Doze sociedades científicas e organizações de saúde portuguesas uniram-se numa posição conjunta contra os novos produtos de tabaco aquecido. Afirmam, em comunicado, que estão “fortemente preocupadas com o surgimento de novos produtos de tabaco”, mas não só. “As alegações da indústria sobre o risco reduzido destes dispositivos” também é fonte de preocupação para os especialistas de saúde.

Os especialistas recordam que os Produtos de Tabaco Aquecido (PTA) “produzem aerossóis com nicotina e outros químicos”.

A Tabaqueira, subsidiária da Philip Morris International (PMI) em Portugal,  já contestou esta posição, e reitera, que “mais de 20 estudos independentes e de organismos oficiais confirmaram já que o tabaco aquecido constitui uma melhor alternativa do que os cigarros convencionais para aqueles fumadores que não querem ou que acham que não conseguem deixar de fumar”.

O documento com a posição conjunta que contraindica o uso do tabaco aquecido, hoje revelado, foi assinado pela Sociedade Portuguesa de Cardiologia, a Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar e Sociedade Portuguesa de Estomatologia e Medicina Dentária, entre outras,  numa reunião entre os doze organismos que decorreu no passado dia 8 de março na Sociedade Portuguesa de Pneumologia, também subscritora da tomada de posição.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Os médicos e demais especialistas alertam que o principal objetivo continua a ser “promover medidas regulatórias que sabemos serem eficazes na redução do tabagismo e continuar a apoiar aqueles que desejem parar de fumar”, e por isso defendem que o debate sobre os novos produtos de tabaco aquecido não pode deixar esta questão para trás.

As doze sociedades científicas e organizações de saúde portuguesas, são perentórias ao afirmar que “não recomendam a utilização de produtos de tabaco aquecido”. Além disso, continuam a chamar a atenção para os seus riscos, bem como a manter a firme convicção de que “a melhor forma de salvaguardar a saúde humana é a prevenção da iniciação de qualquer forma de consumo e o apoio médico para cessação tabágica”.

As doze organizações contradizem a indústria do tabaco quando “afirma que há uma redução de 90-95% na quantidade de substâncias nocivas e na toxicidade dos PTA”, e defendem que grande parte destas alegações se baseia “em estudos publicados pela própria indústria, com conflitos de interesse evidentes”.

“Foram encontradas substâncias nocivas em altas concentrações nos seus estudos, como material particulado, alcatrão, acetaldeído, acrilamida e um metabolito da acroleína”, como consta do parecer, que reforça que estudos independentes encontraram concentrações mais elevadas de formaldeído em produtos de tabaco aquecido do que em cigarros convencionais.

Recordam ainda que “o primeiro estudo experimental comparando diretamente os efeitos do fumo de cigarro, vapor de e-cig e aerossol do iQOS mostrou que este último provoca o mesmo tipo de danos nas células pulmonares que o fumo de cigarro, mesmo em baixas concentrações”.

Da reunião e da posição conjunta saíram outras explicações acerca dos Produtos de Tabaco Aquecido (PTA):

  • O que são?

Afirmam os especialistas em saúde que os Produtos de Tabaco Aquecido (PTA), “frequentemente referidos pela indústria como “heatnot-burn”, são dispositivos eletrónicos com um pequeno cigarro contendo tabaco”. Assim sendo, “produzem aerossóis com nicotina e outros químicos que são inalados pelo utilizador”. Na prática, estes cigarros não são acendidos com combustão, mas sim através de uma máquina eletrónica.

  • São menos prejudiciais do que o tabaco convencional?

Segundo os especialistas clínicos, qualquer consumo de tabaco, por muito baixo que seja, “produz doença significativa”. Desta forma, “do ponto de vista de segurança e do risco para a saúde, atualmente não existe evidência que demonstre que os PTA são menos prejudiciais do que o cigarro convencional”. O facto de se afirmar que os PTA contêm menos tóxicos, também não é um argumento válido, porque isso “não
significa que se reduza o risco de doença”.

  • Porquê que os especialistas estão preocupados?

