Durante a comissão parlamentar ao furto de material em Tancos, o general Carlos Jerónimo, antigo chefe do Estado-Maior do Exército, defendeu o coronel David Teixeira Correia, depois de este ter sido alvo de uma paródia no programa de Ricardo Araújo Pereira. A rábula do humorista tinha como tema central o facto de o coronel David Correia por ter dito que, mesmo sabendo que o sistema de videovigilância já não estava a funcionar, os militares mantinham a norma de tirar e pôr a cassete de um gravador que já não funcionava.

Carlos Jerónimo defendeu o coronel citando o “Diácono Remédios, uma personagem criada pelo humorista Herman José: “Não havia ‘nexexidade'”. 

No seu programa “Gente que não sabe estar”, Ricardo Araújo Pereira utilizou várias vezes as declarações do coronel David Teixeira Correia durante outra audição para mostrar como é que os planos de segurança não estariam bem definidos e que para assaltar os Paióis Nacionais de Tancos “basta um tipo que tenha uma tarde livre e um carrinho de mão”.

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Na resposta, Carlos Jerónimo começou por criticar “o silêncio ensurdecedor de algumas entidades” face a este episódio. Depois, utilizou outro episódio humorístico para comentar a paródia de Ricardo Araújo Pereira: “Sou totalmente a favor da liberdade de expressão. Contudo, penso que neste caso, como diria outro humorista da nossa praça na figura do Diácono Remédios, ‘não havia nexexidade'”, disse o general durante a comissão parlamentar.

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O sistema de videovigilância aos paióis começou a funcionar com falhas em 2006, segundo afirmou João Luís de Sousa Pires, comandante da Unidade de Apoio Geral de Material do Exército (UAGME), e foi considerado inoperacional em 2012 e, um ano depois, em 2013, obsoleto. Em 2016, foram alteradas as normas de procedimentos, mas o tenente coronel Sousa Pires explicou que não foram alteradas “porque se aguardava a reparação do sistema” de videovigilância e, quando tal acontecesse, era também substituído o anexo em que era referida necessidade de tirar e pôr a cassete vídeo.

Furto das armas? Houve “conivência lá de dentro”

No decorrer da comissão Carlos Jerónimo admitiu também que o furto de material de guerra pode ter ocorrido com “conivência” do interior. “Não sei como foi o roubo. Para mim, tal como na arrecadação dos comandos, tem de haver conivência lá de dentro. Não estou a afirmar”, disse o general na reserva, que comandou o Exército entre 2014 e 2016.

Ouvido durante mais de três horas, o general acrescentou: “Como é que desapareceram as `Glock´ da polícia? Com conivência lá de dentro. Quando o pilha-galinhas está dentro da capoeira… ‘pfff’”.

Numa intervenção inicial, o general disse que assumiu sempre as suas responsabilidades, ideia que desenvolveu mais à frente na audição ao demarcar-se da decisão do seu sucessor Rovisco Duarte de exonerar cinco comandantes das unidades em redor de Tancos para permitir averiguações.

“Não quero crucificar o meu sucessor, mas nunca vi em 43 anos de serviço afastar alguém para fazer investigações”, afirmou.

Já na intervenção inicial tinha afirmado que andou sempre “no fio da navalha” e que não é “como certos figurões que aparecem na televisão e dizem que estão de consciência tranquila quando todos sabem que mentem”, sem, contudo, apontar nomes.

Durante a audição, o general disse que não queria “arengar sobre Tancos”, mas aproveitar para chamar a atenção para “problemas gravíssimos do Exército”, sendo o principal a falta de efetivos. Questionado pelo CDS-PP, o general defendeu que é necessário manter os paióis nacionais de Tancos, observando que “apenas dez por cento das munições” armazenadas em Tancos foram transferidas para Santa Margarida.

A comissão de inquérito para apurar as responsabilidades políticas no furto de material militar em Tancos tem previstas audições a mais de 60 personalidades e entidades, vai decorrer até maio de 2019 e é prorrogável por mais 90 dias.