Depois do jogo de Portugal, os portugueses precisavam de um boost de auto-confiança. Felizmente para eles, o concerto que se seguiu à tragédia futebolística desta tarde de sábado foi o de Jessie J. A inglesa — que não tocava em solo nacional desde 2015 — apareceu enrolada numa bandeira portuguesa, numa pose de fadista. Na bagagem, trouxe o fresquíssimo R.O.S.E., editado em maio, a voz do costume (sim, continua tão incrível como antes) e um jeito especial para consolar os outros — quer seja através das músicas, que lhe saem diretamente do coração, quer seja através das palavras. Deixando que a emoção tomasse várias vezes conta do espetáculo de cerca de uma hora, Jessie J tentou de tudo para se aproximar dos fãs. Quis até olhá-los nos olhos e dizer-lhes que não há nenhum espaço a separá-los.

Depois dos primeiros temas (o primeiro de todos, “Dude”, foi cantado com a bandeira portuguesa aos ombros), Jessie J mostrou-se surpreendida com a multidão que tinha em frente, mas garantiu que ia tentar “manter contacto visual com todos”. Explicou que não vinha a Portugal há quatro anos e que aquele concerto, dado no antigo MEO Arena em Lisboa, tinha sido um dos seus favoritos. “Espero que levem tudo o que quiserem deste palco esta noite”, disse, na ponta da rampa que leva ao meio da multidão. “Adoro, adoro cantar, e espero que vocês sintam isso”, afirmou ainda, declarando o seu amor pelos fãs e contando que a música que ia cantar a seguir tinha sido escrita há mais de dez anos para mostrar “que todos cometemos erros”. “Nobody’s Perfect”, do disco Who You Are é, explicou a cantora, um hino à imperfeição: “Não sou perfeita, nem quero ser”.

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Apesar de não querer ser perfeita, Jessie J andou muito perto disso. Com uma presença impressionante — capaz de encher o gigantesco palco do Rock in Rio — uma voz capaz de atravessar o Parque da Bela Vista e uma simpatia capaz de conquistar até os corações mais duros, a inglesa apresentou um espetáculo sólido, com músicos e cantores de qualidade. O alinhamento oscilou entre temas do novo álbum (“Easy On Me”e “Queen”) e as músicas de sempre, estas últimas com direito a uma nova roupagem. “Domino”, por exemplo, ganhou mais guitarra, numa versão muito diferente da original que deve ter agradado aos mais rockeiros na audiência. “Flashlight”, que tinha sido interpretada ao início da tarde por Hailee Steinfeld, teve direito a uma versão acústica, juntamente com “Thunder” e “Stand Up”.

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Antes de “Who You Are”, música do álbum homónimo de 2011, Jessie J pediu aos fãs para serem “sempre verdadeiros” com eles próprios. “Serem quem são é muito importante. É importante gostarmos de nós próprios. Por favor, por favor: sejam sempre verdadeiros para com vocês próprios”, disse a cantora, num dos muitos momentos sentimentais em que falou dos erros que inevitavelmente todos cometemos, no quão difícil é “ser adulto”, da tristeza, da depressão que muitas vezes se abate sobre cada um e do amor, que vence tudo. “Um de vocês disse-me uma vez: ‘Salvaste-me a vida’. Respondi: ‘Tu salvaste a tua própria vida, eu fui só a banda sonora”, contou Jessie, que chegou mesmo a abraçar-se a um fã e a dizer: “Não faz mal, também sou como tu”.

Ainda que todas estas frases lhe tenham saído do coração, a bênção que começou por ser Jessie J acabou por se transformar numa espécie de maldição. Apelando cada vez mais ao sentimento, ao mesmo tempo que partilhava histórias pessoais (como a do avô, que morreu há três anos, que tinha o mesmo problema cardíaco que ela), a cantora inglesa fez com que o concerto, que tinha tudo para ser perfeito, começasse a soar demasiado a uma sessão de terapia partilhada com uma multidão de desconhecidos. É que Jessie emociona-se com demasiada facilidade — deixa-se levar, perde-se na sua própria conversa e isso interfere com a fluidez do concerto. Se há alguma coisa que se lhe possa apontar, é isso mesmo. Mas com uma voz daquelas e com “Price Tag” a fechar, não há coisa que não se perdoe. E a Jessie J perdoa-se tudo.