5 de abril de 1816. Depois de séculos a engolir magma vindo das entranhas da Terra, o monte Tambora acordou para a maior erupção vulcânica de que há registo no planeta. Dez mil indonésios morreram sufocados pelas cinzas expelidas pelo vulcão, atingidos por piroclastos ou devorados pelos 180 quilómetros cúbicos de magma expelido da gigantesca câmara magmática. Outras 71 mil viriam a morrer nos dias seguintes, muitas outras perderam as casas esmagadas pelas cinzas. O oceano estava escuro como carvão. A erupção, cem vezes mais poderosa do que o Monte Santa Helena, foi ouvida em Samatra, a 2 mil quilómetros da Indonésia. A erupção foi tão forte que o próprio vulcão se destruiu e formou uma caldeira que ficou com metade da altura original da montanha. Mas o pior ainda estava para vir: durante quatro meses, o Hemisfério Norte foi atirado para um inverno rigoroso naqueles que deveriam ser os dias mais quentes do ano. E 1816 ficaria para a História como o Ano Sem Verão.

Quando o monte Tambora acordou, 48 quilómetros cúbicos de detritos foram atirados para a atmosfera. Com eles, grandes quantidades de dióxido de enxofre chegaram à estratosfera, a 50 quilómetros de altitude, e reagiram com as moléculas da atmosfera transformando-se no mortífero ácido sulfúrico. Funcionando como refletor, o ácido sulfúrico haveria de impedir os raios solares de chegarem à superfície da Terra e o planeta começou a arrefecer rapidamente. Em trinta horas, a temperatura global da Terra diminuiu 3ºC.

Entre maio e setembro houve 142 dias de chuva na Irlanda. Nos EUA, em junho houve duas grandes tempestades de neve em New England que culminaram em 51 centímetros de neve assentes nas ruas. Em toda o estado da Virgínia brincava-se com trenós como se fosse dezembro, nevava em Boston e havia relatos de gelo na Filadélfia. As ovelhas morreram congeladas no campo. Entre Maine e Nova Iorque, as lagoas congelaram e os pássaros morriam durante o voo de tanto frio que tinham. A partir de julho, os lagos e rios da Pensilvânia começaram a congelar. No Canadá, as primeiras geadas do inverno foram registadas em julho: nunca antes na História tinham acontecido num mês de verão e em 200 anos isso nunca mais voltou a acontecer. Os acontecimentos pareciam tão peculiares que até conduziram a uma irónica história na redação da Old Farmer’s Almanac, uma espécie de Borda d’Água norte-americano e canadiado. Alguém na redacção tinha escrito que a 13 de julho de 1816 haveria “chuva, neve e granizo” na América do Norte. A anedota tinha escapado ao editor e a piada foi publicada. Qual não foi o espanto da população quando, incrivelmente, houve tempo de inverno em pleno verão. Toda a gente passou a acreditar piamente no Old Farmer’s Almanac e as vendas dispararam.

Do outro lado do oceano, no entanto, não houve espaço para piada. Uma epidemia de cólera e um surto de tifo varreram a Ásia. As culturas na China e na Europa foram devastadas pela neve, pela chuva e pela falta de sol, que é essencial para a fotossíntese. Houve cheias gigantescas no vale do Rio Yangtze. Os agricultores que conseguiram proteger os seus campos foram assaltados e o preço da comida, incluindo o da aveia, disparou para oito vezes o preço normal. Ora, a aveia era o principal alimento dado pelos agricultores aos cavalos, que não só ajudavam as pessoas no campo como também eram o principal meio de transporte no século XIX. Até que o alemão Barão Karl von Drais teve uma ideia melhor: a bicicleta.

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Outras ideias nasceram com o sombrio verão invernoso de 1816. Excêntrico e mulherengo, enterrado em dívidas enormes, o poeta britânico George Gordon Byron, 6º Barão Byron, tinha decidido ir passar aqueles que supunha serem dias quentes ao lado suíço do Lago Léman. Com ele estava Mary Shelley, então com 19 anos e ainda solteira, juntamente com o futuro marido e a irmã, que já tinha mantido um romance com Lord Byron de quem depois se tinha tornado boa amiga. Impedidos de aproveitar o verão, trancados dentro do hotel, vários burgueses contavam histórias de terror alemãs traduzidas para francês. Até que Lord Byron convidou os amigos, entre os quais o reconhecido escritor John Polidori, para escrevem as próprias histórias e partilharem-nas com os amigos. Mary Shelley pegou na caneta. E escreveu as primeiras palavras do romance que seria o… Frankenstein.

Passados 201 anos, Lee Foster, meteorologista do Administração Oceânica e Atmosférica Nacional (NOAA) dos Estados Unidos, explicou que a erupção de Tambora foi responsável por agravar uma pequena Idade do Gelo que já havia começado no século XV à conta de um vulcão que os investigadores nunca conseguiram encontrar. Essa Idade do Gelo terminou em 1860. Mas pode voltar a acontecer assim que um grande vulcão voltar a acordar.

Ninguém consegue encontrar o colossal vulcão que atirou a Terra para uma mini-Idade do Gelo