2,4 milhões de euros para aterrar em Londres com vista para o rio. O chef Nuno Mendes quer relançar o restaurante que abriu em 2010 e fechou em 2014, com uma estrela Michelin no cartão-de-visita, o Viajante, e está a convidar toda a gente a fazer parte do projeto. Como? Através de uma campanha de crowdfunding (financiamento coletivo), em que qualquer pessoa pode participar a partir de 14 euros. Se em 60 dias não conseguir juntar esta quantia, o dinheiro é devolvido a quem investiu. Perde tudo.

“É um risco enorme. Das duas, uma: ou vai ou racha, não há outras oportunidades. Eu acredito no projeto, mas o que é interessante é ver que se não conseguir angariar os fundos, então quer dizer que não era suposto o projeto existir. E então, aí, é melhor o restaurante nem abrir”, explicou ao Observador o chef que em maio abriu o restaurante de gastronomia portuguesa Taberna do Mercado, no coração de Old Spitafields Market, em Londres.

A campanha de crowdfunding decorre na plataforma da Seedrs, a startup luso-britânica que permite que indivíduos e instituições invistam a quantidade que desejarem em empresas europeias – foi a primeira plataforma do género a ver a sua atividade autorizada pelo regulador de atividades financeiras britânico, o Financial Conduct Authority. Em troca dos 2,4 milhões de euros para relançar o Viajante, os investidores recebem, no total, 33% em ações. 

Em 2014, Nuno Mendes viu-se obrigado a fechar as portas do restaurante que nove meses após ter aberto ganhou a primeira estrela Michelin da carreira do chef. “Foi bastante difícil para mim. Prometi a mim próprio que quando tivesse uma posição diferente na minha vida, gostava de voltar ao projeto e melhorá-lo. Porque o Viajante tinha muito espaço para melhorar”, conta. O que levou a fechar portas? O facto de dividir o negócio com o sócio e também senhorio.

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“Foi algo que me doeu bastante, porque passei anos e anos a pensar que o restaurante era meu. No dia em que fechei a porta, percebi que não era. Essa também foi uma das razões pela qual optei pelo ‘crowdfunding’, porque era uma estrutura mais interessante do que a anterior. Queria que fosse um espaço onde tivesse controlo sobre a forma como as decisões eram tomadas”, afirma. 

Conta que o Viajante foi um restaurante pelo qual muita gente se apaixonou – não só os fundadores, mas os clientes. “Quis dar-lhes opção de participarem no projeto, sem serem necessariamente acionistas”, diz. Se em 60 dias Nuno Mendes conseguir os 2,4 milhões de euros, além das ações a que têm direito, os investidores passam a usufruir de condições de exclusividade, como a garantia de reservas, refeições gratuitas ou convites VIP (Very Important Person). 

O chef português, que já colaborou com nomes como Wolfgang Puck, Rocco di Spirito e Jean-Georges Vongerichten, em cidades como Londres ou Nova Iorque, afirma que quer “ter um lugar onde possa celebrar o espaço”, o que nem sempre é possível na terra de Sua Majestade. 

“Estou a pôr o meu coração, a minha paixão na linha. Podia estar calado e sentado no meu canto, a divertir-me com o sucesso que tive ultimamente e não fazer mais nada. Mas acredito imenso neste projeto e se não resultar as repercussões são más. Vai soar mal, vai ser uma derrota enorme, mas tenho de assumir isto. Tenho este bichinho carpinteiro em mim e estou a tentar convencer as pessoas que ainda há espaço para o Viajante. Se não conseguir angariar os fundos, é porque estou errado. E esta é a melhor maneira de vermos se vale a pena avançar com o projeto ou não”, afirmou.

O Viajante foi a estreia de Nuno Mendes em Londres, mas depois seguiram-se novos projetos. Em maio de 2011, inaugurou o Corner Room, um projeto semelhante, mas mais informal e em fevereiro de 2014, juntou-se a Andre Balasz como chefe executivo do Chiltern Firehouse e em maio de 2015, abriu a Taberna do Mercado, que diz ser “um orgulho enorme”. 

A Taberna do Mercado “é uma memória desfocada de Portugal, mas que está a ser reconhecido, que está a mostrar o que há de bom no nosso país e está a despertar interesse no público londrino”, conta ao Observador ao telefone, entre reuniões. Acrescenta que está “a contar uma história, a dos nossos sabores, nossos produtos e das nossas pessoas”.