Porque tal como o tabaco convencional, os PTA “contêm nicotina, substância altamente aditiva que existe no tabaco, causando
dependência nos seus utilizadores”. O tabaco aquecido não contém só nicotina, também inclui “outros produtos aditivos
que não existem no tabaco e que são frequentemente aromatizados”.

Para os especialistas, há ainda outro aspeto a ter em conta “é que o uso dos PTA permite imitar o comportamento dos fumadores de cigarro convencional”, por isso, há “o risco de os fumadores alterarem o seu consumo para estes novos produtos em vez de tentarem parar de fumar”. Pior, quem fuma, corre ainda o risco de juntar um novo vício ao tabaco convencional, alternando o consumo entre os dois. Quem não fuma pode ter a “tentação” de fumar, e isto também se aplica a menores de idade, que podem considerar o uso do tabaco aquecido no início de hábitos tabágicos.

As doze sociedades científicas e organizações de saúde ainda consideram que este tipo de produto pode seguir o mesmo caminho dos cigarros eletrónicos, cuja experimentação atualmente “está a sofrer um crescimento exponencial e já se demonstrou que aumenta o risco de iniciação também no cigarro convencional e noutras drogas”.

O parecer foi assinado pela Sociedade Portuguesa de Pneumologia, a Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública, a Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar, a Confederação Portuguesa de Prevenção do Tabagismo, a Ordem dos Enfermeiros, a Sociedade Portuguesa de Angiologia e Cirurgia Vascular, a Sociedade Portuguesa de Cardiologia, a Sociedade Portuguesa de Medicina do Trabalho, a Sociedade Portuguesa de Oncologia, a Federação das Sociedades Portuguesas de Obstetrícia e Ginecologia e a Sociedade Portuguesa de Pneumologia Pediátrica e a Sociedade Portuguesa de Estomatologia e Medicina Dentária.

Tabaqueira contesta posição dos especialistas em saúde

A empresa, subsidiária da Philip Morris International (PMI) em Portugal, já reagiu em comunicado às preocupações tornadas públicas esta terça-feira por parte de algumas sociedades científicas e organizações de saúde face aos possíveis riscos do tabaco aquecido.

Para a Tabaqueira, “é inquestionável que a melhor opção se encontra sempre do lado da prevenção e da cessação do consumo de produtos de tabaco”. A empresa, que comercializa o dispositivo IQOS, também considera que “qualquer fumador adulto que tenha preocupações de saúde deve deixar de consumir quaisquer produtos de tabaco ou à base de nicotina”. Contudo, salienta que “existem inúmeras pessoas que não querem deixar de fumar”, ou que pretendem encontrar alternativas “com potencial de ser menos nocivas que os cigarros”.

Não sendo o tabaco aquecido “um produto inócuo ou isento de riscos”, como reconhece a PMI em Portugal, para estes fumadores esta é “uma melhor alternativa do que os cigarros”. A Tabaqueira defende que este argumento tem vindo a ser “amplamente comprovado por evidência científica independente e entidades oficiais”, como a Public Health England, a Food and Drug Administration americana e o Instituto alemão para a Avaliação do Risco, em mais de 20 estudos publicados.

A Philip Morris não tem dúvidas em afirmar que há “a existência de uma redução média entre 90 a 95% de constituintes tóxicos no aerossol que resulta do consumo dos novos produtos de administração de nicotina sem combustão, com ou sem tabaco, por comparação com o fumo dos cigarros”.

Citado no comunicado, Miguel Matos, Diretor-geral da Tabaqueira, considera que “é incompreensível que estas sociedades científicas não considerem estas opções de redução de risco como uma alternativa válida para reduzir a incidência de fumadores, à semelhança da estratégia que é seguida relativamente a inúmeros bens de consumo, como por exemplo, as bebidas açucaradas, as bebidas alcoólicas, a presença de sal em alimentos e a segurança rodoviária”.

Segundo a PMI em Portugal, na sequência do uso do tabaco aquecido “cerca de 7 milhões de fumadores no mundo inteiro, 200.000 dos quais em Portugal, deixaram entretanto de fumar, a um ritmo que antes nunca fora alcançado pelas políticas tradicionais de prevenção de tabagismo”.