Pelo menos 17 bebés em Espanha ficaram com “síndrome de lobisomem” depois de terem tomado um medicamento para problemas no sistema digestivo (o Omeprazol) que tinha, afinal, um produto destinado à prevenção da queda de cabelo. Os casos foram detetados em vários locais de Espanha — 10 bebés afetados em Cantabria, quatro em Andaluzia e três na comunidade de Valência — e caracterizaram-se por um crescimento desmesurado de pêlo em todas as partes do corpo das crianças, conta o El País.
Tudo começou a 11 de julho, quando a Agência Espanhola de Medicamentos e Produtos de Saúde (AEMPS), após ter conhecimento de alguns casos de bebés afetados, ordenou a retirada de vários lotes com o princípio ativo de omeprazol que foram distribuídos pela empresa Farma-Química Sur S.L. às indústrias farmacêuticas que fabricam medicamentos com esse componente. Neste caso, o princípio ativo foi fabricado na Índia, mas em vez de ser omeprazol era, afinal, minoxidil, um componente utilizado para estimular o crescimento de cabelo em pessoas com alopecia.
A procura teve início depois de o Sistema Espanhol de Farmacovigilância de Medicamentos de Uso Humano ter alertado a AEMPS para vários casos de crianças que desenvolveram hipertricose — crescimento anormal de pêlos em todo o corpo — e que tinham em comum o facto de terem todas tomado Omeprazol Proclor, um medicamento utilizado para problemas no sistema digestivo. Os problemas só se verificaram na versão deste medicamento para crianças.
Depois de ser analisada uma amostra do lote em questão, as autoridades detetaram minoxidil onde deveria existir omeprazol. No total, foram detetados 22 lotes, que foram imediatamente retirados do mercado. “Analisou-se o lote original de omeprazol a granel que veio da Índia e os resultados mostraram que estava em perfeito estado. O problema estava no fracionamento em lotes mais pequenos que também foram vendidos a granel. Houve uma grande confusão no processo. Não é que o omeprazol tenha sido misturado com minoxidil, mas o folheto dizia uma coisa e o fármaco era outro”, explicou uma fonte ao El País.
“A testa, bochechas, braços, pernas e mãos do meu filho estavam cobertas de pêlos. Ele tinha as sobrancelhas de um adulto. Foi muito assustador porque não sabíamos o que estava a acontecer com ele”, conta ao mesmo jornal Ángela Selles, mãe de uma das crianças afetadas. Uriel tinha seis meses quando as mudanças começaram preocupar os pais.
Já Malte, conta o El Español, começou a tomar Omeprazol desde o primeiro mês de vida por problemas no refluxo gástrico. Como ainda não podia tomar o medicamento em forma de cápsula, como é habitualmente vendido, a bebé tomou-o em xarope. Até que os pais de Malte começaram a verificar que algo de estranho se passava com a menina: começaram a nascer pêlos escuros em demasia nas várias partes do corpo, incluindo no rosto.
Os casos foram denunciados pelo Ministério da Saúde, uma vez que as autoridades acreditam que os lotes trocados podem ter chegado a cerca de 30 farmácias de Andaluzia. Os pais de crianças que tomaram este medicamento nos últimos meses devem dirigir-se a uma farmácia para garantir que o lote do medicamento que utilizaram não é um dos que foram marcados como trocados ou contaminados. Como resultado deste problema, a Farma-Química Sur S.L. suspendeu o registo de atividades de fabrico, importação ou distribuição de princípios ativos farmacêuticos.
Sobre as crianças afetadas, as autoridades disseram ainda que a situação deverá voltar ao normal depois de pararem de tomar este fármaco que foi trocado.
Portugal “não dispõe de lotes contaminados”, garante Infarmed
Depois da divulgação dos casos, a Autoridade Nacional do Medicamento (Infarmed) garantiu esta quarta-feira em comunicado que a “contaminação do medicamento omeprazol, em Espanha, não se coloca no nosso país”. De acordo com a mesma entidade, o Infarmed já se tinha prevenido para a situação em agosto, depois de receber o alerta da agência espanhola que divulgou pela rede europeia de agências do medicamento.
“Este procedimento é o comum neste tipo de situações, de forma a que as entidades competentes atuem num curto espaço de tempo”, acrescenta a nota enviada. O Infarmed confirmou ainda “não existirem medicamentos aprovados em Portugal pelo fabricante daquele medicamento” e, por isso, o país “não dispõe de lotes contaminados”.