Há um enorme mercado (invisível) de vendas privadas de automóveis, em que os valores das transacções raramente ultrapassam a categoria do murmúrio ou do sussurro. Isto é, não são tornados públicos, desafiando as leis da adivinhação. Mas há também negócios com registo. Seja de uma ou de outra forma, poucas dúvidas restam que o Ferrari 250 GTO é o carro mais caro do mundo. Por enquanto, mas já lá vamos.
Neste momento há três exemplares à procura de um novo dono. Por isso, se está interessado em integrar o “clube” de que fazem parte o estilista Ralph Lauren, o magnata americano das comunicações Craig McCaw ou o baterista dos Pink Floyd, Nick Mason, apresse-se. É que só foram produzidos 39 e, para além dos três que estão à venda e dos três cujos proprietários acabámos de revelar, é do conhecimento público que só a Microsoft reclama outros dois (um do ex-presidente Jon Shirley e outro do antigo chefe de software da companhia, Greg Whitten), sendo que quem tem um par só para ele é o milionário Chris Cox, de Chapel Hill, na Carolina do Norte. E até já estampou um… Fazem igualmente parte do selecto grupo de proprietários do 250 GTO o presidente da Walmart, Samuel Robson Walton, o dono da multinacional JCB, Baron Bamford, e Baron Laidlaw, um dos homens mais ricos do Reino Unido. São estes senhores que, sempre que a Ferrari organiza umas passeatas exclusivas para os seus clientes 250 GTO, aparecem para o convívio.
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Sabe-se que um dos Ferrari agora à venda – o mais baratinho – chegou a participar em vários desses tours. Trata-se do 250 GTO que está a ser vendido pela Talacrest, com a empresa britânica a pedir apenas 51 milhões de euros pelo Cavallino Rampante. “Apenas”, porque dois particulares pedem mais um milhão em cima desse valor. Um dos vendedores está no norte de França e o outro em Nova Iorque: separados pelo Atlântico, mas unidos no preço que ambos pedem para fechar negócio – 57 milhões de dólares, qualquer coisa como 52 milhões de euros, mais uns “pozinhos”.
Mais de 50 milhões. Mas está tudo doido?
A resposta fica ao critério de cada um, mas o que o mercado diz é que “não”. Sempre que um dos 100 automóveis mais desejados do mundo vai a leilão, tende a estabelecer novo recorde. E o último foi fixado por que modelo? Isso mesmo, adivinhou: em 2014, foi arrematado por 38,1 milhões de dólares (35 milhões de euros) um Ferrari 250 GTO.
Data | Automóvel | Leiloeira | Valor (USD) |
2014 | Ferrari 250 GTO Berlinetta de 1962 | Bonhams | 38.115.000 |
2013 | Mercedes-Benz W196 de 1954 | Bonhams | 19.601.500 (GBP) |
2011 | Ferrari 250 Testa Rossa de 1957 | Gooding & Co | 16.390.000 |
2009 | Ferrari 250 Testa Rossa de 1957 | RM Auctions | 12.402.500 |
2008 | Ferrari 250 GT SWB California Spider de 1961 | RM Auctions | 10.884.900 |
1987 | Bugatti Royale Kellner Coupe de 1931 | Christie’s | 8.500.000 |
1986 | Bugatti Royale Berline de Voyage de 1931 | Kruse | 6.500.000 |
Oficialmente, é assim que reza a história, se bem que corre por aí que, em Maio de 2010, a Gooding & Company tratou da venda de um Bugatti 57SC Atlantic de 1936 por mais de 27,5 milhões de euros. Na altura, acreditou-se que seria o valor mais elevado jamais pago por um carro, mas o certo é que nem o comprador nem o preço exacto foram divulgados.
De transacções superiores a 25 milhões de euros não faltam exemplos: desde um Ferrari 335S Spider Scaglietti (33 milhões), passando pelo Mercedes-Benz W196 Silver Arrow de Fangio (27 milhões), até aos Ferrari 275 GTB (cerca de 26 milhões). Ou seja, a exclusividade paga-se. O número de exemplares produzidos de um automóvel é determinante para atirar lá para cima – onde muito poucos conseguem chegar – o seu valor de mercado. Se não, vejamos: a Mercedes produziu apenas 14 W196, a Ferrari só fez quatro 335S, três 275 GTB/C Speciale e uma dezena de 275 GTB/4*S NART Spider.
Quanto ao GTO, das 39 unidades existentes, 33 foram feitas em 1962 e 1963. No ano seguinte, foi introduzida uma segunda série, ligeiramente diferente, que teve direito a três exemplares novinhos, sendo que quatro dos GTO da primeira série adoptaram a configuração da segunda. Mais, e ainda se fizeram outros três GTO mais potentes (330 cv).
O nome diz tudo
GTO: a sigla abrevia, em italiano, Gran Turismo Omologato. Este Ferrari é um carro de corridas que pode circular em estrada. Mas não é um automóvel de competição qualquer. Pelo contrário, foi especificamente desenvolvido para correr no Grupo 3 dos Gran Tourings da FIA, com a Federação Internacional do Automóvel a requerer para tal a produção de uma centena de exemplares. O que nunca aconteceu mas, ainda assim, o Ferrari 250 GTO não só participou, como chegou a ganhar.
Desenhado por Giotto Bizzarrini, o desportivo de dois lugares é um tracção traseira com motor à frente – um V12 3,0 litros com 300 cv, capaz de levar os 880 kg do veículo mais os respectivos ocupantes a uma velocidade máxima anunciada de 300 km/h.
Para se ter uma ideia da aura que rodeava o modelo, nos Estados Unidos da América – onde custava 16.500€ novinho em folha – tinha de ser o próprio Enzo Ferrari a dar a bênção para a venda. Só depois de o fundador da Ferrari aprovar o comprador é que o representante da marca na América do Norte, Luigi Chinetti, podia fechar o negócio.
Um bom investimento
Em 2008, o apresentador britânico de televisão Chris Evans escreveu um artigo profético: “Por que o Ferrari 250 GTO é o melhor investimento possível”. Não só teorizou, como colocou em prática a sua própria teoria: comprou um, que vendeu posteriormente por 18 milhões de dólares. E, com esse dinheiro, tratou de fixar novo recorde: arrematou por perto de 11 milhões de dólares o Ferrari 250 GT SWB California Spider de 1961 (o 5.º da tabela acima), que chegou a pertencer ao actor James Coburn. Síntese: vendeu um Ferrari, comprou outro (ambos raros) e ainda ficou com 7 milhões de dólares. Não se pode dizer que tenha feito um mau investimento.
Resta saber quanto vai valer o Bugatti Royale Kellner Coupe, que foi arrematado em 1987 por 8,5 milhões de dólares, se voltar de novo a ser leiloado. É que, se durante pouco mais de duas décadas gozou do estatuto do carro mais caro de sempre, de repente, em seis anos, viu os recordes sucederem-se. E consideravelmente. Por enquanto, o automóvel mais caro do mundo, vendido em leilão, é mesmo o Ferrari 250 GTO.