Um novo estudo norte-americano diz que o próximo ano pode ser especialmente marcado por sismos de grande magnitude porque a velocidade de rotação do planeta Terra está a diminuir. De acordo com o documento apresentado no encontro anual da Geological Society of America, os cientistas investigaram a incidência de sismos de magnitude igual ou superior a 7 na escala de Richter desde 1900 até agora. Descobriram que há, em média, 15 terramotos com essas magnitudes num ano mas que esse valor tem aumentado para entre 25 e 30 terramotos. Esse aumento, concluíram os geólogos, coincide com momentos em que a Terra trava — isto é, a velocidade de rotação diminui.

Isto mesmo é explicado por Roger Bilham (Universidade do Colorado) e Rebecca Bendick (Universidade de Montana) no resumo do estudo. Segundo o documento, embora os sismos continuem a ser eventos impossíveis de prever por ocorrerem aleatoriamente, a equipa encontrou sinais de que “os terramotos a nível mundial mostram evidências de uma sincronização“. Essa sincronização, sugerem os geólogos, pode estar relacionada com a desaceleração da rotação terrestre: de décadas em décadas, descobriram eles, a travagem na rotação da Terra pode acumular mais energia nas falhas litosféricas e desencadear sismos de grande magnitude.

A velocidade a que a Terra gira em torno do próprio eixo depende do que acontece nas profundezas do planeta, pensam (mas não têm a certeza) os geofísicos. O núcleo externo da Terra é uma camada com 2.200 km de espessura composta por ferro e níquel em estado líquido: esse material derretido mexe-se num padrão mais ou menos previsível. Esse movimento, além de ser responsável por criar o campo magnético terrestre, é suficientemente grande para alterar o movimento de rotação da Terra, acelerando-o ou desacelerando-o por apenas um milissegundo — algo mínimo para os nossos relógios, mas detetável por relógios atómicos. É aí que entra a 1ª Lei de Newton, que afirma que “um corpo em repouso tende a permanecer em repouso e um corpo em movimento tende a permanecer em movimento”: apesar de a Terra desacelerar, o material no interior do planeta tende a continuar o mesmo movimento, acumulando energia nas falhas que compõem a camada mais superficial. É aqui que surge o problema, garantem os cientistas envolvidos neste estudo: a energia libertada pelo núcleo externo viaja em todas as direções pelo planeta e, ao fim de cinco a sete anos, acumula-se nas falhas litosféricas até se soltar sob a forma de ondas sísmicas.

Significa isto que Roger Bilham e Rebecca Bendick sugerem ter encontrado um modo de prever a probabilidade da existência de grandes sismos: depois de um relógio atómico captar uma desaceleração na rotação terrestre, é de esperar que cinco a sete anos mais tarde esses terramotos aconteçam. Na atualidade, os sismos que fustigaram a Cidade do México (magnitude 7.1 na escala de Richter a 19 de setembro), a fronteira entre o Irão e o Iraque (magnitude 7.3 na escala de Richter a 12 de novembro) ou Nova Caledónia (magnitude 7 na escala de Richter a 19 de novembro) podem ter tido origem numa desaceleração na rotação da Terra que ocorreu em 2011, precisamente há seis anos. Mais do que isso: todos estes sismos ocorrem perto da latitude 30º norte ou sul, precisamente na “zona de perigo” encontrada pelos cientistas. É que, nas latitudes mais próximas do equador qualquer desaceleração da rotação vai ter efeitos mais poderosos do que perto dos pólos porque a Terra é 1.600 km/h mais veloz nessa região.

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No encontro em que Roger Bilham e Rebecca Bendick apresentaram o estudo, diz o The Guardian, os autores afirmaram que “a inferência é clara. No próximo ano deveremos ver um aumento considerável no número de sismos de grande magnitude. Já os tivemos este ano. Até agora só tivemos seis deles. Podemos facilmente chegar aos 20 em 2018“. Mas em conversa com o The Washington Post, Rebecca Bendick foi muito mais cautelosa: sublinhou que “correlação não é causalidade”, que o estudo “é sobre probabilidades, não previsões” e que os resultados que a equipa obteve ainda não foram testados em laboratório nem seguidos por outros estudos que pudessem confirmar este documento.

De acordo com a entrevista ao The Washington Post, Roger Bilham e Rebecca Bendick tentaram encontrar sinais de que os tremores de terra pelo mundo estivessem ou não relacionados. Descobriram então que os sismos de magnitude 7 ou mais parecem acontecer com maior probabilidade num intervalo de entre 20 e 70 anos: “A cada três décadas, mais ou menos, o planeta parece passar por um monte deles — uns 20 por ano, em vez dos típicos oito a dez. Era como se algo estivesse a fazer com esses os terramotos se sincronizassem, apesar de ocorrerem em locais distribuídos pelo planeta”. Rebecca Bendick explicou que “basicamente podemos pensar nos terramotos como uma bateria: tem uma determinada quantidade de tempo em que precisa de ser carregada”: “Eventos com um intervalo de renovação como este acontecem juntos mais frequentemente do que de modo aleatório e esse padrão é significativo do ponto de vista estatístico”. Trocado por miúdos: o facto de a Terra ter desacelerado a rotação não significa que um grande sismo vá ocorrer no próximo ano; significa apenas que a probabilidade de acontecer pode aumentar.

Já muitos cientistas teceram críticas às conclusões do estudo de Roger Bilham e Rebecca Bendick. Outros fenómenos podem explicar este aglomerado de sismos que parece ocorrer de tempos a tempos, como alterações nas correntes oceânicas, os movimentos no manto do planeta ou a transferência de momento linear (aquilo a que normalmente chamamos de balanço) do núcleo para a litosfera da Terra — embora a equipa garanta que a rotação da Terra seja a que melhor encaixa no padrão de terramotos estudada. Outra crítica que é feita ao trabalho de Roger Bilham e Rebecca Bendick é que eles estudaram com maior afinco as regiões que já são especialmente fustigadas por sismos, como o Japão, a costa oeste dos Estados Unidos ou a Nova Zelândia, portanto pode não oferecer um plano geral do que está a acontecer no planeta. E, além disso, o período de 117 anos que foi alvo de estudo é muito curto para um planeta dinâmico com mais de 4 mil milhões de anos. Certo é que são precisos mais estudos para confirmar — ou refutar por completo — a teoria destes dois geofísicos.