Este artigo foi originalmente publicado em agosto de 2018 e atualizado em setembro de 2022, a propósito da morte de Isabel II

Direta como o pai e apaixonada por cavalos como a mãe, a princesa Ana não está constantemente nas luzes da ribalta, nem tão pouco dá que falar com polémicas. Muito discreta, sempre presente e querida por muitos, a filha da rainha Isabel II e de Filipe, duque de Edimburgo, é por este dias reverenciada pela sua graciosidade e contenção, exercendo um discreto poder num momento tão delicado como este, marcado pela morte da sua mãe. Não por acaso, coube a esta confidente de longa data da progenitora a difícil missão de acompanhar a urna de sua majestade nesse voo assegurado pela RAF entre a simbólica Balmoral e Edimburgo. Chegada a Londres, com a dignidade que lhe é característica, a princesa real resumiu o espírito vivido por esta altura. “Tive a sorte de partilhar as últimas 24 horas da vida da minha querida mãe. Foi uma honra e um privilégio acompanhá-la nas suas últimas jornadas”, partilhou a Casa Real em comunicado. O estoicismo, a capacidade de entrada em cena sempre que as obrigações reais o exigem, e a dor silenciosa que contraste com imagens eventualmente mais emotivas de outros membros da famílias são outros dos atributos que têm merecido atenção.

Aos 72 anos, tempos houve em que a rebeldia e outros ingredientes atípicos dos tradicionais contos de fadas pautaram a sua vida. Quando nasceu, em 1950, passou imediatamente a ser o centro das atenções da família. Aquela que viria a tornar-se uma jovem esbelta e elegante, de olhos azuis e cabelos loiros — que recusou seguir modas e nunca foi dada a excentricidades –, acabaria por ir parar à capa da Vogue britânica com apenas 21 anos.

De semblante severo, penteado discreto, mas, ainda assim com uma presença forte, a princesa Ana tem um núcleo muito reduzido de pessoas com quem realmente se dá. Apesar de, e segundo o seu biógrafo, Brian Hoey, se ter vindo a “tornar mais fácil falar com ela”, a verdade é que “há muito poucas pessoas que [lhe] são próximas”. Depois de dois casamentos e um divórcio — já para não falar dos divórcios dos irmãos, que também viveu de perto –, a filha da rainha “puxa o manto da realeza [cada vez] mais firmemente” em torno de si. Mas nem por isso deixa de ter um “coração apaixonado”, não só pelos cavalos, à semelhança da sua mãe, mas também por alguns dos homens que a rodeavam. Foi durante a juventude, que a irmã do príncipe Carlos teve vários amores e paixões antes de conhecer Mark Phillips, o pai dos seus filhos, mas também depois disso.

Começou desde cedo, aos 18 anos, a servir a família real em eventos oficiais e nunca mais parou. Está envolvida em mais de 300 organizações de caridade e, no ano passado, passou 179 dias em compromissos reais, tornando-se assim o membro mais ativo da família real. Por vezes, gostaria de colocar de lado todos os deveres e estar mais presente nos programas familiares, mas foi a vida que escolheu: “Foi o que eu decidi fazer. É o meu programa”, disse. Apesar de ser um dos membros mais ativos da realeza britânica, pouco ou nada se diz sobre esta mulher e a única filha da rainha. Quem é a princesa Ana e que acontecimentos marcam a sua vida?

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Fez 3 capas da Vogue (e que capas)

No ano em que celebrou os seus 21 anos, a princesa Ana foi fotografada para a capa da Vogue britânica — foi mesmo a primeira pessoa da realeza a fazê-lo. O retrato da única filha da rainha de Inglaterra parece acabado de pintar: a fotografia mostra uma mulher de olhar penetrante e determinada. Aparece com aquilo que parece ser um vestido de tons quentes, com uma gola cheia de folhos e quase sem maquilhagem.

Se esta foi a primeira capa, certo é que não viria a ser a única. Passados dois anos, a princesa de olhos azuis e cabelos loiros voltou a fazer furor. Com uns brincos compridos dourados, um vestido florido e um chapéu com o mesmo padrão, a princesa Ana esboçou um largo sorriso para a capa da revista de maio de 1973.

