A União Astronómica Internacional (UAI), organização que reúne milhares de astrónomos, faz 100 anos no domingo e tem aos comandos a portuguesa Teresa Lago, que quer os cegos a “verem” as estrelas e a astronomia nas salas de aula.

A astrónoma é secretária-geral da UAI, cargo mais importante da instituição, para o qual foi eleita pelos pares em agosto de 2018 e que assumiu por entender que a organização deveria ter “um papel mais interventivo”, apontando a inclusão como um dos desígnios.

“Inclusão no sentido de partilha e acesso ao conhecimento”, afirmou, em declarações à Lusa, a propósito do aniversário da UAI, que foi fundada em 28 de julho de 1919 para “reatar a colaboração internacional na investigação em astronomia” no pós-I Guerra Mundial (1914-1918), que deixou “uma Europa dilacerada, antagonizada”.

Portugal aderiu à organização em 1924 e é um dos 82 países com assento na Assembleia-Geral e com direito de voto na eleição da direção e em matérias como o plano de atividades e o orçamento. O financiamento da UAI – que tem sede em Paris, França, e escritórios em outros pontos do mundo – é assegurado pelos países-membros e por fundações privadas.

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Além dos “membros nacionais”, em que os países são representados por uma instituição (no caso de Portugal é a Sociedade Portuguesa de Astronomia), a UAI tem “membros individuais”, mais de 13.000 astrónomos profissionais de 107 nações, incluindo 77 portugueses.

A missão para a qual foi criada a UAI, a de “estimular a colaboração internacional” na investigação científica em astronomia, mantém-se como “primeira prioridade”.

Contudo, mais recentemente, novos alicerces foram acrescentados: a comunicação com o público, a educação e o desenvolvimento de regiões ou países menos ricos, tendo por base, sempre, a astronomia.

A UAI promove, desde 2008, a formação de astrónomos profissionais em países com poucos astrónomos, através de cursos intensivos destinados a jovens mestres ou doutorados, e publica um jornal, a partir de Tóquio, no Japão, com notícias para o público “mais alargado” e para os astrónomos amadores. Todo o trabalho é feito voluntariamente.

Teresa Lago pretende criar, até ao fim deste ano, um departamento que promova junto dos governos a inclusão da astronomia no ensino, como conteúdo de aprendizagem no campo das Ciências ou das Letras.

A inclusão passa também pelo acesso das pessoas com deficiência à informação, que preveja por exemplo para cegos livros em braille, exposições com modelos táteis de planetas e a tradução sonora das observações do céu feitas no momento.

“São coisas que ainda estão muito no começo”, disse a astrónoma portuguesa, que, quando acabar o seu mandato, em 2021, não quer deixar “questões arrumadas, mas revolucionadas”.

Em 2006, a União Astronómica Internacional saltou para as páginas dos jornais ao despromover Plutão para planeta-anão, passando o Sistema Solar a ser constituído por oito planetas (Mercúrio, Vénus, Terra, Marte, Júpiter, Saturno, Urano e Neptuno).

A UAI é a entidade que reconhece oficialmente a atribuição de um nome a um corpo celeste, como um planeta, um asteroide ou uma constelação, e define as constantes físicas e astronómicas fundamentais e a nomenclatura astronómica.

Para Teresa Lago, a despromoção de Plutão foi um “detalhe técnico”. A UAI “vai muito para além disso”.

A organização tem alertado, ultimamente, para a “urgência de proteger” o céu noturno, cuja observação, em seu entender, estará ameaçada pelo lançamento de constelações de pequenos satélites de comunicações.

“Isso poderá pôr em perigo o avanço da astronomia e o conhecimento do Universo”, sustentou a secretária-geral da UAI, que associa os “novos desafios” da astronomia à tecnologia.

“Vemos mais em detalhe e mais longe”, assinalou, referindo-se aos telescópios na superfície da Terra e no espaço, que hoje têm resoluções de imagem maiores e permitem observar a luz emitida por galáxias, estrelas e planetas em comprimentos de onda eletromagnética distintos.

Sinais dos tempos. Quando a União Astronómica Internacional foi fundada, lembra Teresa Lago, “o conceito de Universo praticamente não existia e a sua dimensão era desconhecida”.

“As observações eram feitas no ótico [com telescópios óticos] e registadas em chapas fotográficas”, enfatiza.