O Presidente de Timor-Leste defendeu esta segunda-feira medidas concretas para lidar com a crescente violência associada a grupos de artes marciais no país, que têm aumentado nas últimas semanas, incluindo rever a legislação. “Tem que se tomar medidas. No passado houve um decreto do Governo que determinou o fecho dos grupos de artes marciais, mas eu acho que essa medida deve ser revista”, disse esta segunda-feira à Lusa Francisco Guterres Lu-Olo.
O chefe de Estado disse que falou esta segunda-feira sobre essa questão com o ministro da Defesa e ministro interino do Interior, Filomeno Paixão, e que se deve reformular o quadro legislativo. “Deve fazer-se uma nova lei, no sentido de dar abertura a esses grupos de artes marciais, para que sejam devidamente controlados”, afirmou.
A preocupação sobre os recentes casos de violência em vários pontos de Timor-Leste envolvendo grupos de jovens ligados a grupos de artes marciais (oficialmente ilegais) levou à convocatória de uma sessão plenária do parlamento que decorre esta segunda-feira à porta fechada.
O encontro conta apenas com a presença dos deputados, de dois funcionários administrativos e de representantes dos setores competentes, nomeadamente Ministério do Interior, Secretaria de Estado da Juventude e Desporto, Polícia Nacional de Timor-Leste (PNTL) e Forças de Defesa de Timor-Leste (F-FDTL), entre outros.
A decisão de manter o encontro à porta fechada foi tomada na semana passada na conferência de líderes de bancada, tendo em conta o impacto que os sucessivos incidentes de violência estão a ter na segurança do país. O objetivo, explicou Arão Noé Amaral, presidente do Parlamento Nacional, é fortalecer a colaboração institucional no intuito de “prevenir atividade criminal” e travar a “instabilidade” que os incidentes estão a provocar.
Na semana passada, o comandante da PNTL, Júlio Hornay, disse que as autoridades não vão tolerar que grupos de artes marciais continuem a causar o pânico entre várias comunidades no país, defendendo uma operação alargada para lidar com o problema.
“A situação suscita preocupação e há que tomar medidas para lidar com estes atos criminosos que têm vindo a acontecer, envolvendo jovens de grupos de artes marciais”, explicou o comandante. “Os grupos de artes marciais estão a abusar demais”, afirmou, explicando que os grupos atuam ao nível comunitário, com ações de represálias mútuas, contribuindo para que a população em algumas zonas “viva em pânico”, defendendo que a situação não pode continuar.
A operação alargada é necessária, explicou, na sequência de vários incidentes de confrontos graves entre grupos de artes marciais que ocorreram nas últimas semanas causando pelo menos um morto, vários feridos e vários detidos. Têm aumentado igualmente o número de casos do uso de “rama ambon”, uma espécie de fisgas com que se lançam pequenas flechas, lâminas ou setas e que são usadas esporadicamente em alguns bairros de Díli, causando várias vítimas. Segundo especialistas do setor de segurança, muitos dos casos são de jovens “iniciados” em grupos rivais de artes marciais que usam ‘rama ambon’ para lançar flechas contra transeuntes.
O vice-diretor da Fundação Mahein João Almeida — que acompanha em detalhe o setor da defesa e segurança — disse recentemente à Lusa que a monitorização feita pela sua instituição mostra que a maioria dos incidentes violentos do país apontam para o “envolvimento de grupos de artes marciais”.
Entre os problemas apontados por responsáveis do setor da segurança em Timor-Leste está o efeito de uma resolução, de julho de 2013, que determina a “extinção” dos principais grupos de artes marciais do país, nomeadamente a PSHT, KORK e KERAH SAKTI, aplicando ainda a “proibição total da continuação de qualquer atividade de artes marciais dos respetivos membros”.
Esta resolução foi aprovada depois de incidentes em Díli e noutros locais de Timor-Leste envolvendo “grupos de artes marciais, que têm vindo a provocar distúrbios sérios, destruição de bens, mortos e feridos”. O objetivo era travar a ação dos grupos, mas os efeitos acabaram por ser contraproducentes, levando muitos participantes a atuar numa maior clandestinidade, reduzindo o controlo das autoridades.
Em dezembro, Filomeno Paixão disse à Lusa que este era um assunto “complexo e com muitas vertentes: política, económica, cultural e de outra ordem” em que “não é fácil atuar”, já que “as artes marciais estão bem infiltradas em muitas instituições, inclusive da segurança”. O controlo total da situação é difícil, admitiu, até porque há “elementos das artes marciais” em instituições como a PNTL.