Há nesta banda britânica uma coisa que ou se gosta ou se odeia: a voz de Jonathan Higgs, um agudo nasalado que passa por cima de toda e qualquer camada de som, quase sempre aos gritos. É um senhor falsete, só ouvindo.
Esta característica, capaz de infernizar muito boa gente, volta a ser uma das mais atraentes em A Fever Dream, o quarto álbum do quarteto de Manchester. Isto porque Jonathan Higs utiliza as variações vocais que já se conheciam dos outros três álbuns, mas com mais raiva. Continua, tal como nos discos anteriores, a falar das nossas misérias (da xenofobia ao brexit), mas desta vez com um tapete sonoro que parece acrescentar força às palavras.
Para isso talvez tenha contribuído a maior participação do guitarrista Alex Robertshaw na composição dos temas, adicionando ao trabalho de Higs variações que distinguem este dos trabalhos anteriores. Os Everything Everything nunca foram uma banda de pop mainstream, em 10 anos de carreira produziram três bons álbuns — com destaque para Man Alive (2010) e Get To Heaven (2015) — mas nenhum como este último. Se os anteriores eram indie pop/rock/eletrónico algo frenético mas polido, este sai dos carris, aventura-se.
O maior interesse estético deste disco está nas variações dentro dos próprios temas, tudo nele é quase imprevisível, sem uma estrutura que se adivinhe. Há em A Fever Dream uma espécie de experimentação disfarçada, de início não se percebe para onde vai mas as canções acabam sempre por ter um final feliz, é um álbum onde a estranheza tem sempre uma conclusão lógica — o tema-título é disso uma magnífica ilustração. É talvez, por isso, o álbum mais consistente que fizeram até agora.
Mas isso não faz de A Fever Dream um disco brilhante, tem momentos porventura dispensáveis de tão desconexos do resto, ligações estranhas, canções que aparecem coladas e que vão diretamente da nota 1 à 5 — o tema “Big Game” seguido de “Good Shot, Good Soldier” será o maior exemplo.
Este desequilíbrio é pontual e não destrói o conjunto, é só uma pedra pequena no caminho, coisa sem importância e que até conseguimos encaixar, visto de cima, para um mundo (este) em estado febril. O tema “New Deep” resume com uma tremenda simplicidade a mensagem geral: Is this something wrong with all of this?/ Or is this something wrong with me?
Já se sabe, todos temos dias em que o mundo é feio e as pessoas são más. Da próxima vez que isso lhe acontecer ponha este disco a tocar aos gritos. E dance, vai ver que passa.