Numa palavra, Filipe Faísca resumiu não só a sua coleção mas, sem saber, todo o segundo dia da ModaLisboa. “Caleidoscópio”, disse o criador antes de enviar para a passerelle uma mulher ao mesmo tempo sofisticada e desportiva, tão depressa vestida de seda e renda como de carapuço e pala na cabeça, ou ainda com os tradicionais cobertores de papa portugueses transformados em casacos. Caleidoscópio, neste caso, significa uma coisa “multifacetada” mas ao mesmo tempo individual, dois conceitos que o designer considera fundamentais nos tempos que vivemos, “cheios de referências e informação”. E o que é a moda, afinal, tal como se mostrou no segundo dia de desfiles da 48ª da ModaLisboa? Um caleidoscópio capaz de projetar múltiplas imagens a partir da mesma linguagem, da mulher “desportiva sexy” de Filipe Faísca aos coordenados multiculturais de Kolovrat ou saídos do fundo do mar de Luís Carvalho.

Filipe Faísca apresentou-se pelas 19h30 na Garagem Sul do Centro Cultural de Belém — morada desta edição dedicada às propostas dos criadores nacionais para o próximo outono/inverno — e marcou, como habitualmente, a primeira enchente do dia numa sala com capacidade para mais de mil lugares. Quatro horas antes, e nem de propósito, este sábado “caleidoscópico” começou com os Awaytomars a lembrarem que antes das mil apropriações que uma peça de roupa pode ter, tudo começa com uma tela em branco. Foi literal: abrindo parte do processo de criação aos convidados, o desfile do coletivo em que qualquer pessoa pode propor ideias e vê-las executadas foi antes uma instalação onde os modelos surgiram parados em cima de paletes de madeira, com artistas a rodeá-los e a pintarem as suas roupas ao vivo.

A criação a acontecer em direto no desfile/instalação dos Awaytomars. © Rui Vasco

Do branco pintalgado ao azul profundo, Luís Carvalho fez as honras de fechar o dia numa garagem novamente cheia com um mergulho no fundo do mar ao som de uma versão eletrónica de “Underwater Love”. Foi o regresso do criador “à inspiração na natureza”, desta vez traduzida em peças esvoaçantes com os obrigatórios tons escuros associados às profundezas mas também muitos brilhos e texturas novas para o designer como rendas, lantejoulas e aplicações manuais de pérolas negras.

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Entre a pintura ao vivo dos Awaytomars e o mergulho “Deep” de Luís Carvalho houve tempo para a estreia de duas marcas portuguesas no calendário da ModaLisboa — a Eureka, com os seus sapatos, e a Mustra, com vestuário masculino — e para duas incursões ao Museu Berardo: primeiro a de Ricardo Andrez, que apresentou “Venus as a Boy”, uma beleza nada clássica mas antes apoiada em silhuetas oversized impermeáveis, e depois Kolovrat, que fez uma viagem multicultural até à América do Sul com “Wonderment”, apropriando-se pelo caminho de técnicas da tapeçaria que transformou em abrigos e enormes bolsos bordados.

O mergulho no fundo do mar de Luís Carvalho teve direito a tons escuros e pérolas negras aplicadas manualmente. © Rui Vasco

A 48ª edição da ModaLisboa encerra este domingo com os desfiles de Christophe Sauvat, Valentim Quaresma, Dino Alves e Nuno Gama, entre outros.