O Conselho das Finanças Públicas diz que as previsões macroeconómicas no draft de OE “apresentam riscos relevantes” e enumera mesmo vários grandes riscos para o Orçamento.

Num longo relatório feito a pedido do Governo, e que está anexo ao documento orçamental entregue esta sexta-feira na Assembleia, a instituição liderada por Teodora Cardoso diz que “os riscos decorrentes de previsões que se revelem otimistas são especialmente significativos num contexto de forte incerteza quanto à evolução da economia mundial e de elevado endividamento da economia portuguesa”.

O crescimento assente na procura interna, designadamente no consumo privado, corresponde a uma tendência bem documentada no passado. Embora não implausíveis estatisticamente no curto prazo, as previsões quanto ao comportamento dos preços, do investimento e do comércio externo em 2016 podem ser consideradas como pouco prudentes.

Os “riscos relevantes” neste projeto de Plano Orçamental aconselham a que se tenha “especial consideração no acompanhamento da situação da economia e da execução do Orçamento do Estado em 2016”, diz a instituição liderada por Teodora Cardoso neste parecer. Um parecer que, lê-se no documento, “defronta-se com a dificuldade de apreciar o cenário macroeconómico de curto prazo subjacente [ao projeto de plano orçamental] sem recurso ao pano de fundo que deve presidir à estratégia de política económica para a legislatura com vista a justificar e viabilizar as opções nele contidas”.

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Ainda assim, a equipa de Teodora Cardoso reitera a sua apreensão em relação ao facto de ter havido uma “opção clara com respeito ao ano em curso que consiste em definir a procura interna como principal motor do crescimento da economia”.

Esta é uma evolução expectável a médio prazo, sobretudo após a forte correção observada no decurso do PAEF. A sua viabilidade dependerá, contudo, crucialmente de medidas estruturais capazes de compensar a perda de competitividade que caraterizou a economia na década que precedeu a crise. Dessa perda resultou a quase estagnação do crescimento económico e a quebra do emprego, não obstante políticas orçamentais e de crédito de forte estímulo à procura interna, que se saldaram pelo aumento insustentável do endividamento do país.

Assim, o Conselho das Finanças Públicas (CFP) conclui que “as previsões incluídas no PPO/2016 dependem crucialmente de hipóteses cuja concretização não está assegurada, em particular no que respeita ao crescimento da procura externa e à evolução dos preços”.

E “mesmo no curto prazo, a evolução mais recente em mercados importantes para as exportações portuguesas aconselha prudência quanto à hipótese de crescimento da procura externa. Contudo, os riscos mais relevantes do cenário respeitam às hipóteses de evolução dos preços e do seu impacto imediato na competitividade da economia e, por consequência, no crescimento do PIB e do emprego”, sublinha a equipa de Teodora Cardoso.

Finanças foram demasiado otimistas nos últimos 20 anos

“Uma especial prudência” em relação às previsões para a economia é ainda sustentada na conclusão de que as projeções passadas feitas pelo Ministério das Finanças, em sede de propostas de Orçamento do Estado, se revelaram “tendencialmente optimistas”.

Numa caixa intitulada, o “Erro Associado aos Exercícios de Previsão”, o Conselho de Finanças Públicas foi analisar o grau de confirmação das projeções realizadas ao longo de 20 anos, entre 1995 e 2015, um período que apanha governos socialistas e de coligação PSD/CDS.

Assinalando a incerteza que está sempre associada a estes exercícios e a dificuldade em ponderar choques, o CFP calculou os intervalos de confiança associados às previsões do Ministério das Finanças, partindo dos erros de previsão (diferença entre o valor previsto e o verificado no ano seguinte) nos seguintes indicadores.

  • Crescimento da economia (PIB)
  • Consumo privado
  • Consumo público
  • Investimento
  • Exportações
  • Importações
  • Inflação
  • Taxa de desemprego

Apesar de os intervalos da previsão serem simétricos, o que admite desvios positivos e negativos, a conclusão para os últimos 20 anos, é a de que “as previsões passadas do Ministério das Finanças para os Orçamentos do Estado demonstraram-se excessivamente otimistas, o que pode ser fruto quer da assunção sistemática de hipóteses mais favoráveis, quer do funcionamento do próprio modelo de previsão”. Os maiores impactos destes “erros” são sentidos do lado da receita.

Considerando este desempenho passado, o órgão liderado por Teodora Cardoso aconselha “especial prudência na análise das previsões para 2016”, com destaque para as seguintes variáveis do Produto Interno Bruto: investimento, exportações e importações e previsões de inflação, cujo comportamento revelou “um risco de assinalável”. E deixa o alerta: “eventuais erros de previsão com dimensão considerável podem ter implicações relevantes nas projeções orçamentais, em particular do lado da receita, tornando a execução orçamental mais exigente”.

Leia aqui, na íntegra, o Parecer do CFP sobre as previsões do plano orçamental para 2016

Galamba recorda parecer do CFP de 2012

O deputado socialista João Galamba já reagiu aos avisos do Conselho de Finanças Públicas ao Orçamento de António Costa/Mário Centeno. Galamba compara o parecer sobre o documento para 2016, com o que foi feito em relação ao de 2012, elaborado por Vítor Gaspar.  “Sobre o orçamento para 2012, o primeiro de Vitor Gaspar, o Conselho de Finanças Públicas disse que era muito prudente e que assentava na melhor teoria económica existente. Essa teoria era a do economista Italiano, Alesina, que defendia o frontloading da austeridade porque entendia que essa austeridade, se aplicada com zelo, geraria imensa confiança e até – pasme-se – algum crescimento económico”, escreve o deputado no Facebook..

“Hoje sabemos o desastre causado por esta opção de política orçamental: o ano de 2012 foi um desastre económico, social e orçamental. Foi pouco prudente Gaspar e foi pouco prudente o CFP quando apoiou entusiasticamente o radicalismo do então ministro das finanças. Estranhamente, o mesmo CFP que acusa o actual Governo de ser pouco prudente no orçamento que propõe para 2016 ainda não admitiu os erros de 2012 e nunca se retratou quanto ao que escreveu sobre esse orçamento, o mais desastroso (e imprudente) das últimas décadas em Portugal”, acrescenta João Galamba.