A imagem do Príncipe William, por norma sempre muito reservado nas emoções – e euforias – públicas (pelo menos em comparação com o irmão, Harry), de chapéu e aos saltos depois da vitória do Aston Villa frente ao Derby County em Wembley que valeu o regresso à Premier League do conjunto de Birmingham ficou como retrato perfeito para a loucura pelo triunfo dos villans no encontro decisivo, apenas comparável com as celebrações de John Terry, agora adjunto do técnico Dean Smith (que rendeu Steve Bruce a meio da época), como se nunca tivesse ganho qualquer prova ou final – logo ele que, ao serviço do Chelsea, somou 17 títulos, entre os quais cinco Campeonatos, uma Liga dos Campeões e uma Liga Europa. No entanto, é do capitão da equipa vencedora que se fala. E Jack Grealish, de forma direta ou indireta, também faz (e fez) por isso.

O triunfo do Aston Villa na partida que servia também de reencontro entre Terry e Frank Lampard, agora treinador do Derby County (e que esta semana foi apontado como possível sucessor de Maurizio Sarri no Chelsea), foi o epílogo perfeito para uma equipa habituada a estar na Premier League que passou um pouco de tudo ao longo da temporada: alguns problemas financeiros pela não subida na época anterior que colocou em causa a permanência de alguns jogadores; a venda do clube por parte do chinês Tony Xia aos bilionários Wes Edens (americano) e Nassef Sawiris (egípcio), fechada pouco antes do início da temporada; a troca de treinador depois de um mau arranque, com o cotado Steve Bruce a ser substituído em outubro pelo menos mediático (e fã assumido do clube) Dean Smith; um dérbi de Birmingham com invasão de campo e agressão a um jogador; a troca de capitão, com James Chester a passar a braçadeira para Jack Grealish. No final, tudo acabou por funcionar.

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Com apenas 23 anos, também Grealish já viveu um pouco de tudo no futebol. Bisneto de um antigo jogador do Aston Villa que chegou a ser internacional e ganhou uma final da Taça de Inglaterra em 1905, o médio ofensivo nascido em Birmingham com grande parte da família irlandesa – o que fez com que representasse a Rep. Irlanda até aos Sub-21, passando a partir daí para a seleção de Inglaterra – teve uma infância marcada pela morte prematura do irmão mais novo e pela ligação ao clube desde os seis anos, numa espécie de escape naquela que desde pequeno se transformou numa segunda casa. Nunca teve contrato com outro clube, passou por todos os escalões dos villans e ganhou o primeiro troféu em 2013, na NextGen Series (prova que representa o que é hoje a Youth League), tendo mesmo marcado no prolongamento da meia-final com o Sporting, treinado por Abel Ferreira e que tinha jogadores como Iuri Medeiros, Tobias Figueiredo, Rúben Semedo, Ricardo Esgaio ou Wilson Manafá.

Na estreia pela seleção inglesa Sub-21, depois de jogar pela Rep. Irlanda, Jack Grealish ganhou o Torneio de Toulon (Harry Trump/Getty Images)

Após uma temporada por empréstimo no Notts County, o médio ofensivo voltou para ficar no Aston Villa. Cada ano que passava, cada vez tinha maior influência na equipa, ao ponto de estar com pé e meio no Tottenham no último verão, num negócio que acabou por cair (com Mauricio Pochettino a culpar também o Brexit pela falta de reforços). Em paralelo, em cada ano que jogava havia sempre uma polémica fora das quatro linhas: em 2014/15, foi advertido pelo técnico Tim Sherwood por ter sido fotografado a inalar óxido nitroso, o famoso gás hilariante; em 2015/16, esteve a treinar na equipa B algum tempo no seguimento de uma noitada após uma goleada sofrida frente ao Everton; em 2016/17, foi suspenso em termos internos por três jogos depois de uma festa num hotel em Birmingham de madrugada que só terminou com a chegada da polícia devido ao barulho.

Jack Grealish foi agredido por adepto no relvado, continuou em campo e decidiu dérbi de Birmingham

Hoje com 23 anos, Graelish errou mas foi aprendendo com esses lapsos, nunca deixando de ser especialmente acarinhado pelos adeptos do Aston Villa por ter ligação ao clube via bisavô e desde miúdo. Esta época, três anos depois da descida, foi um elemento fundamental para garantir o acesso à Premier League e com um mês de março particularmente simbólico nesse percurso: após ter sido agredido por um adepto no decorrer do dérbi fora com o Birmingham, que já antes registara momentos de tensão fora do estádio, marcou o golo que decidiu esse jogo após um calvário de três meses por lesão e passou a ter a braçadeira de capitão uns jogos depois, condição que manteve até ao encontro decisivo frente ao Derby County esta segunda-feira.

Agora, exibição à parte, o jogador que recebe um salário semanal de 30.000 euros destacou-se em Wembley pelas chuteiras a desfazerem-se com que entrou em campo. “Quando voltei da lesão [março] estava a estreá-las e com elas consegui marcar golos e algumas assistências. Pensei que eram as minhas chuteiras da sorte e, por isso, tive de as guardar”, explicou à Sky Sports após a festa que juntou o Aston Villa aos também históricos Norwich e Sheffield United nos clubes que conseguiram subir à Premier League. Podendo ou não ficar nos villans para a próxima época, Grealish aumentou o seu legado no único clube que conheceu até hoje. E ainda teve um azar pelo meio, ao sofrer um corte no sobrolho no momento em que se levantava a taça…