O Parlamento aprovou na tarde de segunda-feira o regresso do Governo à mesa das negociações sobre a contagem do tempo congelado das carreiras especiais da função pública (onde estão incluídos os professores). Na votação da especialidade do Orçamento do Estado para 2019 foram aprovadas as propostas do PSD e do CDS, apenas com o voto contra do PS. A proposta do PCP também foi aprovada, mas o CDS absteve-se e o PS manteve o voto contra. Esta não foi a única vez que, neste primeiro dia do debate na especialidade, os partidos se uniram todos contra a vontade do PS (e do Governo). Votações ainda decorrem no Parlamento e PCP e BE já pediram para rever votações por três vezes para reverter coligações negativas para Governo e PS.
A proposta do PSD sobre as carreiras especiais repetia a norma do Orçamento do ano passado — quando se absteve na votação na especialidade há um ano –, ou seja, ao ser aprovada, volta a remeter para o processo negocial a questão da contagem do tempo para as carreiras especiais na função pública, a mesma negociação que o Governo já tinha dado por concluída.
Depois de um braço de ferro, com origem no desentendimento entre o que os sindicatos reivindicam (a contagem dos nove anos, nove meses e dois dias) e o que o Governo pretendia, a negociação foi encerrada. O Governo aprovou por decreto que apenas contará, para efeitos de progressão, dois anos, nove meses e 18 dias do tempo congelado. Esse decreto ainda não foi, no entanto, promulgado pelo Presidente da República. E Marcelo Rebelo de Sousa só o analisará depois do OE — o Governo também ainda não o enviou para Belém, ainda aguarda pareceres das regiões autónomas.
A proposta do CDS era igual à do PSD, mas introduzia um limite para que essa negociação tivesse uma conclusão: 30 de junho do próximo ano. Já o PCP e o Bloco de Esquerda pretendiam que fosse contabilizado todo o tempo congelado, mesmo que de forma faseada: os comunistas davam sete anos para a reposição integral, o BE dava apenas cinco, até 2023. A norma da proposta do PCP que foi aprovada ia no mesmo sentido do regresso ao processo negocial. Tudo o resto, que dizia respeito à contagem efetiva do tempo e prazos para a sua reposição, foi chumbado. O que está em causa não é, assim, que seja contado o tempo que os partidos da esquerda e sindicatos reivindicam, mas sim que esse processo seja novamente negociado.
Resumindo a complexa votação: a proposta do PSD foi votada tal como estava, já que apenas continha a norma do regresso ao processo negocial. Já a do CDS foi desagregada, a pedido do PCP e do PSD, para que os partidos pudessem aprovar apenas o número que dizia respeito à negociação, rejeitando a segunda parte da proposta que colocava um prazo para a mesma. O mesmo aconteceu com a proposta comunista, que o PSD pediu para votar por partes para conseguir aprovar apenas o número que dizia respeito ao regresso às negociações. A parte relativa ao faseamento foi chumbada. No fim das contas, o Parlamento força o Governo a voltar a negociar a contagem do tempo para as carreiras especiais da função pública.
Coligações negativas: o travão à descentralização e outras pedras no OE
As carreiras especiais da função pública deram origem à primeira “coligação negativa” (junção de todos os partidos contra o Governo) na votação do Orçamento na especialidade, mas não foi a única. Até agora, o PS já ficou isolado em mais cinco propostas de alteração da oposição. E ainda um dos artigos da proposta de OE do Governo, colocando um travão ao processo de descentralização.
Os partidos (exceto o PS) uniram-se para chumbar a proposta do Governo sobre o Fundo de Financiamento para a Descentralização, travando o processo. Com este chumbo não é possível ter um mecanismo para transferir o dinheiro correspondente às competências novas que passaram a ter, fruto do processo de descentralização. E voltaram a juntar-se para aprovar a proposta do PSD para eliminar um outro artigo que decorria deste relativo ao Fundo.
Os partidos da oposição uniram-se para aprovar a norma proposta pelo BE para, no plano de revitalização da Terceira, ter em conta uma resolução do Parlamento que imputa aos EUA a responsabilidade económica pela degradação ambiental da ilha.Também se uniram para para o financiamento não inferior a 500 mil euros do Arquivo Nacional de Imagens em Movimento, para lançar o concurso para lançar um procedimento concursal extraordinário para ingresso no Internato Médico, proposto pelo BE, e para aprovar que, até ´ junho do próximo ano, o Governo abra concursos para admitir oficiais de justiça, do mesmo partido.
