As últimas palavras dos pilotos que iam ao comando do Boeing 737 da Lion Air, que caiu ao mar de Java em outubro, na Indonésia, matando 189 ocupantes, foram captadas pela caixa-negra do avião e agora divulgadas pelos investigadores. Das gravações captadas na cabine, percebe-se que quando o avião começou a desobedecer aos pilotos e a balançar para baixo, o piloto entregou os comandos do avião ao seu copiloto e folheou o manual da aeronave à procura de uma explicação e de uma forma de evitar que o avião continuasse a descer. Nos últimos segundos da gravação, ouve-se um copiloto, rendido, a rezar. O avião caiu 12 minutos após levantar voo.

Segundo o The Guardian, que também cita as informações da Reuters, as gravações do cockpit mostram que ambos os pilotos procuraram num livro de instruções como controlar o avião que não parava “de cambalear para baixo” contra os seus comandos. Esse livro de instruções, soube o Observador, será na verdade um Manual de Ação Rápida (Quick Reference Handbook), que normalmente é consultado pelos pilotos para verificar se todos os procedimentos foram seguidos e ajudar na tomada de decisão do que fazer de seguida.

Os registos de voz captados no Boeing da Lion Air — que podem vir a ser libertados oficialmente — mostram que os problemas começaram dois minutos após a descolagem, quando o piloto reportou um “problema de controle de voo” ao controle do tráfego aéreo. O piloto e o copiloto examinaram então o manual contendo as listas de eventos anormais

O diálogo mantido pela tripulação de voo, que ainda retornou à torre de controle de tráfego aéreo em Jacarta, a capital da Indonésia, para pedir permissão para retornar ao aeroporto, sem sucesso, foi agora conhecida e não foi incluída no relatório preliminar ao acidente, conhecido em novembro. Os investigadores consideram, agora, que esta informação poderá ser útil, depois de se ter registado um outro desastre, envolvendo o mesmo modelo de avião, na Etiópia, a 10 de março, e em que morreram todos os 157 passageiros a bordo.

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Os investigadores disseram à Reuters que, no voo da Indonésia, piloto e copiloto se mantiveram calmos durante todos aqueles minutos do voo, só no fim o piloto de 31 anos, nascido na Índia, pediu ao copiloto que pilotasse para ele próprio consultar o manual. Ficou em silêncio. Nos últimos segundos da gravação ouve-se o copiloto, um indonésio de 41 anos, a dizer “Allahu Akbar”, a expressão árabe para “Deus é Grande”. O avião caiu logo de seguida.

“Acho que ele sabia que era irrecuperável”, disse Nurcahyo Utomo, chefe do subcomité de acidentes aéreos do Comité Nacional de Segurança em Transportes da Indonésia, que ouviu e descreveu o conteúdo do gravador de voz da cabine que foi retirado do fundo do oceano em janeiro ao The New York Times.

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À Reuters, três investigadores do acidente que ouviram as gravações lembram que os registos capatados nesta caixa-negra são fundamentais.. Esta é a chave para perceber tudo o que se passou no avião antes do acidente. Nela existem gravações de voz captadas no avião, incluindo na cabine, é registado todo o comportamento da aeronave, assim como o funcionamento de todo o aparelho.

É através da análise cuidada destas informações que os investigadores estão a tentar perceber várias questões. A primeira: como é que o computador do avião ordenou que ele se direcionasse à água, como resposta aos dados de um “sensor defeituoso”? Os investigadores concluíram no relatório preliminar que pode existir um diferencial de 20 graus entre as leituras dos dois sensores projetados para medir o Ângulo de Ataque da Aeronave e a velocidade, temperatura e altitude, tendo por isso acionado o sistema anti-stall (denominado sistema MCAS). O relatório inicial mostra que de repente o nariz do avião começa a balançar para baixo, um movimento que os investigadores consideram que pode ter sido causado pelo disparo incorreto daquele sistema MCAS automatizado no modelo Boeing Max — e pensado para compensar o tamanho dos motores a das asas deste novo modelo aéreo.

Os investigadores estão também a tentar perceber se existe também um problema de formação dos próprios pilotos ao tentarem lidar com este sistema. Segundo os investigadores, no avião da Lion Air, o piloto tentava que o avião subisse, mas o computador continuava a obrigá-lo a descer. Mas pelas gravações, os investigadores concluem que os pilotos não perceberam que o avião estava a descer automaticamente, só “pensavam na velocidade e na altitude”. Não terão sequer pensado na hipótese de ser o sistema MCAS, referem.

Na investigação também se quer perceber se os próprios manuais utilizados sobre o Boeing são claros.

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