Capa da Vogue britânica de maio de 1973

Nesse mesmo ano, a “princesa modelo” voltou a aparecer. A última capa que fez foi recordada há poucos anos na conta de Instagram da revista. “A nossa história a fotografar a família real já vem desde o início da revista. Princesa Ana, capa da Vogue de novembro de 1973, pelas celebrações do seu noivado com Mark Phillips”, lê-se na descrição. Com um casaco de pelo branco, uma tiara e joias simples mas vistosas, a irmã do príncipe Carlos continuava com o mesmo olhar.

Não quis atribuir títulos reais aos filhos

Peter Phillips e Zara Tindall são primos de William e Harry, mas nem por isso são príncipe e princesa à sua semelhança. Os filhos da princesa Ana não receberam títulos reais. Certo é que só podem ser atribuídos através de filhos rapazes (como aconteceu com Carlos), mas a monarca britânica abriu uma exceção e ofereceu a mesma oportunidade à princesa Ana, oportunidade essa que ela acabou por recusar, em conjunto com Mark Phillips. Os pais de Peter e Zara não quiseram que os filhos carregassem o peso de um título da realeza e eles não parecem importar-se com isso — apesar de serem os primeiros netos de uma soberana que não receberam títulos reais.

Os filhos da princesa Ana e de Mark Phillips. Peter Phillips e Zara Tindall, em 2002, nas celebrações do aniversário da rainha.

Sou uma sortuda pelo facto de os meus pais terem decidido não utilizar nenhum título e nós crescemos e fizemos todas as coisas que nos deram a oportunidade de fazer”, disse Zara Tindall em 2015, em entrevista ao Times. Enquanto crianças puderam ir aos mesmos eventos que William e Harry, mas o seu estatuto permitiu-lhes seguir outras carreiras. Também Peter Phillips agradece por não ser conhecido por nenhum título real e pelo facto de os pais os terem encorajado a serem um “espírito livre”.

O gosto pelos cavalos e a relação próxima com a mãe

Se a relação de Carlos com a rainha Isabel II não foi sempre a melhor — o príncipe de Gales afirma que os pais não eram próximos e que sempre foram as amas que cuidaram dele, ao invés de terem sido os pais –, o mesmo não se pode dizer da irmã. Desde a juventude, a princesa Ana sempre foi próxima da rainha, principalmente porque ambas partilhavam a paixão pelos cavalos. “Com o seu amor pelos cavalos, a Ana desenvolveu uma relação especialmente próxima com a sua mãe durante os anos de adolescência, dando-lhe conselhos sobre moda e roupas”, lê-se na Town and Country.

Competitiva e focada, fez equitação durante anos e chegou mesmo a ganhar medalhas em Campeonatos Europeus. No mesmo ano em que apareceu pela primeira vez na capa da Vogue, a princesa Ana ganhou uma medalha de ouro no campeonato realizado em Burghley e foi eleita personalidade do ano pela BBC Sports. Quatro anos depois, recebeu a medalha de prata para a mesma modalidade — disciplinas individual e conjunta de equitação –, lê-se no site da família real. No ano seguinte, em 1976, competiu nos Jogos Olímpicos com o cavalo da rainha Isabel II e, desde 1988, que é presidente da Associação Olímpica britânica e membro do Comité Olímpico Internacional.

O gosto parece ter passado de geração em geração e também a única filha da princesa Ana tem um enorme fascínio por equitação. Aliás, é uma atleta de elite e sagrou-se campeã europeia e mundial do concurso completo de equitação. Peter Phillips afirma que a mãe é “muito mais competitiva do que aquilo que ela admite” e que Zara herdou esse gene da competitividade. Mãe e filha partilham as mesmas características: “Obstinada, focada… Zara não teria chegado onde chegou sem um pouco da solidão e independência da sua mãe”, afirmou Peter Philips.

A coragem perante um quase rapto

O incidente aconteceu em 1974 — tinha a princesa 24 anos –, quando voltava com aquele que seria depois o pai dos seus filhos, Mark Phillips, ao Palácio de Buckingham. O carro em que ambos seguiam foi forçado a parar quando o motorista se deparou com um outro carro a bloquear a estrada à sua frente. Do veículo saiu Ian Ball, um doente mental de 26 anos, que começou a disparar uma arma. Várias pessoas foram atingidas, incluindo o guarda pessoal da princesa.

