Ao abrigo da Lei n.º 2/99, de 13 de Janeiro, publicamos o direito de resposta enviado por Manuel Matos Gil relativo ao artigo publicado no Observador que fazia a pré-publicação do livro “Quem Meteu a Mão na Caixa”:
“No passado dia 23 de Maio, o jornal digital que Vexa. dirige pré-publicou um capítulo do livro ‘Quem Meteu a Mão na Caixa’, da autoria da jornalista Helena Garrido. Nele, o meu nome é amplamente citado, a propósito do relacionamento da Caixa Geral de Depósitos com o Grupo espanhol La Seda. E as referências que me são feitas configuram-se como gravemente atentatórias do meu bom nome e da minha dignidade, tanto pessoal quanto profissional.
Com efeito, honro-me de ter pautado sempre a minha actuação enquanto empresário pela defesa, é certo, dos interesses legítimos que me cabia prosseguir e proteger mas, ao mesmo tempo, pelo escrupuloso respeito de regras legais e de princípios éticos. E foi precisamente isso que sucedeu com o envolvimento do Grupo IMG no grupo La Seda, a que coloquei um ponto final precisamente porque não podia pactuar com os termos em que a sua gestão estava a ser feita e cuja danosidade veio a ser confirmada, em Espanha, por decisões judiciais condenatórias do seu Presidente.
No texto referido suscita-se, em primeiro lugar, a questão do meu envolvimento na apresentação do projecto de Sines ao Governo, dizendo-se que tudo começou num encontro entre mim e o então Ministro da Economia, Dr. Manuel Pinho, realizado no Porto no início de 2006. Terá sido aí, e cito, que ‘Manuel Matos Gil apresenta o projecto Mega PTA da La Seda ao ministro da Economia, Manuel Pinho. Estamos no início de 2006. Portugal tem a possibilidade de atrair para Sines uma fábrica de matéria-prima para embalagens de plástico, que a empresa catalã quer fazer’.
Sucede que não fui eu quem apresentou ao Governo português esse projecto, mas sim o grupo turco Sabanci, através de uma empresa designada ‘Advansa’. Com efeito e como se pode constatar pelo teor da notícia dada à estampa pelo jornal ‘Público’ em 27 de Janeiro de 2006, ocorrera cerca de uma semana antes a assinatura de um memorando entre esta empresa e a Agência Portuguesa para o Investimento, visando a elaboração de um estudo de viabilidade para a possível implementação de uma unidade de fabricação de PTA. E aí se pode ler, também, que o projecto em causa envolvia um investimento de 350 milhões de euros, prevendo-se que a unidade a instalar deveria ter uma capacidade de produção anual de 700000 toneladas de PTA.
Fica patente, portanto, que não passa de uma efabulação a ideia de ter sido eu a apresentar o projecto de Sines ao Governo.
Aborda-se, em segundo lugar, a questão da aquisição, pela La Seda, da Selenis Portugal, da Aussapol Itália e da Selenis Hellas. E, para além das suspeições lançadas quanto aos termos e condições que rodearam a minha participação (ou da IMG) nesse processo, chega-se mesmo a afirmar que ‘se o dinheiro tivesse cor, poderíamos ver o azul da Caixa a sair da João XXI, a entrar em Barcelona e a sair, na sua maior parte, para pagar as compras da La Seda ao seu acionista Matos Gil’.
Uma vez mais, uma simples análise dos factos relevantes destrói, pela base, a argumentação construída, o que se afigura tanto mais estranho quanto as datas referidas no texto estão, no essencial, correctas. Ainda assim, constrói-se uma tese que, insisto, a cronologia só por si desmente. Vejamos, então, qual foi essa cronologia:
- As negociações entre a Selenis, SGPS e a La Seda, para a venda da Selenis Portugal e da Aussapol Itália, decorreram no ano de 2005;
- Em 26 de Dezembro de 2005, a La Seda comunicou à CNMV espanhola que iria adquirir à Selenis, SGPS, 70% do capital social da Selenis Portugal e 70% do capital social da Aussapol Itália, pelo valor de 56 milhões de euros, bem como a existência de um direito de opção sobre os restantes 30%, a exercer até 30 de Setembro de 2006, pelo preço global de 24 milhões de euros;
- A aquisição dos 70% veio a concretizar-se em 15 de Fevereiro de 2006, após terem sido obtidas as autorizações das entidades competentes;
- O direito de opção sobre os restantes 30% foi exercido em Junho de 2006 e a aquisição concretizada durante Agosto de 2006, não pelo montante inicialmente previsto, mas por 19 milhões de euros;
- Em Agosto de 2006, teve lugar a venda da Selenis Hellas, por 10,5 milhões de euros.
Ora, tanto quanto é do meu conhecimento, o envolvimento directo da CGD no processo ocorreu apenas em Junho de 2006, quando a La Seda recebeu um empréstimo de cerca de 400 milhões de euros, concedido por um consórcio liderado pelo Deutsche Bank, em que o banco português participou com 70 milhões de euros. Daí que facilmente se possa compreender que o essencial do processo de venda das empresas detidas pela Selenis, SGPS, (incluindo o pagamento) ocorreu muitos meses antes de qualquer envolvimento da CGD. Como pode afirmar-se, então, que o dinheiro saiu da CGD para pagar aquelas aquisições?
