Um ex-primeiro-ministro da Malásia e um empresário malaio chamado Jho Low (frequentador de festas com algumas das maiores estrelas de Hollywood, como Leonardo DiCaprio) terão contado com a ajuda do gigante bancário Goldman Sachs para depauperar um fundo soberano do país — o 1MDB — em vários milhares de milhões de dólares. Esta é a tese da acusação lançada esta semana pelas autoridades da Malásia contra o Goldman Sachs e dois ex-funcionários, que terão ajudado o 1MDB a ir ao mercado de capitais quando o banco já teria razões para desconfiar da utilização que seria feita do dinheiro — alegações que o banco rejeita “categoricamente” e que promete rebater.

As acusações são de corrupção e branqueamento de capitais, os mesmos crimes que também o Departamento de Justiça dos EUA apontou aos dois ex-funcionários do Goldman Sachs. Tim Leissner, um desses ex-funcionários, já se considerou “culpado” no caso apresentado contra si nos tribunais norte-americanos — terá colaborado com o outro banqueiro acusado, Roger Ng, no suborno a responsáveis malaios com o objetivo de ter o fundo soberano como cliente.

Por ter gerido as emissões de dívida feitas entre 2012 e 2013, o Goldman terá embolsado comissões na ordem dos 600 milhões de dólares — e arrisca, agora, uma multa que pode ascender aos dois mil milhões de dólares, segundo o The Wall Street Journal. Mas o banco explica o envolvimento no caso com decisões isoladas de alguns funcionários e alega que não tinha forma de saber como o dinheiro seria usado porque pessoas do governo que lhe garantiram que os fundos seriam utilizados de forma adequada, em investimentos em energia e infraestruturas.

O dinheiro acabaria por ser desviado, designadamente através da compra de empresas por valores injustificavelmente elevados, e serviu para comprar propriedades de luxo, obras de arte e até ajudaram a financiar a produção do filme “The Wolf of Wall Street”, com Leonardo DiCaprio.

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O 1Malaysia Development Berhad, mais conhecido por 1MDB, foi criado pelo ex-primeiro-ministro Najib Razak, que perdeu as eleições, foi preso e está a ser investigado por suspeitas de ter embolsado o equivalente a mais de 615 milhões de euros, dinheiro que saiu do fundo para contas bancárias detidas por si e por familiares. O ex-primeiro-ministro já tinha sido acusado de corrupção, abuso de poder e abuso de confiança, ao mesmo tempo que a mulher foi acusada do crime de branqueamento de capitais — crimes que ambos negam.

Najib Razak criou o fundo estatal 1MDB logo quando assumiu o poder em 2009, com o objetivo declarado de promover o desenvolvimento económico do país, mas o fundo acumulou vários milhões em dívidas. O escândalo terá sido decisivo para o seu afastamento do poder, cedendo o lugar a um homem de 93 anos de idade, Mahathir Mohamad, que já tinha sido, no passado, chefe do governo.

Ex-primeiro-ministro preso por corrupção na Malásia

O pivô de todo este processo terá sido, porém, Jho Low, o “playboy” que nunca foi quadro do 1MDB mas que colaborou com o fundo soberano na qualidade de “consultor”. A sua porta de entrada no fundo 1MDB terá sido uma amizade com o genro do ex-primeiro-ministro. Através da criação de empresas fictícias, o empresário terá não só colaborado no suborno de outros como, também, terá gasto mais de mil milhões de dólares na compra de bens de luxo, em casinos, no aluguer de iates e de jatos privados — esta é a descrição feita pelo Departamento de Justiça dos EUA. A contratação de um decorador de interiores vindo de Londres também terá sido paga com dinheiro desviado do 1MDB.

Jho Low nunca foi quadro do 1MDB mas terá sido a peça-chave no escândalo 1MDB.

As autoridades já recuperaram algumas das jóias compradas pelo empresário, de 37 anos, mas, nesta fase, o seu paradeiro é desconhecido — uma possibilidade forte é que esteja fugido algures na China. Foi, no entanto, colocada uma mensagem no seu website pessoal em que Jho Low garante estar inocente e diz que isso será demonstrado “quando todas as provas relevantes forem apresentadas a um tribunal justo e legítimo”.

Inicialmente os mecanismos de segurança do Goldman Sachs terão rejeitado que Jho Low pudesse abrir uma conta no banco mas terão sido movidas influências para que o empresário pudesse fazê-lo, existindo apenas uma recomendação para que não se deixasse movimentar demasiado dinheiro nas suas contas, uma revelação que está a agravar o impacto reputacional sobre o banco norte-americano.

A CNN conta que o empresário desaparecido, cujas relações com as vedetas de Hollywood lhe granjeou um estatuto de socialite na Malásia, gerou um sucesso de vendas de enfeites de Natal e outros produtos, com trocadilhos bem-humorados sobre a sua participação no escândalo, como sacos de compras natalícios com a frase “Spending it like I stole it“, o que significa “Gastá-lo como se o tivesse roubado”.