“Alguém, por favor, me aponte um ser humano no mundo inteiro que queira beber água com plástico.” As palavras são de Erik Solheim, o norueguês que dirige o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, e que comentava assim o último estudo conhecido sobre a presença de microplásticos na água.
Os resultados — 90% da água engarrafada de todo o mundo tem vestígios de plástico — já levaram a Organização Mundial de Saúde a tomar uma posição: vai rever os potenciais riscos para a saúde humana de beber água contaminada com microplásticos.
Esta nova investigação analisou o conteúdo de 259 garrafas de 11 marcas diferentes. As garrafas vêm de diferentes lotes e de nove países: Estados Unidos, Brasil, China, Índia, Indonésia, México, Líbano, Quénia e Tailândia. Apenas 17 garrafas não tinham quaisquer vestígios de microplásticos.
Os resultados são ainda mais alarmantes do que os do estudo que analisou água da torneira de todo o mundo. Em setembro de 2017, uma equipa de investigadores concluiu que 83% das amostras de água potável recolhidas em cinco continentes tinham vestígios de plástico. Os dois estudos foram levados a cabo pela Orb Media, uma organização de jornalistas sem fins lucrativos sediada em Washington.
Agora, a OMS — que ainda não tem provas de que a ingestão de micropartículas de plástico pode ser prejudicial para a saúde humana — quer rever o seu conhecimento sobre esta matéria. A grande questão, como explicou um especialista da OMS à BBC, é saber quais as consequências de se passar uma vida inteira a comer e a beber plástico.
No final de fevereiro, um outro estudo publicado na revista científica “Frontiers in Marine Science”, concluía que três em cada quatro peixes de zonas remotas no Oceano Atlântico tinham microplásticos no estômago e no intestino. E estes fazem parte da dieta alimentar de outros peixes como o atum e o peixe-espada que, ao serem ingeridos por humanos, trazem os microplásticos para a nossa cadeia alimentar.
“Quando pensamos na composição do plástico, quando pensamos se existem toxinas ou não nessa composição, quando pensamos até que ponto é que podem ser nocivos e o que é que as suas partículas fazem ao corpo humano… Bom, não existe ainda pesquisa suficiente para nos dar resposta”, explicou Bruce Gordon, responsável pelo trabalho da OMS que envolve água e saneamento a nível mundial. “Normalmente temos aquilo a que chamamos um limite de segurança, mas para defini-lo precisamos de perceber se estas coisas são perigosas e se existem na água em concentrações que possam ser perigosas.”
Um estudo mais antigo, divulgado no início de 2016 pelo Fórum Económico Mundial, apontava para que em 2050 houvesse mais plástico do que peixes nos oceanos, se a utilização deste material a nível mundial se mantivesse.
À medida que mais e mais estudos vão sendo divulgados e que a opinião pública toma conhecimento da dimensão do problema do plástico e da poluição que provoca quer em terra quer nos oceanos, as populações vão olhar para a OMS à procura de respostas. nos oceanos
“O público está preocupado”, argumentou Bruce Gordon. “As pessoas querem saber se a ingestão de plástico as vai deixar doentes no curto e no longo prazo”, disse, defendendo que é para a OMS que se voltaram em busca de conselhos.
O estudo
Ao longo da investigação da Orb Media, foram encontradas vários tipos de plástico na água engarrafada analisada. O mais comum foi o polipropileno, material usado para fazer as tampas das garrafas, seguindo-se o nylon e o PET (polietileno tereftalato), o material mais utilizado para fazer garrafas devido à sua resistência.
As marcas analisadas — e que já contestaram estes resultados, garantindo que os seus produtos respeitam as normas de segurança do mercado — foram a Aqua (Danone), a Aquafina (PepsiCo), acBisleri (Bisleri International), a Dasani (Coca-Cola), a Epura (PepsiCo), a Evian (Danone), a Gerolsteiner (Gerolsteiner Brunnen), a Minalba (Grupo Edson Queiroz), a Nestlé Pure Life (Nestlé), a San Pellegrino (Nestlé) e a Wahaha (Hangzhou Wahaha Group).
À frente do estudo, que está disponível no site da Orb Media, estve Sherri Mason, umas das mais conhecidas investigadoras de microplástico e que já liderara a equipa que estudou a água canalizada.
Os microplásticos são pequenas partículas de plástico com tamanhos máximos que variam entre 1 e 5 milímetros, consoante os investigadores. Hoje em dia são um dos principais poluentes dos oceanos e estão presentes em cosméticos, produtos de higiene pessoal como os exfoliantes, roupas de fibras sintéticas e em muitos outros objetos utilizados no dia a dia.
Devido ao seu tamanho não são filtrados pelas redes de tratamento e acabam nos oceanos, acabando por entrar na cadeia alimentar dos humanos, como alertou recentemente a Quercus, quando desafiou os portugueses a aderirem ao seu desafio 40 dias sem plástico.
O objetivo desta iniciativa é alertar para o perigo da poluição provocada por plástico, um material que demora entre 200 a 400 anos a desaparecer do meio ambiente, segundo a associação ambientalista.
Quercus desafia portugueses a ficar 40 dias sem usar plástico descartável