Os primeiros quatro versos do oitavo disco de Mount Eerie são o ponto de partida para 11 canções, tão belas quanto tristes. Do início ao fim, Phil Elverum, que desde 2003 se apresenta como Mount Eerie, declama os sentimentos, as memórias e as dúvidas que ficam quando o amor da nossa vida, a mãe da nossa filha pequena, morre, inesperadamente.

A Crow Looked At Me é sobre Geneviève Castrée, que morreu a 9 de julho do ano passado, 14 meses depois de saber que tinha cancro no pâncreas. Segure-se quem alguma vez teve uma Geneviève na sua vida porque, se o luto tem uma banda sonora, é a isto que ele soa.

“A Crow Looked At Me”, de Mount Eerie (P.W. Elverum & Sun)

Em “Seaweed” já se contam 11 dias de saudade e Phil recorda, num tom que nos parece cantado ao ouvido, a casa onde os três moravam em outubro de 2015, quando já havia dores, quando ele tinha de olhar para o outro lado. E, depois, outubro de 2016, quando já não havia Geneviève. Apenas uma casa cheia de memórias demasiado dolorosas, a casa onde ela morreu e que era preciso deixar.

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Chega “Ravens” e o momento em que Phil e a filha deitaram as cinzas daquele corpo, que só tinha 35 anos, nas ondas do mar, um mês depois da sua morte. Em “Swims”, Phil fala com ela e deixa-nos entrar nessa intimidade. “Hoje a nossa filha perguntou-se se a mamã nada. Disse-lhe que sim. E que, provavelmente, é tudo o que ela faz agora.”

Nunca o amor deles, ambos artistas, tinha sido usado para fazer arte. Mas, a partir de uma certa altura, nada mais importou para o canadiano. Afinal, a morte pode ser cantada. E o amor que antes ficava na privacidade das quatro paredes de casa quer-se agora gritado. “Eu faço essas músicas e mostro-as ao mundo apenas para multiplicar a minha voz, que diz que a amo. Quero que todos saibam”, escreveu, na sua página.

[o vídeo de “Ravens”:]

Entre agosto e dezembro de 2016, foi para o quarto onde Geneviève morreu, usou a guitarra dela e o baixo, tocou-os com a palheta que ela usava, serviu-se do mesmo amplificador, do velho acordeão da família, escreveu as letras no papel que ela deixou e olhou pela mesma janela por onde ela tantas vezes contemplou o exterior. O resultado não serve como música de fundo: há aqui uma história para ser escutada e sentida, com tempo e atenção.

Talvez o nome Mount Eerie nunca tenha feito tanto sentido como hoje. Phil Elverum tem à sua frente o monte mais assustador da sua vida. Quanto a nós, temos um dos discos mais bonitos e sinceros do ano.