(Artigo atualizado às 17:42)

A presidente do Instituto Nacional de Estatística deu esta sexta-feira uma rara conferência de imprensa, para deixar um recado claro aos partidos – em tempo de campanha eleitoral: o INE é isento e as estatísticas estão em linha com as regras e melhores práticas internacionais. Leia-se: o INE não deve ser usado como instrumento de campanha, muito menos a sua imagem deve ser desgastada com fins eleitorais.

Dias depois de o PS ter dito que o Governo está a “maquilhar” as contas do desemprego, dias depois de uma manchete do Expresso que dizia (com base em off) que o Governo está “furioso” com o INE por causa das muitas revisões que tem feito dos dados do desemprego, Alda Carvalho chamou os jornalistas para defender a instituição e a sua credibilidade: “A produção e difusão das estatísticas oficiais constituem um serviço público, que é prestado com toda a isenção e independência e deve merecer a confiança e credibilidade de todos os stakeholders” – ou seja, de todos os poderes públicos. Mais ainda:

Os trabalhadores do INE, independentemente de convicções pessoais, orgulham-se da especificidade e importância da missão do INE por cuja execução são responsáveis e assumindo-a com elevado sentido de responsabilidade, competência, profissionalismo e brio.”

Quanto às revisões das estimativas que têm sido feitas – e que resultaram, recentemente, numa revisão em baixa do número de desempregados -, Alda Caetano explicou que é esse o método habitual (e oficial) de todas as entidades estatísticas mundiais. A explicação pode ser dividida em pontos:

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

  • “A disponibilidade mais rápida de informação mais atual (preliminar ou provisória) implica, muitas vezes, um custo que deve ser (re)conhecido pelos utilizadores.”
  • “No primeiro momento de divulgação estas estatísticas são elaboradas com base em informação de base ainda incompleta (logo, assumem caráter provisório), sendo naturalmente objeto de revisão posterior.”
  • “Na disponibilização de informação estatística em geral existe sempre um trade off entre oportunidade temporal da difusão e nível de cobertura.”
  • “As revisões não são um facto novo nas estimativas mensais da taxa de desemprego; a magnitude das revisões recentes insere-se numa trajetória já conhecida.”

Em suma, explicou a presidente do INE, as revisões recentemente feitas nem sequer são altas, comparando com o histórico das estatísticas mensais do Eurostat. E só é revisto o último mês, precisamente porque o dado em causa é uma mera projeção. “A partir daí, o número é revisto e passa a definitivo”. É o preço o pagar por ter “estatísticas cedo” – mas é uma regra comum na Europa e conhecida de todos os atores políticos.

Estatísticas definitivas em cima da mesa

A polémica estalou devido a revisões nas estatísticas mensais e o INE decidiu explicar como as faz, e já não é a primeira vez. O cálculo das estatísticas mensais de desemprego é feito usando uma média móvel de três meses. Os dois primeiros meses deste conjunto usam números definitivos, mas o último é feito com base numa projeção. Quando na publicação seguinte o INE publica novos dados, o trimestre avança e passa a ter números definitivos para o mês da publicação anterior, o que faz com que os números sejam revistos.

Desta vez, a dimensão da revisão face à projeção do INE surpreendeu pela dimensão, como explicou a presidente do INE esta sexta-feira, mas Alda Carvalho aproveitou para lembrar que o Eurostat também publicava dados mensais sobre o desemprego em Portugal e que as revisões eram tão grandes ou maiores.

Sobre o futuro, o INE está a considerar publicar estatísticas definitivas, evitando assim revisões como a que se passou no último mês. A nota do destaque com a estimativa para o desemprego mensal publicada esta semana já dava conta dessa intenção. Hoje, Alda Carvalho explicou que foram consultados os stakeholders, como entidades dos organismos públicos (como é o caso do Ministério da Economia e o Ministério do Trabalho) e privados e que estes utilizadores continuam a preferir estatísticas mensais provisórias, que chegam mais cedo, mesmo com o risco de revisões.

Ainda assim, e sem colocar um calendário em cima da mesa, a responsável do INE, que estava acompanhada pela responsável pelo inquérito ao emprego no instituto, a questão continua em cima da mesa. O plano passaria por divulgar estatísticas definitivas mais cedo que o divulgado atualmente, normalmente no mês seguinte.

Ainda assim, explicou a presidente do INE, uma parte da informação usada para estimar a taxa de desemprego mensal seria sempre uma projeção e nunca números definitivos, ao contrário das estatísticas usadas para o desemprego trimestral que são sempre definitivas e não são revistas (apenas uma vez a cada década, quando são publicados novos Census).

O que passou em junho? “Não foi um erro”

“Não foi um erro”, foi a resposta da responsável do inquérito ao emprego no INE, Sónia Torres, quando questionada pelos jornalistas se o INE admitia ter falhado nas contas. Depois de explicar a metodologia envolvida, a mesma responsável garantiu que os técnicos foram verificar os resultados e perceber a discrepância, e a conclusão foi que “os métodos não estão em causa”.

Sónia Torres foi mais longe e disse que o que pode estar a faltar é “maturidade” à sociedade para saber analisar e digerir este tipo de resultados provisórios, sujeitos a revisão. Os responsáveis do INE dizem que mesmo que deixassem de produzir estatísticas de mensais sobre o desemprego, haveria sempre quem o fizesse por Portugal. Neste caso, o gabinete de estatísticas das comunidades europeias, o Eurostat.

Pressões do Governo por esclarecer

O briefing era maioritariamente técnico mas as perguntas sobre a interferência do Governo, depois de noticiado pelo Expresso o descontentamento do Governo com o INE, surgiram repitas vezes. A resposta foi sempre a mesma: “Não é uma pergunta técnica, vou-me escusar a responder”, dizia a presidente do INE.

No entanto, a responsável não se cansou de repetir qual é a carta de missão do INE e de reafirmar a isenção do instituto que dirige.