O Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) tinha no final de 2014 uma dívida de 160 mil euros para com o presidente do conselho diretivo. Esta dívida, revela uma auditoria do Tribunal de Contas, resultou de “transferências efetuadas pelo próprio para viabilizar o pagamento atempado de compromissos, em particular de remunerações”. Só não diz o nome do presidente, mas Carlos Pina está em funções como presidente do laboratório desde 2010.

Numa auditoria com parecer desfavorável à conta de 2014 do organismo, o Tribunal de Contas aponta para irregularidades no reporte financeiro que podem configurar infrações financeiras, mas reconhece que o LNEC sofreu uma queda significativa de receitas nestes anos. E recomenda aos ministérios das Finanças e do Planeamento que tomem medidas para que o orçamento do instituto seja dotado das verbas necessárias à sua missão. Já o presidente do LNEC, Carlos Pina, refere que foi pedida a utilização de saldos orçamentais para minimizar eventuais irregularidades, com as respostas do Ministério das Finanças a serem tardias ou inexistentes.

Carlos de Brito Pina é presidente do LNEC desde 2010

Num contexto de restrições financeiras e queda de receitas, o presidente do LNEC concedeu um empréstimo ao organismo “para fazer face a dificuldades de tesouraria que impediam o pagamento atempado de compromissos do LNEC, em particular, salários a funcionários. A auditoria revela que foram feitas várias transferências pelo presidente do conselho diretivo para a conta do LNEC ao longo de 2014. No final desse ano, o valor em dívida era de quase 160 mil euros, diz o Tribunal de Contas.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Na resposta dada em contraditório, o conselho diretivo do laboratório não refere a questão do empréstimo, mas aponta para as fortes restrições financeiras que resultaram da crise económica e financeira e para “as sérias dificuldades operacionais” sentidas pelo organismo. Aponta o dedo ao insuficiente grau de flexibilidade, com orçamentos sujeitos a cativações e à obrigação de devolver saldos ao Estado, bem como à necessidade de ter autorização das Finanças para despesas.

“O LNEC tentou pelas vias possíveis, embora sem êxito, aumentar a receita inscrita em orçamento disponível para minimizar as irregularidades no seu funcionamento, garantindo a assunção de compromissos com os seus clientes a angariação de receitas com a prestação de serviços. Por exemplo, o pedido de utilização do saldo de gerência de 2002 foi objetivo de despacho favorável do secretário de Estado do Orçamento apenas a 20 de dezembro de 2013, remetendo a resolução orçamental do pedido do LNEC para a sua tutela. Ora atendendo à proximidade do fim do ano, esta decisão não teve qualquer efeito prático nas gerência dos anos de 2013 e 2014.”

O próprio presidente do LNEC, Caros Pina, faz um contraditório onde afirma que “por diversas vezes foi solicitada a aplicação dos saldos orçamentais em despesa para minimizar as irregularidades no seu funcionamento, cumprir os seus compromissos com fornecedores e clientes e evitar perda de receitas com a prestação de serviços. No entanto, estes pedidos não tiveram sucesso, porque as respostas foram tardias ou simplesmente inexistentes”. 

O LNEC faz parte da administração indireta do Estado. As suas funções incluem: coordenar e promover a investigação científica, mas também o desenvolvimento das técnicas e procedimentos que assegurem as boas práticas na área da engenharia civil, através da emissão de pareceres e de outras intervenções. O laboratório tem sido chamado e monitorizar a segurança e solidez de muitas infraestruturas, como o caso da Ponte de 25 de Abril, que acompanha permanentemente. Apesar de ter autonomia administrativa e financeira e património próprio, está sujeito à lei-quadro dos institutos públicos.

Pagamentos sem dotação orçamental e com datas alteradas

Segundo o Tribunal de Contas, o LNEC enfrentou em 2012 “limitações orçamentais severas”, com o financiamento a cair cerca de 5,6 milhões de euros. O laboratório recebe dotações orçamentais, mas também tem receitas próprias da prestação de serviços que caíram muito por causa da crise no setor da construção civil. Já as despesas com o pessoal são fixas e representam 80% dos custos do laboratório, pelo que é difícil reajustar esta rubrica para a adequar à queda de receitas sentida nesses anos. A auditoria indica também o aumento das dívidas incobráveis.

Nos anos seguintes, a subida de receitas foi inferior ao aumento dos custos com o pessoal. O decréscimo no financiamento penalizou também o atraso no pagamento aos fornecedores, que o LNEC procurou resolver com o recurso a disponibilidades que estavam classificadas como extraorçamentais.

Segundo o Tribunal de Contas no período em análise, 2013 e 2014, o Laboratório efetuou pagamentos que não tinham a correspondente dotação orçamental e para não dar visibilidade a essa situação, a auditoria diz que foram alteradas as datas de alguns pagamentos na aplicação informática de suporte à contabilidade orçamental, tendo sido registados pagamentos em 2014 que correspondiam a 2013 e outros em 2015 que foram feitas em 2014.

O Tribunal de Contas considera que esta prática afetou a veracidade da contabilidade orçamental e patrimonial do LNEC e considera por isso que “nenhuma das peças finais contabilísticas, mapas de execução orçamental (…) e balanços as gerências de 2013, 2014 e 2015 são verdadeiros”. De acordo com a auditoria, o LNEC fez pagamentos utilizando fundos que não podia dispor, situação que associada a alterações das datas de pagamento e reportes de execução orçamental “violaram as disposições da lei de enquadramento orçamental, constituindo estas situações infrações financeiras suscetíveis de originar eventual responsabilidade financeira sancionatória”.

A isto, e em contraditório o presidente do LNEC diz que a alteração das datas de pagamento permitiu afetar as disponibilidades existentes no pagamento da despesa registada orçamentalmente. E que só foi efetuada com o objetivo de impedir a redução irreversível da capacidade de execução de despesa necessária à atividade do LNEC, induzindo inevitavelmente maiores necessidades de receita provenientes do OE e, assim prejudicando significativamente o erário público”.

Outras das falhas apontadas pelo Tribunal de Contas relativas ao ano de 2014, foi a situação de o LNEC ter financiado, “igualmente sem suporte legal”,  “cuidados de saúde prestados fora do campus, substituindo-se à ADSE no pagamento de comparticipações desses cuidados de saúde relativos a familiares de funcionários, bolseiros e familiares de bolseiros, não beneficiários da ADSE, no montante de cerca 33 mil euros”.