O debate ia já longo na Associação 25 de Abril, em Lisboa, quando Sousa e Castro, cabeça de lista do PDR, deu um murro na mesa. “Se continuarmos discutir peanuts, então não vamos a lado nenhum. A crise não se resolve com um aumento de 150 mil réis no salário mínimo e uma diminuição de 150 mil no salário máximo”. A crise resolve-se, explicava o capitão de abril, reformando o sistema político, escrutinado “os gajos e as senhoras que têm responsabilidades políticas” e criando um sistema assente na “meritocracia para os atores políticos”.
Na outra ponta da mesa, Joana Amaral Dias, cabeça de lista do Agir/PTP/MAS por Lisboa, pegava nas palavras de Sousa e Castro para lembrar aos colegas de mesa que é “muito mais aquilo que une as forças políticas emergentes do que aquilo que as divide”. Era preciso, por isso, não “perder o norte”, sublinhava a psicóloga. “As nossas grandes divergências são com quem que nos trouxe ao abismo. Os nossos inimigos são esses”.
A mesma Joana Amaral Dias que começou por criticar a falta de debates entre forças políticas emergentes e partidos com assento parlamentar, esta divisão entre “Liga Zon/Sagres” e “Liga dos Últimos”, onde os partidos do chamado “arco da corrupção” não vão a jogo com as forças políticas que estão agora a nascer. “[Olhe], que no futebol também há os tomba-gigantes”, lembrava Mendo Henriques, cabeça de lista por Lisboa do Nós, Cidadãos!.
Neste debate entre candidatos a “tomba-gigantes”, foram, como assinalava Joana Amaral Dias, mais as convergências do que as divergências. Os seis estiveram de acordo em três pontos essenciais: a necessidade de proteger as funções sociais do Estado; a criação de uma política de impostos mais justa e de uma máquina fiscal menos agressiva; e a realocação de recursos do Estado para áreas de investimento imprescindíveis para o crescimento do país.
Foi precisamente por aí que começou Marisa Filipe, do Livre/Tempo de Avançar. “Este país precisa de uma política de investimento séria que o tire da crise”. Com que recursos? A candidata respondia: através deu um Orçamento que utilize os saldos primários nulos ou positivos para voltar a fazer investimento público em áreas como a Educação e a Saúde.
O Livre/Tempo de Avançar defende “um Estado que não é assistencialista, mas sim solidário“, um Estado que não cobre taxas moderadoras na Saúde, um Estado que não “nos meta medo” na altura de cobrar dívidas a pequenas e médias empresas, mas sim que abra espaço à renegociação dessas dívidas, e um Estado que seja capaz de proteger os trabalhadores independentes, “que não podem pagar 123 euros à Segurança Social quando recebem apenas 50”.
Mendo Henriques, do Nós, Cidadãos!, começou por concordar com Sousa e Castro e Joana Amaral Dias: “O problema [do país] é político e não fiscal”. Ou seja, não basta ajustar as contas para colocar o país nos eixos. É preciso uma profunda reforma do sistema político português.
Para já, existe uma de que o Nós, Cidadão! não abdica: a renegociação das parcerias público-privadas (PPP) celebradas nas área da Saúde e da rodovia, por exemplo, e que são lesivas para o Estado – verdadeiros “contratos leoninos que prejudicam o país e o contribuinte”. E se as empresas não aceitarem as condições dessa renegociação, Mendo Henriques não excluiu a hipótese de avançar para a renacionalização.
O dirigente do Nós, Cidadãos! deixava para o fim uma medida que foi ressuscitada por Pedro Passos Coelho na entrevista a José Gomes Ferreira, na SIC Notícias: a possibilidade de obrigar as empresas com um grande volume de negócios mas com o baixo de número de trabalhadores a contribuírem mais para a Segurança Social. “O financiamento da Segurança Social não deve assentar no número de trabalhadores, mas deve assentar sim no volume de negócios de cada empresa”. Nessa linha, vai ser possível “isentar uma boa parte das microempresas” do pagamento da TSU, ao mesmo tempo que as grandes empresas vão ser obrigadas a um maior esforço, explicou o candidato.
Mas a pergunta servia para todos: como garantir que as contas não descarrilam e que o país cresce, sem cortar em salários e pensões? Uma das medidas para travar a despesa do Estado sem comprometer as funções sociais, explicou Nuno Moreira, do Juntos Pelo Povo (JPP), é o fim da reorganização cíclica da máquina do Estado a cada nova legislatura – de quatro em quatro anos, “novos ministérios, novas secretarias de Estado, novos institutos públicos” que custam ao Estado português, “dezenas ou até centenas de milhões de euros”.
Em matéria de Segurança Social, Nuno Moreira defendeu, entre outras coisas, a criação de um sistema privado, complementar ao modelo atual, mas não obrigatório.
Para José Paz, do Partido Unido dos Reformados e Pensionistas (PURP), a prioridade, como não podia deixar de ser, é a luta contra o aumento da idade de reforma, que, a acontecer, coloca “um travão ao desenvolvimento do país”. “Os jovens entram cada vez mais tarde no mercado de trabalho e com salários mais baixos. Não se deve penalizar toda uma geração que está a sair das suas formações e que só vai conseguir entrar no mercado de trabalho na área em que se especializou aos 35 anos”.
Ainda em matéria de emprego, José Paz defendeu o aumento do salário mínimo para 600 euros até 2019 e a diminuição da carga de impostos sobre o trabalho. Os portugueses não podem continuar a trabalhar “seis meses do ano só para pagar impostos”, sublinhou. Quanto às pensões, tudo fica como está, até porque, “até prova em contrário”, o sistema “é sustentável até 2050”.
Neste debate a seis, houve espaço para a questão da dívida pública? O tema estava quase esquecido, mas Joana Amaral Dias não deixou passar a oportunidade para criticar aquilo que considera ser uma dívida “ilegal e criminosa” e deixar a pergunta no ar: “Por que raio havemos de estar a pagar os desvarios de Oliveira e Costa, de João Rendeiro ou de Ricardo Salgado?“, lembrando que o Estado português “gastou 96 mil milhões” para salvar seis bancos em seis anos.
Daí, a ex-bloquista passou para as críticas à política de austeridade, que não foi “Passos Coelho a tirá-la da cartola”, foi a Europa a impô-la. E essa austeridade, continuou Joana Amaral Dias, “não serviu para cortar a dívida e o défice” como tem argumento a coligação. Serviu para promover “uma transferência massiva do dinheiro do bolsos dos trabalhadores para os bolsos do grande capital” e “de uma minoria minoria egoísta” e “corrupta” que vai “acumulando os recursos que são de todos”.
Uma transferência permitida pela Europa “antidemocrática” que não avança para “uma política fiscal comum” que ponha termo às offshores. “Sem uma oposição firme e impecável”, dizia a ex-bloquista, “será impossível travar” a transferência de rendimentos “do bolso dos trabalhadores para o bolso do grande capital”. É, por isso, passar da “resistência à luta” no combate à corrupção.