Mas o texto falta também à verdade quando refere que Manuel Matos Gil, com essas vendas, ‘recebeu 72 milhões de euros pela venda dos restantes 30% das fábricas de Portugal e da Itália e pelos 51% da sua sociedade grega’. Desde logo, porque, como referi, os valores em causa não são esses. Em segundo lugar, porque as empresas em causa não eram da IMG, mas da Selenis, SGPS. E a IMG, à época, detinha apenas uma participação social de 38,56 %, pertencendo o restante a um conjunto de entidades veículo controladas por várias private equities internacionais. Nessa medida, o montante que, não eu pessoalmente, mas a IMG recebeu, foi tão só o correspondente àquela percentagem de capital.
Acresce, ainda, ser completamente falso que a aquisição pela La Seda de tais empresas tenha sido feita sem recurso a qualquer avaliação independente. Porque não houve apenas uma avaliação, mas duas: uma do Banco Santader Investments e outra da Horwath. E, para além disso, foi constituída uma comissão técnica interna de apreciação, integrada por administradores executivos e quadros da La Seda.
Importa sublinhar, por fim, que os dois administradores não executivos que representavam a IMG no Conselho de Administração da La Seda, não participaram em nenhuma deliberação relacionada com tais aquisições.
Em terceiro lugar, são lançadas insinuações sobre o meu comportamento e dos administradores não executivos da IMG (Fernando Freire de Sousa e Nuno Gaioso Ribeiro), quando se refere que parte das irregularidades que afectaram a gestão da La Seda ocorreram aquando da presença destes no Conselho de Administração.
Como é público e notório, a Selenis, SGPS (onde, como disse já, a IMG possuía uma participação, mas não era a única accionista), assumiu uma posição accionista na La Seda em Outubro de 2005 (que veio a ser reforçada nos anos de 2006 e 2007). Nessa medida, a IMG era detentora de uma participação na La Seda, o que levou a que, como é usual nestes casos, tivesse podido nomear dois administradores não executivos. Mas, como é sabido, os administradores não executivos não têm qualquer intervenção directa na gestão, pelo que nunca foram responsabilizados – e bem – pelas irregularidades que ali se registaram. Irregularidades que, como já disse, foram um dos motivos que estiveram na base da respectiva demissão em Março de 2008 e da decisão, que pessoalmente assumi, de abandonar o projecto.
Neste contexto, suscita-se igualmente a questão de um pretenso empréstimo de 22 milhões de euros — e cito — ‘à sua Selenis’. Nova falsidade, como o demonstra, aliás, a circunstância de a justiça espanhola nada ter decidido contra mim. Em primeiro lugar, importa relembrar, outra vez, que a Selenis, SGPS não era minha, mas detida por um grupo de accionistas, surgindo a IMG, apenas, com uma posição minoritária. Em segundo lugar, nunca houve qualquer empréstimo à Selenis, SGPS. Aquele valor, correcto em si mesmo, correspondia, antes, a dívidas correntes de empresas detidas pela Selenis, SGPS à Artenius Portugal (hoje, Selenis Portugal). Em 2011, com a recompra desta empresa à La Seda, as dívidas ficaram dentro do Grupo IMG.
Em quarto lugar, é abordada a questão do empréstimo concedido pela CGD à Selenis, SGPS, em Julho de 2007, para aquisição de acções da La Seda. Esclareçamos, pois, ponto por ponto, as inverdades (ou as omissões) do texto:
- O empréstimo não me foi concedido a mim, ou sequer à IMG, mas à Selenis, SGPS, na qual, reitero de novo, a IMG detinha então, apenas, 38,56% do capital social (pouco mais de um terço, portanto);
O empréstimo não foi de 115 milhões de euros – esse foi o montante da linha de crédito autorizada, da qual foi apenas utilizado um total de 97,2 milhões de euros; - Como garantia do empréstimo, foi constituído um penhor sobre 10,9% das acções da La Seda;
O financiamento esteve em incumprimento desde Janeiro de 2008, momento em que a Caixa BI, na qualidade de agente, notificou a Selenis, SGPS, de que tais acções haviam deixado de garantir um rácio de cobertura de 135% e esta não reforçou essas garantias (sendo que, portanto, o incumprimento resultou, em exclusivo, desse não reforço de garantias); - Se a CGD tivesse, nessa data, executado o penhor das acções, teria realizado um encaixe financeiro da ordem dos 95,9 milhões de euros, tendo em conta a cotação das acções à época (o que significaria a recuperação, quase na totalidade, do financiamento concedido);
- Por motivos que só a CGD poderá explicar e a que somos alheios – tanto eu próprio quanto a IMG -, a execução do penhor só veio a ocorrer em data posterior à maturidade do contrato de financiamento (13 de Julho de 2010), o que se traduziu, apenas, num encaixe financeiro de cerca de 8 milhões de euros.
Os factos são, pois, os que descrevi. E creio que falam por si. Rejeito, por isso, com absoluta veemência, a tese que o texto expende e que pretende fazer de mim o ‘mau da fita’ do processo La Seda (ou, pelo menos, um dos principais), em vez de se concentrar, como era devido, na averiguação da verdade.
Um último ponto me parece dever ser sublinhado: muitas das decisões da CGD ao longo de todo este processo foram, ou assumidas sem que a IMG delas tivesse (ou tivesse de ter) qualquer conhecimento, ou adoptadas em momentos em que a IMG já se encontrava desligada de quaisquer responsabilidades na gestão da La Seda – é o caso, por exemplo, da tomada de posição no empréstimo obrigacionista liderado pelo Deutsche Bank ou do financiamento e tomada de capital na Artlant.
Esta é a verdade concreta e real e não aquela que se descreve no texto do livro da jornalista Helena Garrido que o Observador – cujo comportamento e boa-fé não questiono – publicou.
Agradecendo a sua disponibilidade para publicar este texto, peço-lhe que aceite, Senhor Director, os meus melhores cumprimentos.
Manuel Matos Gil”