Todos perdem com a saída do Reino Unido da União Europeia, mas uns perderão substancialmente mais que outros, com o Reino Unido na linha da frente, diz o Fundo Monetário Internacional (FMI) numa análise ao potencial impacto do Brexit na União Europeia. Na União a 27, o impacto negativo no crescimento no longo prazo poderia variar entre os 0,8% e os 1,5%, no cenário mais pessimista, mas a média esconde um impacto desigual: nos países com maior ligação ao Reino Unido, como a Irlanda, o impacto do Brexit pode chegar aos 4%.
Numa análise incluída na análise regular que faz da zona euro, o FMI tentou fazer as suas próprias estimativas para o impacto potencial do Brexit considerando diferentes cenários, uma vez que as negociações entre o Reino Unido e a União Europeia ainda não estão fechadas.
Os números, com a incerteza que rodeia as previsões ainda mais num caso em que muito vai depender dos detalhes do acordo, concluem o que a maior parte das organizações tem vindo a dizer desde que os britânicos decidiram em referendo abandonar a União: todos perdem.
No entanto, por detrás desta afirmação e dos números estimados para a globalidade da União há realidades muito diferentes que afetam os países e efeitos a ter em conta que ainda não estão completamente integrados nas previsões.
A média do impacto no longo prazo no crescimento económico na União Europeia a 27 aponta para que o crescimento caia entre os 0,2% e os 0,5% do PIB, isto no cenário base (mais favorável) dependendo se o acordo final será um ‘soft Brexit’ (com manutenção do acesso ao mercado único, mas sem a união alfandegária) ou de um ‘hard Brexit (onde o Reino Unido não tem acesso ao mercado único e a relação comercial se faz pelas regras da Organização Mundial de Comércio), respetivamente.
Mas quando o nível de integração de cada um dos países pode variar de forma decisiva, como é o caso da Irlanda, que deve sofrer perdas substanciais em cada um destes cenários: 2,5% caso o acordo seja para um ‘soft Brexit’; 4% em caso de um ‘hard Brexit’, ou seja a ausência de um acordo. Esta estimativa é semelhante ao impacto esperado para o Reino Unido com o Brexit.
Há outros dois países na linha da frente, a Holanda e a Bélgica, que perderiam 0,7% e 0,5% em caso de um ‘soft Brexit’ e 1% no pior cenário, números significativos em comparação com a média. Luxemburgo, Malta e Chipre também podem ser afetados mais que os restantes.
Estas diferenças devem-se ao nível de integração que estas economias têm com o Reino Unido e o FMI ilustra alguns dos pontos mais importantes. Por exemplo, o Reino Unido é um grande fornecedor de serviços financeiros na zona euro e um dos que mais empresta a alguns destes países. No caso do Luxemburgo, os fluxos de financiamento vindos do Reino Unido equivalem a 170% do PIB luxemburguês, 220% caso se contabilizasse as transações também do Luxemburgo para o Reino Unido. Na Irlanda, os empréstimos provenientes do Reino são equivalentes a 58% do seu PIB.
Estes valores são ainda mais altos quando se olha para o portfólio de investimento direto estrangeiro entre a Irlanda e o Reino Unido (nos dois sentidos), que equivalem a 230% do PIB irlandês. No que diz respeito a fluxos de investimento nos dois sentido entre a Holanda e o Reino Unido, este valor atinge os 120% do PIB holandês.
As estimativas feitas demonstram um impacto desproporcional, mas ainda pintam um quadro incompleto, lembra o Fundo. O impacto das mudanças que acontecerão com a saída do Reino Unido na cadeia de distribuição deve afetar a cadeia de distribuição e assim afetar mais países com níveis de integração com o Reino Unido que parecem menores em termos relativos (em percentagem do seu PIB), como é o caso da Alemanha, a maior economia da zona euro e cuja economia depende em boa parte da sua capacidade exportadora. As exportações de produtos como os automóveis, uma das marcas da economia alemã, podem sofrer excecionalmente com as mudanças, mas tudo depende do acordo final sobre a futura relação entre os dois blocos.
O impacto nos dois blocos é maior porque, depois de um período de estagnação na integração do Reino Unido na União Europeia na sequência da adoção do euro (que o Reino Unido optou por não adotar), depois da crise financeira de 2008 a integração aumentou 20%, em boa parte devido a estes países agora mais expostos: Irlanda, Bélgica, Holanda e Malta.
O FMI faz ainda uma análise aos fluxos migratórios entre o Reino Unido e a União Europeia, uma das questões que mais destaque teve durante a campanha para o referendo de junho de 2016, e explica que os fluxos migratórios são pequenos, com exceção de alguns países. Irlanda, Chipre e Malta são os países, entre os Estados-membros, a partir dos quais emigram mais pessoas para o Reino Unido. No sentido inverso, os britânicos emigram sobretudo para a Irlanda, para o Luxemburgo e para Espanha.