O bispo do Funchal, D. Nuno Brás, descartou esta segunda-feira a criação de uma comissão para acompanhar casos de abuso sexual na diocese madeirense. Em declarações aos jornalistas à chegada à assembleia plenária dos bispos portugueses, que decorre em Fátima até quinta-feira, D. Nuno Brás disse que “em princípio” não vai criar nenhuma comissão — ao contrário do que fez o Patriarcado de Lisboa — “porque não existem casos que justifiquem isso” naquela diocese.

Questionado sobre o caso do padre Anastácio Alves, D. Nuno Brás disse a diocese continua sem saber do seu paradeiro e disse não estar a investigar o caso. “Aguardo a investigação da Polícia Judiciária. A PJ está a fazer investigações, por isso não vale a pena haver na diocese quem se substitua à PJ”, disse D. Nuno Brás aos jornalistas que o aguardavam à entrada da Casa de Nossa Senhora das Dores, em Fátima, onde os bispos portugueses estão reunidos.

O padre Anastácio Alves foi alvo de denúncias de abusos sexuais em 2005 e 2007. Das duas vezes acabou ilibado: na primeira vez, a vítima voltou inesperadamente atrás com a palavra; na segunda vez, o relato do menor que teria sofrido os alegados abusos não convenceu as autoridades. Mas, das duas vezes, a diocese madeirense nunca o investigou (apesar de o Código de Direito Canónico mandar investigar), limitando-se a mudá-lo — primeiro de paróquia, e depois de país.

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Em setembro do ano passado, o Diário de Notícias da Madeira noticiou que a diocese do Funchal afastou o padre Anastácio de funções no verão de 2018, após ter recebido uma terceira denúncia contra o sacerdote. Uma investigação do Observador publicada em fevereiro deste ano revelou os detalhes das duas primeiras denúncias contra Anastácio Alves e avançou os pormenores da investigação de que o sacerdote é alvo neste momento. Desde que saiu da paróquia portuguesa de Paris (onde prestava apoio pastoral aos emigrantes portugueses), Anastácio Alves desapareceu.

No mês passado, a diocese do Funchal afirmou ao Observador que “o paradeiro do padre Anastácio” continuava “a ser desconhecido” e que “o novo bispo [D. Nuno Brás, que tomou posse como bispo do Funchal em janeiro] pediu que” a investigação interna “fosse continuada”. Uma informação que acaba por ser contraditada pelas declarações de D. Nuno Brás esta segunda-feira aos jornalistas — quando questionado sobre se existia uma investigação interna, o bispo disse não querer substituir-se à PJ.

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Na altura, fonte oficial da diocese do Funchal disse mesmo ao Observador que o facto de o paradeiro do padre Anastácio Alves ser desconhecido era “uma das grandes dificuldades” da investigação interna, mas que esse processo iria avançar “mesmo sem a sua participação”. Ou seja, se fosse verdadeiramente impossível ouvir o sacerdote, o processo avançaria sem ter em conta a defesa do padre.

Os bispos portugueses estão reunidos entre segunda e quinta-feira na primeira assembleia plenária da Conferência Episcopal após a cimeira dedicada aos abusos sexuais que decorreu em fevereiro no Vaticano. Dessa reunião, na qual participou o patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, em representação da Igreja portuguesa, saíram indicações concretas que deverão ser aplicadas nos próximos meses. Os abusos são um dos temas centrais desta assembleia plenária, cujos resultados deverão ser conhecidos na quinta-feira.

Nos últimos dias, as dioceses de Lamego, Porto e Santarém também disseram não estar nos seus planos criar comissões especiais para estudarem o tema, ao contrário de Lisboa e de Setúbal.

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