No verão de 2011, com 18 anos, Raphael Varane estava em casa da mãe em Hellemmes, perto da cidade francesa de Lille, quando o telemóvel tocou. Jogava no Lens e estava na altura a rever matéria para um exame de filosofia. Do outro lado da chamada, a voz dizia-lhe que era Zinedine Zidane, antigo capitão da seleção francesa e então conselheiro de Florentino Pérez, presidente do Real Madrid. Educadamente, Varane disse-lhe que estava cansado, ocupado, que precisava de estudar: pediu a Zidane que voltasse a ligar mais tarde. Assim que desligou, percebeu o erro que tinha acabado de cometer. Pediu conselhos ao irmão mais velho e retornou a chamada de Zidane. Aceitou transferir-se para o Real no dia anterior ao exame de filosofia.

Agora, com 25 anos, Raphael Varane é um dos capitães da seleção francesa, titular indiscutível no centro da defesa gaulesa e do Real Madrid. Quando o gigante espanhol o descobriu, no Lens, o treinador dos franceses era Laszlo Bölöni, o último treinador campeão no Sporting e o homem responsável pela descoberta de nomes como Cristiano Ronaldo ou Ricardo Quaresma. Os dez milhões que os merengues pagaram por Varane foram, de acordo com o técnico romeno, “uma pechincha”. “Ele é um achado, está a aprender depressa porque ouve, já consegue ler o jogo muito bem e é um defesa talentoso, rápido e inteligente. Exatamente como Cristiano Ronaldo era, numa versão atacante, quando começou comigo no Sporting”, confessou o treinador romeno numa entrevista.

Completou o ensino secundário em Ciências Económicas e sabe discutir Durkheim e Keynes com tanto pormenor como discute a diferença entre um 4-4-2 e um 4-3-3. Ainda assim, já pediu várias vezes para não o chamarem intelectual: “Muitos jogadores completam o ensino secundário no verão e depois assinam pelo Real Madrid. Eu era apenas um bom aluno”, explicou em entrevista a um jornal francês. Filho de um enfermeiro de Martinica que emigrou para França nos anos 70 e de uma professora inglesa, tem um irmão advogado e uma irmã farmacêutica. O gene dos estudos e da dedicação estava-lhe nos genes e Varane aplica-o dentro das quatro linhas.

Varane já venceu quatro Ligas dos Campeões ao serviço do Real Madrid, em 2014, 2016, 2017 e 2018

Dentro da seleção francesa, é conhecido como Mr. Clean, devido à discrição com que joga, à elegância com que se antecipa aos atacantes e à forma como progride com bola. Na imprensa francesa, contudo, ganhou outra alcunha: ministro da defesa. Apesar de ter apenas 25 anos, o central do Real Madrid é já um dos capitães da seleção e tem-se afirmado enquanto líder dos companheiros, a par de Lloris ou Pogba. O outrora jovem e tímido rapaz dos arredores de Lille não tem agora receio de levantar a voz e comandar uma seleção que luta por um Campeonato do Mundo e tem individualidades e egos como Griezmann e Giroud.

Estreou-se na convocatória dos bleus no primeiro jogo que Didier Deschamps orientou, em agosto de 2012, num jogo amigável contra…o Uruguai. Na altura, não chegou a sair do banco e só vestiu a camisola da seleção francesa na primavera seguinte, num amigável contra a Geórgia. Esta sexta-feira, Varane foi titular contra os uruguaios nos quartos de final do Mundial da Rússia e marcou o primeiro golo da vitória francesa. Em 2012, quando convocou o então jogador de 19 anos, Deschamps explicou que “o talento não tem idade”. “Há jogadores que ainda não amadureceram aos 30 anos e outros que o fazem aos 20”, acrescentou o selecionador francês. A verdade é que seis anos depois, com 25, Raphael Varane já conquistou duas ligas espanholas e quatro Ligas de Campeões. Bem mais do que muitos jogadores de 30 anos.

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