Algo vai mal nos programas de Matemática. O governo já assumiu esse problema e agora são os próprios professores da disciplina a dizerem o mesmo, pedindo a revisão urgente dos currículos. Pelo caminho, pedem ao Ministério da Educação a revogação imediata das metas curriculares do programa de Matemática do Ensino Básico e que se repense o modelo de acesso ao ensino superior.

As propostas são da Associação de Professores de Matemática que, entre quarta e sexta-feira da passada semana, reuniu cerca de 200 docentes no seu encontro nacional. No documento que saiu do encontro fazem uma análise à atual situação da disciplina nos diferentes níveis de ensino e propõe seis medidas concretas para melhorar o ensino desta disciplina.

O diagnóstico dos professores aponta num sentido: o programa e metas curriculares quer do básico, quer do secundário “têm evidenciado dificuldades de implementação e execução” pela sua extensão, “excesso de formalismo e até pela “pela desadequação de grande parte dos seus conteúdos e abordagens às faixas etárias e aos ciclos de ensino a que se destinam”.

E por considerarem que “essas dificuldades subsistem e não têm sido ultrapassadas pelas medidas até agora tomadas”, os docentes pedem que seja constituída “uma equipa que inicie de imediato a elaboração de novos programas para as disciplinas de Matemática do ensino básico e de Matemática A do ensino secundário”.

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Esta recomendação dos professores de Matemática casa com uma decisão já tomada pelo governo. Para perceber o que vai mal com a disciplina, o secretário de Estado da Educação, João Costa, anunciou no parlamento a criação de um grupo de trabalho que irá, entre outras coisas, olhar para os programas da disciplina.

A equipa já tem coordenador: o professor da Universidade de Coimbra, Jaime Carvalho e Silva.

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“Sabemos que o problema passa pelos programas e que ano após ano o cenário se repete”, argumentou João Costa, no final de março, durante a audição do ministro Tiago Brandão Rodrigues, na Comissão de Educação e Ciência.

O secretário de Estado referia-se ao relatório divulgado em março pela Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC) e que mostra que um terço dos alunos entra no secundário com negativa a Matemática.

João Costa disse na altura que o ministério sabe que um dos problemas são os programas, mas que o rol de fatores não se encerra aí. “Sabemos, por exemplo, que houve uma antecipação de conteúdos e sabemos que estão a ser dados conteúdos aos alunos do 3.º ano que antes eram dados aos alunos do 5.º ano. E os alunos não estão preparados para isto”, referiu o governante.

Esta é exatamente uma das críticas que os professores de Matemática vêm agora fazer: a desadequação de currículos à idade e desenvolvimento dos alunos.

Acesso ao ensino superior penaliza aprendizagens

Entre as seis propostas dos professores, está uma exigência já feita pelos diretores de escolas públicas e privadas: pedem “a alteração das atuais regras de acesso ao ensino superior” por considerarem que a pressão de ter boas notas nos exames nacionais prejudica as aulas e as aprendizagens dos alunos do secundário.

O objetivo, explicam no documento, é “autonomizar o ensino secundário, e especialmente os exames desse ciclo de ensino” da função de separar quem tem ou não acesso ao ensino superior.

“O modelo de acesso ao ensino superior penaliza fortemente o papel da disciplina de Matemática A conferindo-lhe um excessivo papel de seleção ao nível dos alunos com melhores classificações e, consequentemente, de segregação da maioria dos alunos”, argumentam os docentes.

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Argumentando que “as boas práticas letivas que vinham sendo progressivamente implementadas” no ensino da Matemática,  e que “iam ao encontro das opções educativas da OCDE”, foram interrompidas pelas alterações introduzidas a partir de 2012, os professores queixam-se de estar fortemente condicionados no ensino da disciplina.

“Com estes programas e esta avaliação fortemente seletiva, dificilmente os professores e as escolas têm tempo, espaço e condições para orientar a sua prática e as aprendizagens dos alunos “, concluem.

As seis propostas da Associação de Professores de Matemática

  1. A avaliação imediata da implementação dos programas e metas curriculares de Matemática do EB e de Matemática A, bem como a situação da atual aplicação do programa de Matemática B;
  2. A constituição de uma equipa que inicie de imediato a elaboração de novos programas para as disciplinas de Matemática do ensino básico e de Matemática A do ensino secundário;
  3. A revogação imediata das Metas Curriculares do Programa de Matemática do Ensino Básico;
  4. A elaboração de um documento programático baseado na interseção dos programas anterior e atual que, no imediato e para todos os alunos, substitua temporariamente o atual programa de Matemática A;
  5. A alteração das atuais regras de acesso ao ensino superior de forma a autonomizar o ensino secundário, e especialmente os exames desse ciclo de ensino, dessa função.