A Fundação vai sair do negócio do petróleo, confirmou a empresa em comunicado, depois de ter recebido uma oferta de compra da participação na Partex — por parte de investidores chineses, sabe o Observador.

Em comunicado difundido esta quinta-feira, a Fundação Calouste Gulbenkian explica que “tem vindo a equacionar a alienação dos investimentos nos combustíveis fósseis (que representaram cerca de 18% dos ativos em 2017), tendo em conta uma nova matriz energética e os seus objetivos em prol da Sustentabilidade, na linha do movimento internacional seguido por outras fundações”.

“A Fundação Gulbenkian tem recebido, ao longo dos anos, várias manifestações de interesse para a alienação da sua participação na Partex, traduzindo o reconhecimento internacional da qualidade da empresa. Recentemente, recebeu uma oferta de compra e encontra-se neste momento em processo de negociações com o grupo interessado. Findo o processo de análise de todas as condições, será tomada uma decisão de acordo com a defesa dos melhores interesses da Fundação”, afirma a fundação.

No comunicado lê-se, ainda, que em caso de acordo nas negociações, a recomposição do património da Fundação continuará, como no passado, a garantir a realização de todas as atividades filantrópicas da instituição que Calouste Gulbenkian quis ver como perpétua e destinada ao Bem da Humanidade”. “Qualquer decisão sobre esta matéria será comunicada pela Fundação, como é sua prática”, remata o comunicado.

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Há cerca de um ano, por ocasião da entrada da nova presidente, Isabel Mota, várias personalidades escreveram à Fundação apelando ao conselho de administração para que “trabalhe numa estratégia de saída dos seus activos relacionados com combustíveis fósseis”. Entre essas personalidades estavam Francisco Louçã e Fernando Rosas, do Bloco de Esquerda, Manuel Alegre e Pedro Bacelar de Vasconcelos, do PS, e ainda por Paulo Morais, ex-candidato à Presidência da República, mas também académicos e nomes das artes.

A carta defendia que uma “transição para uma economia descarbonizada é agora um imperativo incontestado” e sugeria que a Gulbenkian siga o exemplo do Rockefeller Brothers Funds, que em 2014 “decidiu não investir mais em combustíveis fósseis, assumindo o seu compromisso no combate às alterações climáticas, ao mesmo tempo que libertava as suas ações filantrópicas nas mais variadas áreas deste enorme estigma”.

O que é que o petróleo (ainda) representa para a Gulbenkian?

As razões para esta possível venda serão, também, económicas. Desde 2012 que o retorno da carteira de investimentos (sobretudo fundos de investimento em ações) é superior ao retorno da atividade petrolífera.

Nos últimos 20 anos conhecidos (1997-2016), a Gulbenkian teve um retorno financeiro de 1.874 milhões de euros, mais 372 milhões de euros do que teve de retorno petrolífero (1.502 milhões de euros), de acordo com os relatórios anuais da Fundação.

Em 2016, o retorno da carteira de investimentos, de 154 milhões de euros, foi 62% superior ao retorno das atividades petrolíferas (95 milhões de euros). Nesse mesmo ano, as vendas de petróleo e gás foram realizadas em Omã, Emirados Árabes Unidos, Cazaquistão e Brasil.

O negócio petrolífero está concentrado, essencialmente, na Partex, que foi avaliada em 495 milhões de euros em 2016. A carteira de investimentos valia 2,2 mil milhões de euros. As obras de arte da coleção somavam cerca de 16 milhões de euros no balanço em 2016, menos do que os imóveis que valiam 56 milhões de euros.

No final de 2016, 58% da carteira de investimentos da Gulbenkian estava exposta aos mercados acionistas, direta e indiretamente, através de fundos de investimento.

José Neves Adelino, o administrador com o pelouro financeiro, disse ao Observador em 2016 que o objetivo era alcançar uma rentabilidade anual de 5,5% para alimentar o orçamento da fundação. Em 2016, a carteira de investimentos teve uma rentabilidade de 7,7%. Nos últimos 10 anos, a rentabilidade média da carteira de investimentos foi de cerca de 3%.

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