Passavam oito minutos das dez de sábado à noite quando foi anunciada no MEO Arena a entrada de Seu Jorge, o segundo espetáculo de uma série de dois (o primeiro foi na noite de sexta-feira, em Guimarães). A noite estava gelada, no dérbi a bola ainda rolava e na sala, já de si habitualmente fria, o calor humano não sufocava: a plateia estava composta mas havia clarões de cadeiras vazias nos anéis.

O concerto arrancou com “Ela É Bipolar”, com um Seu Jorge um pouco retraído e a cantar para dentro. Subiu ao palco de casaco com capuz e óculos de sol, pouco efusivo, a fazer jus à letra “tem dia que tá baixo astral”. O cantor brasileiro veio apresentar o mais recente trabalho, Músicas para Churrasco II, e seguiu para “Na Verdade Não Tá”, “ela pensa estar curtindo, mas na verdade não tá”. Quem também não estava a curtir por aí além a entrada um pouco afoita do cantor era o público, que se mostrou pouco efusivo nas palmas. O som não ajudava e poucos conseguiam discernir as palavras entoadas em “Faixa de Contorno”, que ainda assim pôs um casal a dançar na plateia.

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Passa a “Dois Beijinhos” e depois cumprimenta — finalmente — o auditório, de frente para um cenário minimalista que reproduzia o calçadão de Copacabana, no Rio de Janeiro. Entre as ondas pretas e brancas do décor, a banda Black Service (bateria, guitarra, baixo, secção de metais, teclas e DJ) brilhou, apesar da qualidade do som deixar bastante a desejar.

Seu Jorge cantava “eu fiz de tudo mas era tarde, foi o que eu podia dar você não entendeu” (de “Quem Não Quer Sou Eu”), quando puxa da flauta transversal e tenta cativar a arena. O “Bom Senso” imperou com “já senti saudade, já fiz muita coisa errada, já pedi ajuda” e seguiu-se um forte “boa noite, Lisboa!”

O cantor já mostrava o cabelo e mais empatia, mas o público continuava alheado do registo intimista e pouco sambável. E quando o músico se senta em frente à plateia, sozinho ao violão, levantam-se vozes que aproveitam a proximidade para fazer pedidos: “São Gonça”, “São Gonça”!

Seu Jorge não desfaz o alinhamento e prossegue com “Preciso me Encontrar”. Quando a sua voz rouca entoa “deixe-me ir, preciso andar, vou por aí a procurar, rir pra não chorar”, o público rende-se e concede-lhe o primeiro aplauso caloroso da noite. O músico responde ao carinho do público e agora já de guitarra na mão, entrega-se nas versões dos temas de David Bowie que tocou no filme de Wes Anderson, “Um Peixe Fora de Água”.

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Com “quantos sonhos já destrui, e deixei escapar das mãos, se o futuro assim permitir, não pretendo viver em vão”, a sua versão de “Life On Mars?”, chega ao ponto alto da primeira parte do espetáculo. Segue para “Rebel, Rebel” e depois brinda a plateia com o êxito “São Gonça”, que acaba por soltar as vozes e acompanha. A sala está animada, mas quer mais e quando o cantor resolve fazer “um brinde a vocês todos”, os gritos são pela Marisa Monte, que segundos depois aparece. O público saúda-a com a maior ovação da noite, com muitos a levantarem-se das cadeiras e a seguir para a frente de palco.

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Marisa Monte canta “De noite na cama“, Seu Jorge volta a pegar na flauta transversal, e a cantora segue para “Dança da Solidão” que começa a fazer levantar alguns pés do chão.

“Gente! Que lindo vocês cantando com a gente!”, diz Marisa Monte. “Eu Sei (Na Mira)” e “Passe bem”, são as canções que se seguem, dentro do mesmo registo acústico e com o entrosamento das vozes e dos tempos dos cantores bem ensaiados. (Antes do espetáculo de Guimarães, Marisa Monte postou na sua conta no Instagram um vídeo para abrir o apetite dos fãs, precisamente do ensaio que os dois fizeram a cantar o sucesso dos Tribalistas.)

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Ouve-se e canta-se “Amor I love you“, o ambiente está como se quer e há cada vez mais quem dance e cante em pé. Quando o amor entrou — literalmente — em cena, as rosas vermelhas no vestido de Marisa Monte deixam de ser as únicas em palco.

Roberto, um dos músicos da banda de Seu Jorge, arrebata o microfone e de ramo de rosas vermelhas na mão pede a Fabiana que suba ao palco.

“Deixe eu dizer que te amo”, diz à companheira de 12 anos com quem tem um filho de oito — todos ficamos a saber de tudo. E em frente à plateia e acompanhado de um sonoro feedback (as falhas técnicas não escolhem os momentos), pede-a em casamento.

“Ela disse sim!,” repete Marisa Monte que aproveita para puxar (ainda) mais pelo público entoando mais algumas vezes o refrão de “Amor I love you“. A cantora sai de cena e despede-se com um “já estou morrendo de saudade”.

Seu Jorge volta a ser protagonista e explica que Roberto toca com ele desde 2004, “o filho dele eu vi nascer” e “é minha família”. E aproveita para fechar a segunda parte do espetáculo com “Everybody Loves the Sunshine”, com a banda a destacar-se no final da música. O cantor desce e os músicos apresentam vários solos, ao ritmo do samba enredado em soul, com muita animação.

Contagiado pelo calor (já sem casaco) e mais energético, Seu Jorge regressa ao palco para revisitar os sucessos “Mania de Peitão” e “Mina do Condomínio” a colar com “Chega no Suingue“. O ambiente está mais mexido e sempre a mostrar a sua ginga característica, o músico carioca passa para “Amiga Da Minha Mulher” e de seguida, “Carolina”. Ao som dos primeiros acordes de “Burguesinha”, muitos dançam em frente do palco, nas laterais e ao lado das cadeiras.

Quando a música acaba, ninguém arreda pé e começa o coro pelo encore. Cinco minutos depois a banda regressa e Seu Jorge “vai buscar a comparsa” para repetirem “Passe bem”.

“Noite inesquecível!”, diz Marisa Monte com simpatia, e despede-se. O público não desarma e Seu Jorge oferece “Felicidade“, a uma audiência feliz (mas não eufórica) e reforça com “Pessoal Particular”.

“Essa é nossa saideira”, anuncia finalmente Seu Jorge.

O concerto termina “enfrentando um dragão por dia, na sua companhia, a gente chega lá“, com “Alma de Guerreiro“. Depois de um começo algo frio e talvez intimista demais para as expectativas do público, Seu Jorge corrigiu a mão. Salve Jorge! O concerto terminou em alta, com a banda a gingar uma despedida que muitos pés dançaram até ao desligar do som. Pelo meio, Marisa Monte levou a plateia à paixão e à emoção.