Chamam-lhe rampa de lançamento para a internacionalização, mas para os três designers que viajaram até Roma para apresentar as suas coleções de outono-inverno 2018/19, a poucos minutos do desfile, a sensação era apenas de nervoso miudinho. Afinal, a AltaRoma é o que a capital italiana tem de mais parecido com uma semana da moda (um momento que Milão reclamou só para si). Durante quatro dias, dezenas de criadores desfilaram no Guido Reni District (uma espécie de Lx Factory lá do sítio). Para domingo, o último dia do programa, ficaram os portugueses, vindos diretamente do espaço Bloom do Portugal Fashion, outra plataforma dedicada a quem dá os primeiros passos no mundo da moda.
“Já tenho um monte de notificações nas redes socais, mas ainda não consegui olhar”, admite Inês Torcato, de 27 anos, depois do desfile. A sala estava composta — meia dúzia de jornalistas portugueses, buyers (sobretudo asiáticos), imprensa italiana e curiosos. A agenda apertada não dá tréguas. Mal acaba a apresentação, é altura de voltar a enfiar todas as peças dentro de malas e de deixar tudo pronto para o regresso ao Porto. Foi o primeiro desfile de Inês fora de Portugal, ela que marcou presença nas últimas três edições do Portugal Fashion na condição de novo talento.
“É bom estar aqui, o meu nome vai circulando. E sei que eles já gostavam do meu trabalho”, afirma. No ano passado, as influências da alfaiataria e as peças unissexo de Inês Torcato valeram-lhe uma referência na Vogue Talents. Mais do que para fechar negócios, um desfile numa passerelle internacional serve para se fazer notar e no caso de Inês, isso acontece graças a um estilo bastante próprio. “Não gosto de me manter agarrada às mesmas coisas. Adoro os tecidos clássicos da alfaiataria e as riscas de giz, mas desta vez usei outros materiais, muito mais técnicos”, explica. A paleta manteve-se fiel à escala de pretos, brancos e cinzentos, mas os nylons impermeáveis entraram em cena. O mesmo podemos dizer de um material, no mínimo, estranho. À vista parece papel vegetal, branco e meio transparente, ao toque algo ligeiramente mais resistente.
“E usei muito mais roupa de homem em mulheres do que costumo fazer”, conclui. O desfile de Inês Torcato foi o único a levar mulheres para a passerelle. David Catalán, por sua vez, usou o menswear puro e duro para regressar à infância, mais precisamente aos dez anos em que foi escuteiro. “Passei por todas as patrulhas e, se algum dia tiver filhos, vou mandá-los para os escuteiros”, brinca. As inspirações chegaram diretamente das fardas, com bolsos e patches estrategicamente dispostos. Para quem conhece o trabalho do designer espanhol (mas que escolheu Portugal para acabar a sua formação e criar a sua própria marca), faltaram aquelas peças mais… tcharan! David tranquiliza os ânimos e esclarece que levou para Roma uma amostra mais comercial da coleção. O melhor ainda está por mostrar, mas para isso é preciso esperar até março.
“As vendas são importantes. O showroom ajuda o negócio a crescer, mas o desfile sobe-te um bocado o ego, deixa-te mostrar a coleção, é aquela palmadita en la espalda“, afirma Catalán. Aos 28 anos, David já não é propriamente um estreante nas lides internacionais. Já passou pela semana da moda de Istambul e montou showroom no Japão, em Paris e na Pitti Uomo, em Florença. Mas é no país do sol nascente que a marca David Catalán quer apostar todas as fichas. Foi de lá que chegou a primeira grande encomenda, por isso tudo leva a crer que é esse o mercado com mais potencial. Logo a seguir vêm os Estados Unidos e os Países Baixos.
Com o foco em Paris está Tânia Nicole, nome que se some à medida que vamos conhecendo a marca (mais ou menos) homónima. Há uma semana, era lá que estava, ao lado de Inês Torcato e de Hugo Costa, numa das principais ruas da capital francesa. Num showroom que mostrava seis designers a compradores de todo o mundo, metade eram portugueses. Agora, é deixar passar as quatro semanas que os buyers levam até fecharem as encomendas. “Temos de sair de Portugal para mostrar o que fazemos e isto é só o começo”, conta.
Em junho do ano passado, Nycole teve a sua primeira grande encomenda. Tal como a coleção anterior, também esta foi buscar inspiração à música. Na origem de “Unknown” está o cantor e compositor britânico King Krule e uma evocação da cultura hip hop dos anos 90. “A silhueta vem muito do hip hop e do streetwear. Depois, tenho partes mais clássicas. Ele faz muito essa mistura de blazers e t-shirts que não têm nada a ver”, explica a criadora de 26 anos. Emblemas e trechos de músicas do próprio artista compõem a antecipação do próximo inverno. Depois desta primeira amostra em Roma, os três designers regressam à passerelle do Portugal Fashion. A próxima edição está marcada para os dias 17 de março, em Lisboa, e 22, 23 e 24 do mesmo mês, no Porto.
O Observador viajou para Roma a convite do Portugal Fashion.