Ter um filho é uma mudança muito grande na vida de qualquer casal. Começa com a gravidez e as alterações na alimentação, passa por um novo estilo de vida e vai até à criação de novos ciclos de sono, que passam a ser mais curtos (ou nenhuns). A verdade é que um bebé não muda somente a vida de quem o rodeia — muda-se a si mesmo, e a um ritmo bastante rápido. É difícil cuidar de um bebé, mas também é difícil ser bebé.
Durante os meses de gestação, todos os bebés dormem e vivem a experiência do dia e da noite, do dormir e do estar acordado, apenas através da mãe. No entanto, e segundo o jornal britânico The Guardian, as mensagens enviadas ao bebé podem confundi-lo, já que os padrões de sono das grávidas alteram devido às mudanças físicas, ao movimento do bebé ou mesmo à necessidade de ir mais vezes à casa de banho durante a noite. Um bebé pode encarar estes movimentos como grande atividade noturna e isso pode deixá-lo confuso.
Daí a importância de dormir bem durante a gravidez — não só estará a ajudar-se a si mesma mas também ao seu bebé. E como se começar a regular os ciclos de sono do seu bebé não fosse suficiente, dormir também é importante para dar à luz. As mulheres que dormem menos de seis horas por noite têm partos mais longos e maior probabilidade de fazer uma cesariana.
Para elucidarmos os pais deste país sobre o que devem fazer para pôr o seu bebé a dormir falámos com a terapeuta do sono Filipa Sommerfeldt Fernandes, que começou por salientar que nem todos os bebés dormem mal: embora pareça um mal comum, apenas 30 por cento dos bebés não dorme à noite. E o facto de dormirem ou não dormirem não é uma ciência exata.
Para a terapeuta, por mais estudos que se façam não se consegue prever se um bebé estará nos 70 por cento que dão descanso aos pais ou nos 30 por cento que são uma dor de cabeça. Ou seja, independentemente de a gravidez ter sido calma, da mãe ser instrutora de ioga, do contexto familiar ou do parto – acredita-se que os bebés que nascem de cesariana dormem pior porque precisam de um maior tempo de ajuste — isso não significa que o bebé não vai chorar a plenos pulmões a altas horas da madrugada.
Filipa diz que efetivamente existem questões físicas que levam a que os bebés não durmam de noite e essas questões têm de ser despistadas, assim como há bebés que nascem com o sono trocado e não existe uma justificação para isso — pode ser da hora a que nascem, pode ser pela mãe ter estado mais quieta –, mas eles próprios organizam-se após duas ou três semanas. No entanto, e ainda segundo a terapeuta, a maior parte dos casos em que um bebé não dorme à noite resume-se a questões comportamentais.
“O ciclo de sono de um bebé é diferente do de um adulto. Enquanto o adulto necessita de renovação celular e para isso precisa de sono profundo, um bebé necessita de desenvolvimento cognitivo e fica-se pelo sono REM, ou seja, sono leve”, diz Filipa Sommerfeldt Fernandes. O ciclo de sono dos bebés é como que “à superfície” e tem a duração de 45 minutos.
A partir do momento em que os bebés acordam de 45 em 45 minutos, os pais também o fazem e com o tempo e o desespero começam só a utilizar as técnicas que veem que funcionam, como pegar ao colo e embalar o bebé, recorrer ao biberão ou dar de mamar. O problema é que esses truques só funcionam até aos 45 minutos seguintes, e às vezes nem isso: basta voltarem a pousar os bebés no berço que eles desatam aos gritos novamente. E a razão pela qual não funcionam é porque os bebés apreendem absolutamente tudo o que os rodeia e tiram uma espécie de “fotografia” ao que acontece sempre que agem de determinada maneira. Um bebé sabe que se chorar a mãe vai dar-lhe de mamar, ou o pai vai pegá-lo ao colo, pois foi dessa forma que foi ensinado.
Isto vai resultar em sestas curtas e na privação total de sono dos pais que, regra geral, queixam-se de que na escola eles dormem perfeitamente e em casa não. Simplesmente porque na escola sempre que um bebé chora as educadoras não vão pegar todos ao colo de hora a hora. É importante ensinar os bebés. Sendo verdade que eles precisam de sentir-se protegidos, essa sensação de proteção não vem só de pegar ao colo — os pais podem sentar-se ao lado do berço para transmitir-lhes toda a calma mas deixando espaço para que eles aprendam a adormecer sozinhos. Não pegar num bebé ao colo de hora a hora não é abandono.
Além disso, a especialista em ritmos de sono salienta que “a alimentação do bebé, a fase de desenvolvimento em que se encontra e a organização do seu dia – que inclui ter tempo de pai e de mãe” — também são fatores importantes para uma boa noite de sono, assim como o sol. Sair à rua é vital para o bebé perceber a diferença entre o dia e a noite e ajustar-se. Assim, sempre que o quarto estiver escuro ele vai perceber que é de noite e, logo, que é hora de dormir.
O leite materno também desempenha o seu papel no que às noites tranquilas diz respeito. Filipa diz que “o leite contém hormonas que acalmam e tranquilizam o bebé, e além disso faz com que os bebés chuchem”, sendo que o reflexo de sucção os acalma (o que explica também que muitos chuchem na própria língua ou no dedo). O facto de o deixar a dormir no seu quarto durante os primeiros seis meses – ou mais, isso é uma decisão dos pais – vai ajudá-lo a escutar a respiração dos adultos e a reger-se por ela.
Resumindo, existem muitas formas de deixar o bebé tranquilo e preparado para a hora de dormir e muitas vezes a culpa de isso não acontecer é dos pais. A terapeuta sublinha que se vive numa época em que se quer emancipar os filhos cada vez mais cedo — todos os pais ficam orgulhosos “quando o filho é o primeiro a aprender a falar francês” –, mas nas coisas básicas os progenitores não querem cortar o cordão umbilical e, acima de tudo, têm medo do choro. Se um bebé está acordado na cama mas está tranquilo, então deixe-o estar lá e não interfira, ele está no mundo dele, não há necessidade de uma mãe ser reativa 24 horas por dia.