Praticamente uma em cada três crianças portuguesas, com idades compreendidas entre os seis e os oito anos, sofria de excesso de peso em 2013. A conclusão consta do relatório “Childhood Obesity Surveillance Initiative (COSI) Portugal 2013”, que será apresentado esta quinta-feira de manhã e a que o Observador teve acesso.
Em 2013, último ano em análise, das 5.935 crianças avaliadas, de Norte a Sul, passando pelas Ilhas, 31,6% tinham excesso de peso — das quais 13,9% sofriam mesmo de obesidade — e 2,7% dessas crianças apresentavam baixo peso para a idade. Em 2010, essas percentagens rondavam os 35,7% — dos quais 14,7% — e os 0,8%, respetivamente.
“O que nos preocupa perceber é que uma em três crianças ainda tem excesso de peso” e, no limite, isto significa que “uma em cada três famílias tem excesso de peso e obesidade”, afirmou Ana Rito, investigadora principal do estudo.
Independentemente de haver um aumento do baixo peso, ainda me assuta muito o 31,6% [prevalência de crianças com excesso de peso, incluindo obesidade]. Ainda há muito a fazer”, insistiu a investigadora do Instituto Doutor Ricardo Jorge.
Ainda assim, Ana Rito assinala a evolução positiva dos números. “Conseguimos responder positivamente ao repto lançado aos estados membros da região europeia da Organização Mundial de Saúde, em 2006, em Instambul, em que uma das questões levantadas era conseguir parar o caráter epidémico e ter progressos visíveis até 2015″, explicou ao Observador Ana Rito.
O que nos parece é que conseguimos travar o caráter epidémico da obesidade infantil. Nesse sentido ficamos muito satisfeitos”, resumiu Ana Rito.
Também o secretário de Estado Adjunto do Ministro da Saúde, Leal da Costa, disse, em resposta ao Observador, que o Ministério da Saúde se congratula “com a redução progressiva do excesso de peso e obesidade nas três fases do estudo”. “Em termos de saúde pública, a diminuição da obesidade e do excesso de peso poderá ter uma relevância importante sobre a probabilidade de obesidade em adultos e na eventual diminuição de um fator de risco importante para doença cardíaca e vascular.”
Para estes números, que ainda colocam Portugal em quinto lugar no ranking de países europeus com maior prevalência de crianças obesas, “contribuem, certamente, os padrões alimentares pouco corretos e o nível de sedentarismo das famílias portuguesas”, acrescentou a investigadora do Instituto Doutor Ricardo Jorge (INSA), explicando que não conseguiram, neste estudo, “fazer uma associação entre a questão da crise e a malnutrição”. Os autores deixam contudo uma nota no final do estudo, referindo que “o contexto das modificações sociais e económicas que se vive atualmente em Portugal podem ter repercussões importantes no estado nutricional infantil”.
Continuando a olhar para o estudo, é possível ainda dizer que é na região Centro que se concentra o maior número de crianças com excesso de peso (38%) e que são as crianças com oito anos que apresentam os valores médios de excesso de peso mais elevados (42%), quando comparadas com as crianças de seis (27,3%) e sete anos (34,9%).
Obesidade infantil é a doença mais prevalente na infância
Importa referir que a obesidade infantil é a doença pediátrica mais prevalente a nível mundial. As estimativas apontam para cerca de 200 milhões de crianças em idade escolar com excesso de peso, das quais 40 a 50 milhões são obesas. Na Europa, esta realidade é “particularmente preocupante nas crianças de estratos socioeconómicos mais desfavoráveis” e estima-se que haja 40 a 50 milhões de crianças com excesso de peso, 10 vezes mais do que em 1970.
E por que foram escolhidas crianças entre os seis e os oito anos? Porque se trata de um “grupo ‘chave’”, na medida em que “precede a puberdade e é fundamental para prever a obesidade na idade adulta”, lê-se no estudo agora divulgado. Além disso, é pelos seis anos que “acontece o segundo ressalto adipocitário (período de rápido crescimento da gordura corporal)”.
O COSI é um sistema europeu de vigilância nutricional infantil, lançado em 2007 pela Organização Mundial de Saúde, e liderado por Portugal a nível europeu. Além de permitir monitorizar o estado nutricional das crianças e comparar com outros países, este estudo “procura ainda providenciar os governos e os decisores políticos com dados que permitam desenvolver e implementar uma estratégia multisetorial e multidisciplinar na abordagem da obesidade infantil, com medidas de prevenção precoce”, termina o estudo.
Ana Rito sublinhou também este fator. “Este estudo tem tido uma importância muito grande porque o mapeamento desta doença a nível da infância tem tido um interesse para adaptar medidas de saúde pública a nível regional. Cada vez que vigiamos acabamos por intervir”, acrescentou a investigadora, dando como exemplo o caso dos Açores. Em 2010 apresentava uma prevalência de crianças com excesso de peso de 40,5% e em 2013 tinha reduzido para 24%.