Até onde vai a admiração de Vladimir Putin por Donald Trump? Em dezembro do ano passado, o presidente russo tinha tecido considerações sobre o candidato republicano à Casa Branca que foram tidas como elogiosas: um homem “brilhante”, “incrível” e “talentoso”. Agora, questionado sobre o assunto, o líder do Kremlin reiterou a afirmação, mas com um ligeiro recuo. “Só disse que era uma pessoa brilhante. E não é?”, limitou-se a dizer, usando um adjetivo russo que pode ter dupla interpretação. Desta vez, Putin disse até estar preparado para trabalhar com qualquer candidato que saia das eleições presidenciais norte-americanas. Afinal, “a América é uma grande potência mundial, provavelmente a única superpotência”, admitiu.
A palavra russa usada para descrever o polémico candidato republicano foi яркий que, segundo o jornal britânico The Guardian, quer dizer “brilhante” na sua tradução direta, mas pode ter um sentido conotativo dúbio — uma outra tradução possível aproxima-se de “espalhafatoso”. “É como eu disse na altura, Trump é uma pessoa brilhante. E não é? Não disse mais nada sobre ele”, afirmou na sexta-feira aos jornalistas durante o 20º Fórum Económico Internacional em São Petersburgo, na Rússia, onde estiveram reunidos vários líderes políticos.
Deixando os elogios de caráter de lado, preferiu afirmar que a Rússia está preparada para trabalhar com qualquer candidato americano que seja eleito nas presidenciais dos EUA, e que Trump até tem dito em campanha que quer melhorar as relações com a Rússia. “O Sr. Trump diz que está preparado para restabelecer as relações russo-americanas. Há alguma coisa de mal aí? Todos queremos isso, não é?”, atirou.
Falando à margem do Fórum Económico Internacional, Putin admitiu ainda que os EUA são “provavelmente a única superpotência” dos dias de hoje. “Nós aceitamos isso”, disse, sublinhando estar pronto e disponível para trabalhar de perto com os norte-americanos no pós-eleições. “O mundo precisa de nações fortes, como os EUA. E nós precisamos deles. Só não os queremos constantemente a meter-se nos nossos assuntos, dizendo-nos como devemos viver e prevenindo a Europa de construir uma relação connosco”, disse, citado pelo Guardian, referindo-se às sanções aplicadas à Rússia por parte da UE e dos EUA devido à ação militar na Ucrânia.
Em dezembro do ano passado, pouco antes de Donald Trump conquistar a nomeação republicana para a corrida à Casa Branca, Putin descreveu-o como uma pessoa “brilhante”, “sem sombra de dúvida”. “Não é da nossa conta decidir sobre os seus méritos, isso cabe ao povo norte-americano, mas ele é absolutamente o líder nesta corrida presidencial”, disse. Trump interpretou sempre as palavras do presidente russo como sendo um grande elogio à sua inteligência e talento, não considerando os vários significados menos literais que as palavras poderiam ter, e cujo sentido se poderia ter perdido na tradução.
Certo é que Trump e Putin têm vindo a trocar elogios desde o ano passado. O republicano chegou a comentar em dezembro que o russo era “um líder forte e poderoso que representa seu país”. No mês passado, um mural pintado na Lituânia tornou-se viral nas redes sociais por retratar Putin e Trump a dar um beijo.
A candidata democrata, Hillary Clinton, de resto, é vista como podendo vir a aumentar a tensão entre os EUA e a Rússia, caso venha a ser eleita. Foi o que disse numa entrevista Konstantin Kosachyov, líder do comité dos negócios estrangeiros do parlamento russo, que afirmou que Trump, ao mesmo tempo que oferecia a perspetiva de melhoria das relações bilaterais, também era “demasiado imprevisível”.