Os partidos tinham também juntado votos para aprovar uma proposta do PSD e outra do CDS. A primeira abria concursos na Polícia Judiciária para admissão de pessoal para a investigação criminal e a segunda revia até 31 de março a lei orgânica da PJ e também o estatuto de pessoal da mesma polícia, o estatuto dos oficiais de justiça e o regime jurídico de exercício de funções e estatuto de pessoal do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF). Mas PCP e Bloco de Esquerda acabaram por rever a posição nas duas, chumbado as propostas horas depois da primeira votação.
Tinha também sido rejeitada a proposta de alteração do PS que pretendia excecionar de parecer prévio obrigatório e vinculativo a contratação de serviços jurídicos externos que tenham por objeto o patrocínio judiciário e a contratação externa de serviços jurídicos por parte do Setor Empresarial do Estado e dos serviços periféricos do MNE. Mas o Bloco reviu o seu voto contra e acabou por mudar o voto aprovando-a, também horas depois.
Houve ainda outras propostas relativas a contratações em algumas áreas do Estado que foram aprovadas pelos partidos (sem ser em coligação negativa) na tarde desta segunda-feira: abertura de vagas para escrivães, proposta pelo PCP; a contratação de mais 25 Vigilantes da Natureza, pedidos pelo PCP e Verdes; a abertura de concursos para a contratação de trabalhadores do SEF, proposta pelo BE que também viu aprovadas as propostas para abertura de concursos para ingresso de inspetores da PJ e de oficiais de justiça.
Novo regime de pensões também para a CGA
Foi ainda aprovado pela esquerda parlamentar o alargamento do novo regime das reformas antecipadas à Caixa Geral de Aposentações, que tinha sido proposto pelo PCP e pelo PS.
Recorde-se que o novo regime, criado também no Orçamento do próximo ano, vem eliminar o corte do fator de sustentabilidade (14,5%) quando os trabalhadores tiverem pelo menos 60 anos de idade e 40 de descontos. A aprovação das propostas do PCP e do PS fazem com que os beneficiários do novo regime não sejam apenas os trabalhadores que descontam para a Segurança Social, mas todos os funcionários públicos.
E os bailarinos da Companhia Nacional de Bailado passam a ser reconhecidos como tendo direito à pensão por velhice, em termos condizentes com o desgaste rápido a que estão sujeitos. Bloco, PAN, PSD e CDS tinham propostas, mas a que passou foi apenas a dos bloquistas.
Entidade das Contas dos Partidos com verba reforçada em 1,17 milhões de euros
Com quatro propostas de alteração apresentadas para aumentar a transferência para o Tribunal de Contas, diretamente para a Entidade das Contas e Financiamentos Políticos, era já certo que a verba sairia mesmo reforçada e assim foi. Os partidos aprovaram a proposta de alteração do Bloco de Esquerda que pedia mais 1,17 milhões de euros para a entidade que fiscaliza as contas dos partidos. Só o PSD se absteve, todos os outros votaram a favor.
Havia propostas do PSD, que queria aumentar a transferência para o Tribunal de Contas, destinando-se exclusivamente à Entidade das Contas e Financiamentos Políticos, em 1 milhão de euros. O PAN pedia 1,5 milhões, o CDS 1,25 milhões e o Bloco de Esquerda 1,17 milhões de euros. Acabou por ser a do BE a vingar, esta tarde na votação na especialidade do OE no Parlamento.
A proposta do Bloco justificava o valor com o que foi “identificado pelo Tribunal Constitucional como necessário para a Entidade das Contas cumprir as obrigações decorrentes das alterações” à orgânica deste órgão que funciona na alçada do Tribunal Constitucional.
Em abril, o Parlamento aprovou alterações que passaram por atribuir à Entidade das Contas também a função de aplicar coimas, além da fiscalização das contas e financiamentos políticos. O reforço avançado pelo Governo, cerca de 350 mil euros, foi considerado insuficiente para responder a este aumento de competências.
Artigo alterado às 21h00 depois de PCP e BE terem alterado o sentido de voto em três propostas de alteração, uma do PSD e outra do CDS, depois de as terem aprovado inicialmente