Na entrada da loja de tecidos, o cartaz vermelho e branco com letras garrafais a dizer “PROMOÇÕES” saltava à vista de quem passava na Avenida da Liberdade, em Braga. Ana Azevedo resolveu entrar. Começou a mexer nos tecidos e encontrou um retalho preto. Custava 1,95€. “Lembrei-me de fazer um body”, diz a fundadora da Nizza, uma marca que decidiu reinventar os bodies e que já faz parte do guarda-roupa de famosas como Cristina Ferreira, Raquel Strada ou Sofia Ribeiro.
Ana procurou a “modista de garagem” a quem costumava recorrer para criações pessoais sempre que tinha uma festa. “Peguei num papel, fiz um molde e expliquei-lhe o que queria”, conta a designer têxtil. Quando ficou pronto, mostrou o resultado à irmã gémea, Bruna. “O body ficou tão giro que pensei que podia dedicar-me a isto.”
As máquinas de costura, os tecidos espalhados, as tesouras e o vaivém de provas de clientes eram um habitué na casa da avó Azevedo, costureira de profissão. ”Ensinou-me a perceber a qualidade do tecido simplesmente pelo toque”, comenta a jovem de 28 anos.
Estávamos em março de 2014 e Ana estava desempregada há quatro meses. “Tinha mil euros na conta e foi com esse dinheiro que iniciei o projeto”, recorda. Começou a investigar, a procurar inspirações, a ver o que se fazia lá fora e o que a concorrência em Portugal oferecia.
Desenhou os primeiros modelos. “Leves, versáteis, românticos ou com pormenores mais arrojados, cortes diferentes e mais atrevidos”, descreve a designer. A coleção era dedicada à mulher moderna, descontraída, segura, arrojada e contemporânea.
Durante vários meses, acordava de manhã e fazia quilómetros e quilómetros no seu Lancia 2000 para encontrar os melhores fornecedores. “Andei por Guimarães, Fafe, Barcelos, Santo Tirso ou Famalicão para conhecer pessoalmente as fábricas de confeção”, recorda. Ana procurou também uma modelista e costureira com quem pudesse trabalhar. “Não queria um hobby. Queria construir um negócio com pés e cabeça e, acima de tudo, com qualidade.”
Contratou uma modelo profissional da Just Models e um fotógrafo de renome na área de moda, Ismael Prata, para a primeira produção. “Até setembro de 2014 idealizei tudo. Não queria apresentar a marca até saber que estava tudo perfeito”, afirma. Encomendou até as embalagens e etiquetas personalizadas.
Os primeiros nove modelos surgiram na página de Facebook da marca na noite de 18 de setembro. Poucos dias depois, Ana começou a receber mensagens de stylists, atrizes e bloggers de moda a pedirem para vestir as suas peças. Uma delas era a ex-apresentadora e empresária Raquel Prates, que desde o início quis ter a marca na sua concept store, em Lisboa. Outro foi o designer de sapatos Luís Onofre. “Pediu-me para usar os bodies Nizza no desfile do Portugal Fashion”, conta Ana Azevedo.
Chegou dezembro e as vendas de Natal dispararam na página de Facebook, o seu principal canal de divulgação. E os contactos não abrandavam. Num mês a marca chegou a 10 lojas, entre Lisboa, Braga e Viana do Castelo. “No início não tínhamos capacidade para responder a tudo”, recorda Ana Azevedo. A primeira encomenda da Nizza foi de 50 peças. Hoje chega às mil.
Perceberam que apenas duas costureiras não iriam conseguir dar resposta aos pedidos. Precisavam, por isso, de uma confeção com maior capacidade. Encontraram a do “senhor Filipe”, em Guimarães. “É um homem que produz as coleções da Nizza”, conta a fundadora. Mas sempre com o acompanhamento da designer, “para garantir a qualidade”.
Os pedidos para sessões fotográficas, desfiles ou editoriais de revistas de moda começaram a chegar de todo o lado. “ O desfile no Portugal Fashion do Luís Onofre com 24 bodies trouxe muita visibilidade também”, recorda Ana.
Quando a apresentadora Cristina Ferreira apresentou uma nova linha de sapatos e vestiu as modelos todas com bodies Nizza, Ana Azevedo nem queria acreditar. Tal como quando abriu uma revista e viu Catarina Furtado numa sessão fotográfica com um dos seus modelos, ou Vanessa Oliveira numa campanha de publicidade de uma marca de cosmética. “Consegui ver a Nizza em coisas que nem eu, no meu melhor sonho, imaginei”, confessa a CEO da marca.
Tudo isto sem investimento em comunicação ou parcerias com bloggers e enquanto Ana mantinha part-times em outras empresas. “Só no verão de 2016 é que foi possível começar a tirar uma remuneração mensal”, confidencia ao Observador.
Nesse ano, a fundadora da Nizza voltou a Lisboa para fotografar a coleção primavera/verão com o fotógrafo Ismael Prata, em abril. Uns dias antes, tinha-se lembrado de enviar um email à produção de um programa de televisão, Você na TV. “Meia hora depois responderam para apresentar a marca em direto “, recorda Ana Azevedo. “Em 10 minutos de programa tínhamos 300 encomendas”, diz ao Observador.
Os números são reflexo desse boom. Comparativamente ao primeiro semestre de 2015, a marca cresceu quase 300% em 2016 e aumentou a rede de parcerias e lojas a nível nacional. Para continuar a crescer a este ritmo, foi contratada uma agência para tratar da imagem e comunicação.
Nas últimas coleções as responsáveis da Nizza — Ana, a irmã gémea e a mãe — decidiram diversificar e criar novas peças como calças e camiseiros. “Queremos surpreender as clientes e apostar em mais produtos”, explica a designer. Desde que lançou a marca, naquela noite de setembro, já investiu mais de 20 mil euros. Garante que a Nizza ainda não dá lucro. “Mas pelo menos paga todos os compromissos.”
Agora quer dar um salto maior, para fora. “Temos recebido pedidos para vender em Espanha e na Suíça”, comenta Ana. “A máquina está montada. Agora é crescer, mas sempre de forma sustentável.”
Com ajuda de uma empresa externa, Ana Azevedo está a montar o portfólio da Nizza para concorrer aos fundos comunitários do Portugal 2020. Está ainda a definir um plano de internacionalização. Para já, é no showroom em Braga que desenha os novos modelos, contacta com fornecedores e recebe clientes. “Tenho mil peças para a coleção e acredito que vou vender tudo”, diz.
Daqui a cinco anos, Ana espera encontrar a Nizza numa Farfetch. “Acredito que podemos chegar a esse objetivo”, diz. A nova coleção chega dia 21 de março e foi inspirada num perfume de flor de laranjeira que a designer usa. Além dos bodies, há vestidos e conjuntos completos.
Todas as peças têm o nome de mulheres, com influência italiana. Tal como o nome da marca Nizza. “Andei a ver imensos e encontrei este. Significa belo em italiano”, diz. É uma forma de enaltecer o poder e a beleza do sexo feminino. “Não fosse a Nizza uma marca de mulheres guerreiras, eu, a minha irmã e a minha mãe”, conclui a fundadora.
Nome: Nizza
Data: 2015
Pontos de venda: B Concept Store e Urban Project (Braga), The Feeting Room, Urban Project e Magnólia Aviz (Porto), Casiragui Forever (Mafra), Un Croquis de Mode e The Feeting Room (Lisboa), entre outros.
Preços: De 65€ a 120€.
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