Quatro meses depois do incêndio que destruiu parte da catedral de Notre Dame, em Paris, os níveis de contaminação com chumbo nas zonas à volta da estrutura continuam a gerar preocupação e várias associações e sindicatos falam mesmo no perigo de uma “catástrofe sanitária”. De acordo com o Le Parisien, que cita uma investigadora da associação “Henri Pézerat”, entre 26 de abril e 15 de julho a Agência Regional de Saúde fez 51 análises à atmosfera nas imediações da catedral e foram detetadas 31 situações perigosas, com um aumento de 10 a 12 vezes superior às normas habituais.

Annie Thébaud-Mony critica a passividade do governo de Emmanuel Macron e da presidente da Câmara de Paris, Anne Hidalgo, relativamente à situação, após o incêndio de 15 de abril ter libertado várias toneladas de chumbo. “Os dias passam e desconhecem-se as decisões que deveriam ou podiam tomar”, afirmou a investigadora, argumentando que “a contaminação com partículas de chumbo ainda está presente” e que “é necessário fazer algo para proteger quem trabalha dentro da catedral, sem esquecer quem vive e trabalha nas imediações: comerciantes, responsáveis pela segurança, etc.”.

Nuvem tóxica com chumbo contaminou vizinhança do Notre Dame após o incêndio. Governo ocultou dados

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Os dados das amostras indicam que os valores de poluição no solo são extremamente altos na Île de la Cité e no átrio da catedral, bem como no 5.º e 6.º distrito. As associações defendem a necessidade de realizar uma “monitorização periódica” que permita acompanhar a evolução da poluição enquanto o local da obra estiver aberto. “Cada vez que há uma rajada de vento, podemos imaginar a poeira nas pedras que se instala em Paris”, refere ainda a investigadora.

No dia 25 de julho, as obras na catedral foram interrompidas para uma revisão das regras de prevenção dos trabalhadores que estão expostos a estes resíduos de chumbo e deverão ser retomadas na próxima semana. Este recomeço, afirmou Benoît Martin, da União Departamental da Confederação Geral do Trabalho (CGT), não agrada às associações, uma vez que consideram haver o risco de todas as pessoas que passam e trabalham em locais próximos à catedral, como escolas e restaurantes.

O ABC diz mesmo que as várias associações denunciam um risco de “catástrofe sanitária”. Duas escolas situadas no mesmo bairro que a catedral chegaram a ser encerradas no final de julho como medida de prevenção devido à alta concentração de chumbo. Anne Souyris, secretária adjunta da Câmara Municipal de Paris, admitiu em entrevista ao Le Parisien que “apesar dos trabalhos de limpeza, a contaminação continua muito significativa” e que esta semana vai ser iniciada uma nova operação de descontaminação, “com meios muito menos clássicos”.

Mas nem todos estão de acordo com a ideia de que o risco de contaminação está a aumentar. Para o arcebispo Monsenhor Chauvet, os operários que trabalham na reconstrução da catedral “não se encontram em risco” e confinar a catedral “não se contempla de forma nenhuma”. “Todos fazem exames sanguíneos para conhecer os níveis de chumbo e posso dizer que não estamos contaminados”, referiu o arcebispo em entrevista à rádio Europe 1, citado pelo G1.

De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisa e Segurança, órgão governamental francês, a exposição prolongada a níveis tão altos de chumbo “pode ter consequências graves para a saúde”, como neuropatias — quando os nervos deixam de funcionar corretamente — ou encefalopatias — alterações que conduzem a infeções no encéfalo. O Instituto Nacional de Pesquisa Médica e de Saúde, outro instituto público francês, até acrescenta que episódios como este podem causar cancro nos 30 anos seguintes à exposição.