A decisão do Conselho de Estado francês de suspender a proibição do burkini numa estância balnear no sul do país foi recebida com desconfiança pela direita, com satisfação por parte da esquerda, incómodo por outros setores de esquerda, e com alívio pela comunidade muçulmana. “Esta decisão de bom senso permite diminuir a crispação nesta situação, que tem estado marcada por uma tensão muito forte entre os nossos compatriotas muçulmanos, sobretudo as mulheres”, disse Abdallah Zekri, secretário-geral do conselho francês do culto muçulmano, ao Le Monde.

Vários políticos do Partido Socialista tiveram uma reação semelhante, mas a questão não é pacífica na formação de esquerda. O primeiro-ministro Manuel Valls defendeu publicamente a proibição do burkini, decidida por 30 comunas, duas delas dirigidas por políticos socialistas. “Essas proibições não são uma deriva. Isso é uma má interpretação das coisas. Essas proibições foram decididas em nome da ordem pública”, disse Valls na quinta-feira. Já antes o primeiro-ministro dissera que o burkini “não é compatível com os valores de França e da República”.

A opinião de Valls não é consensual, nem mesmo dentro do governo. Numa entrevista à rádio Europe 1, a ministra da Educação considerou que as proibições “não são bem-vindas” e que “agravam os problemas da República” na luta contra o terrorismo. “Ninguém estabeleceu ainda uma ligação entre o terrorismo, o Estado Islâmico, e a roupa que uma mulher usa na praia”, disse Najat Vallaud-Belkacem, que tem origens marroquinas. “Evidentemente que sou contra [o burkini]. Enquanto feminista, laica e progressista, o meu sonho de sociedade é uma na qual as mulheres são livres e orgulhosas nos seus corpos. O que me inquieta é ver os responsáveis políticos de direita a explorar o medo das pessoas”, acrescentou a ministra.

À direita, a decisão judicial não caiu bem. “Não é o Conselho de Estado que governa e faz a lei em França”, disse ao Le Monde Guillaume Larrivé, porta-voz do partido Les Républicains, a formação de Nicolas Sarkozy, que esta semana anunciou a sua candidatura à presidência. “Os islamitas querem fazer recuar a República, mas a República é que tem de fazer recuar os islamitas”, afirmou o responsável, que anunciou que o partido vai apresentar uma proposta de lei, em setembro, que defenda as decisões tomadas pelas 30 comunas.

A Frente Nacional, de Marine Le Pen, é ainda mais peremptória na avaliação da decisão do Conselho de Estado. Para Nicolas Bay, secretário-geral do partido, aquele órgão “optou pela submissão às pressões islamitas” ao tomar “uma decisão consternante”. O dirigente partidário acusou o Conselho de Estado, a mais alta instância do tribunal administrativo francês, de estar “refém de um juiz socialista” e de pôr em causa a autonomia das comunas. A Frente Nacional também quer aprovar uma lei sobre o assunto. “Perante a fraqueza do Conselho de Estado, cabe ao legislador ser responsável e impedir essa vestimenta de apartheid“, disse Florian Philippot, vice-presidente do partido, que está apostado em proibir todos os símbolos religiosos em público: véus, kippas, crucifixos e outros.

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