Enquanto se aproximava do carro em que seguia a jovem da realeza britânica, Ball dizia em voz alta o seu plano: raptá-la e pedir um resgate de dois milhões de libras. Com uma atitude direta e sem rodeios, a jovem Ana recusou-se a sair do carro para que o plano não fosse concretizado. “Foi tudo tão enfurecedor; eu continuei a dizer que não queria sair do carro, e eu não ia sair do carro”, disse a princesa, de acordo com a BBC. “Eu quase perdi as estribeiras com ele, mas eu sabia que, se perdesse, ia bater-lhe e ele ia disparar contra mim”, terá dito.

Ron Russell, um antigo praticante de boxe que estava a passar por perto, terá então dado uma pancada na parte de trás da cabeça do raptor e levou a princesa para longe da cena. Entretanto, a polícia, que já tinha sido informada do que estava a acontecer, acabou por prender o homem. O então primeiro-ministro, Harold Wilson, louvou a princesa Ana dizendo que ela teve “uma coragem e calma extraordinárias” tendo em conta toda a situação.

A “princesa fogosa” que se divorciou

Deu o nó com o ex-cavaleiro britânico Mark Phillips, na abadia de Westminster, em 1973, com quem teve dois filhos: primeiro Peter Phillips e depois Zara. Oito ano após terem tido o segundo o filho, o casal anunciou a intenção de se separar — na verdade, a relação entre ambos já estava arruinada há muito com traições de parte a parte — e acabaram mesmo por se divorciar em 1992. Nesse mesmo ano, a princesa voltou a casar, desta vez com o oficial da marinha britânica Timothy Laurence.

Um divórcio e dois casamentos, mas a lista de amores da única irmã do príncipe de Gales é bem mais vasta. O primeiro namorado oficialmente reconhecido foi Gerald Ward, oficial de cavalaria, depois apaixonou-se por Richard Meade, campeão olímpico, cujo filho, James, se tornou um dos melhores amigos do príncipe William. Falta mencionar a associação a um dos apelidos cujo trajeto se cruzaria por mais que uma vez com o clã real: aos 19 anos, Ana apaixonou-se por Andrew Parker Bowles.

A princesa Ana e Mark Phillips, no dia do casamento.

Apesar de na altura namorar com Camilla — a atual mulher de Carlos, o irmão mais velho de Ana, –, Andrew e a princesa viveram um romance tórrido, mas proibido. O caso entre os dois viria a terminar em 1973, quando Andrew e Camilla se casaram. Magoada com a traição, a princesa casaria ainda nesse mesmo ano. “Ela estava feita em pedaços por causa do casamento de Andrew com Camilla“, comentou uma amiga na altura.

O casamento durou 19 anos, mas do amor entre os dois já nada restava. Quando Zara nasceu começaram, aliás, a surgir especulações de que não seria filha de Mark Phillips. Nos compromissos públicos, a princesa Ana estava constantemente protegida pelo seu guarda-costas pessoal, o sargento Peter Cross, e não restam dúvidas de que entre os dois houve mais do que uma relação meramente profissional. A filha da rainha foi vista a beijar o sargento, que de forma muito subtil deixou depois de exercer as suas funções, quando estes rumores vieram a público.

Descontente por ter sido afastado das suas funções, Cross correu para os jornais a dizer que a princesa o convidava para passar o dia com ela e que, quando a sua filha nasceu, foi ele quem recebeu o primeiro telefonema: “Já tive o meu bebé, é uma menina. Estamos as duas bem“, terá dito a princesa Ana. O Palácio de Buckingham, profundamente descontente com as revelações, afirmou que Cross era “um homem vaidoso que se entregava a vários casos extraconjugais” — contudo, não desmentiu as afirmações do sargento.

O casamento com Laurence não foi sempre um mar de rosas, mas, hoje em dia, parece estar mais forte que nunca. Sobre a atitude da princesa Ana quanto ao amor, o seu biógrafo, Brian Hoey, escreveu: “Ela seguiu os seus instintos com uma abertura agressiva”.