Com a chuva, menos de uma dúzia de cuidadores informais aderiram à concentração em frente à Assembleia da República, onde esperam que esta sexta-feira se dê mais um passo para a criação de um estatuto próprio. A passagem à especialidade de um projeto de lei do Bloco de Esquerda para haver um estatuto que proteja e apoie quem sacrifica vida e carreira para cuidar de familiares em vez de os institucionalizar será “já uma vitória”, disse à agência Lusa Sofia Figueiredo, que cuida de uma avó que sofre de demência.
“Temos pessoas que gastaram as economias de uma vida, que acabam a ter de pedir o Rendimento Social de Inserção. Isto não é digno. Porquê subsidiar um lar e não subsidiar quem quer cuidar?”, afirmou. A vigilante, que mora em Pinhal de Frades, Seixal, afirma que os cuidadores informais “não têm nada contra os cuidados formais”, mas defendem a opção de cuidar dos familiares, se lhes for dada oportunidade.
Trata-se de uma atividade “24 horas sobre 24” e todos acusam “o cansaço, o stress”, o que leva a que muitas pessoas acabem por estar de baixa, porque é a única maneira que têm de conseguir continuar a cuidar dos familiares. Maria dos Anjos, que trabalhava em seguros, viu-se a braços com duas famílias em vez de uma, quando há dez anos foi diagnosticada Alzheimer precoce à irmã, que tinha dois filhos menores. Sem oferta de instituições que a pudessem acolher, a irmã ficou a cargo de Maria dos Anjos até morrer.
“Nunca se deixa de pensar” nas doenças e nos problemas que levanta, afirmou a ex-cuidadora, que assinala “a raiva” que dá pensar que nunca teve apoio do Estado. Jorge Nunes, de Amora, é um desempregado do comércio que trata da mãe com Alzheimer há dez anos, depois de ter visto o pai morrer com a mesma doença. Numa junta médica, foi-lhe negado um complemento por tratar de pessoa com dependência porque o médico decidiu que a mãe de Jorge estava “perfeitamente capaz” já que se lembrava do seu nome e idade, entretanto esquecidos no caminho de destruição da personalidade daquela doença.
“A minha esperança é que possamos vir a ter alguns apoios. Para já, as pessoas precisam de apoio psicológico, é um desgaste tremendo”, notou. No projeto de lei do Bloco, estima-se que haja 800 mil pessoas que dependem do apoio de cuidadores informais. O Bloco espera que a lei passe à especialidade para que, até ao verão, todos os partidos possam criar entre si um Estatuto do Cuidador Informal.
Se se concretizar, passará a haver cuidados domiciliários para dar formação aos cuidadores, garantir direitos laborais para as pessoas que até agora só têm uma opção – ou cuidar ou trabalhar -, e assegurar que não perdem anos de trabalho que poderiam contar para as suas reformas. Em votação esta sexta-feira está também um projeto de resolução do Pessoas, Animais, Natureza (PAN).