Morreu o jornalista Oscar Mascarenhas. A notícia é avançada pelo Diário de Notícias (DN), jornal onde foi Provedor do Leitor. O jornalista teve uma paragem cardíaca na manhã desta quarta-feira, confirmou ao Observador um familiar. Tinha 65 anos.

De acordo com João Vaz, jornalista e familiar de Oscar Mascarenhas, o ex-Provedor do Leitor “sentiu-se mal, chamou o 112 e desceu até à porta. Entrou pelo próprio pé para a ambulância e só no interior é que teve a paragem cardíaca”. Foi levado para o hospital de São José, em Lisboa. João Vaz recorda que Oscar Mascarenhas teve um “aviso sério” de saúde no ano passado, relacionado com o coração, mas que atualmente não estava doente.

Oscar (sem acento, como gostava de enfatizar) José Mascarenhas nasceu a 9 de dezembro de 1949. Frequentou o curso de Direito na Universidade de Lisboa e estudou jornalismo no ISCTE. Foi presidente do Conselho Deontológico do Sindicato de Jornalistas e professor no CENJOR. Publicou vários livros de jornalismo.

Os primeiros passos no jornalismo foram dados a partir de 1975, no diário A Capital. Entre 1982 e 2002 foi jornalista no DN. Também colaborou com o Jornal do Fundão e, nos últimos anos, com a Agência Lusa. Em janeiro de 2012 regressou para um mandato de três anos como Provedor do Leitor. O mandato, não renovável por lei, terminou no final de 2014. No último artigo que publicou, escreveu:

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Este é o meu último artigo de opinião como Provedor do Leitor do Diário de Notícias. Cheguei ao termo do mandato de três anos não renovável – e ainda bem que não o é! Quando João Marcelino me convidou para estas desassossegadas funções não me sugeriu sequer qualquer compromisso ou caderno de encargos para além do entendimento que eu tivesse do estatuto de Provedor do Leitor.

Entendi – e afirmei-o repetidas vezes nesta coluna – que faria a leitura mais ampla das funções, não me limitando a amodorrar no guiché à espera de queixas e reclamações. E que alargaria os horizontes da intervenção e – porque não? – da pedagogia a incidentes que envolvessem outros órgãos de informação e dos quais se pudessem criar munições intelectuais para defesa dos leitores e dos jornalistas do DN.

(…) Dei combate à grosseria de linguagem – até em artigos de opinião, usualmente de fora do âmbito de intervenção de um provedor – e atalhei sempre que pude contra o recurso a comentários de fontes não identificadas. Parti da minha experiência de (agora) 40 anos de jornalismo – celebro-os no dia 2 de janeiro! – e de dois princípios: o caráter aristocrático da nossa profissão e a ética.

Não entendo o jornalismo como um poder mas como um serviço. Daí ele ser aristocrata: saber que podemos muito mais do que nos permitimos, por respeito pelo público”.

Em dezembro, Oscar Mascarenhas completaria 66 anos e passaria para a reforma. Atualmente encontrava-se na pré-reforma pela Agência Lusa. Dava duas cadeiras na Escola Superior de Comunicação Social, em Lisboa: Ética e Metodologias de Investigação Aplicadas à Comunicação. Também se dedicava a fazer traduções e preparava-se para lançar mais dois livros, um dos quais no final deste ano, sobre citações.

O velório está marcado para quinta-feira, a partir das 15h00, na Igreja São João de Deus, em Lisboa. O funeral é na sexta-feira, às 11h00, no Alto de São João.

O jornalista que fazia as perguntas incómodas

“O jornalismo fica verdadeiramente mais pobre sem Oscar Mascarenhas. Ele era um pilar do ponto de vista do funcionamento íntegro do jornalismo em Portugal e era uma referência. Fica mesmo mais pobre, não é uma frase feita”, disse o ex-administrador da Lusa, Luís Delgado, àquela agência.

Pedro Tadeu, diretor da Global Imagens e ex-subdiretor do DN, recordou ao Observador os muitos momentos de discussão entre os dois. Anteriormente colegas n’A Capital, isso não impediu Oscar Mascarenhas durante o mandado de presidente do Conselho Deontológico do Sindicato de Jornalistas, de chatear o colega e amigo, na altura ao serviço do 24 Horas.

“Tivémos algumas picardias por causa da linha editorial do jornal, mas ficámos sempre amigos. Depois apanhei-o aqui no DN, onde tivémos também alguns conflitos, mas aqui na questão dos comentários dos leitores no site, ele achava que devia haver filtros e moderação e eu defendia a tese contrária. Mas conseguíamos sempre discutir vibrantemente e apaixonadamente. Continuamos sempre a ser amigos. A amizade foi tão grande que ate lhe ofereci dois gatos!”, contou.

Pedro Tadeu recordou as ideias “muito firmes e cimentadas”. “Do meu ponto de vista, era a pessoa que mais sabia em Portugal sobre matérias deontológicas. Acho que tinha posições moderadas na matéria, embora utilizasse palavras radicais, mas eram posições sensatas, ainda que de algumas eu discordasse”.

Enquanto jornalista, tinha o cuidado de não perder o fio da comunicação com os muitos e diferentes leitores. “Tinha um estilo de redação muito rico, cultivava uma linguagem elaborada, mas ao mesmo tempo que pudesse ser lida por uma criança de nove anos. Depois era um jornalista que fazia perguntas incómodas, o que durante uma época não era muito vulgar”, acrescentou.

“Tivemos discussões muito vivas e interessantes. Era sempre entusiasmante para a inteligência discutir com o Oscar”, disse à Lusa Diana Andringa, antiga presidente do Conselho Deontológico do Sindicato.