo caso pudesse.
“Vejo esta pressão dos taxistas, mas ainda agora estive em São Francisco, nos Estados Unidos, e eles lá têm disponível a Uber e a Lyft, que é uma plataforma concorrente, e coexistem muito bem com os taxistas. Não há razão nenhuma para acabar com o serviço.
Pouco tempo depois de ter sido noticiada a proibição da atividade da Uber em Portugal, foi lançada uma petição online sob o mote “Queremos a Uber em Portugal”, que às 22h38 contava com 196 assinaturas. No Facebook foi criada uma página com o mesmo nome, que em quatro horas, angariou mais de 2.700 fãs.
*artigo atualizado pela última vez às 22h43 de terça-feira, 28 de abril