O SummerCEmp não é um festival de música de verão, mas pelo nome até podia e o ministro da Educação logo começou por perguntar aos 40 estudantes universitários, que por estes dias estão em Monsaraz a debater a Europa, se tinham ido a Paredes de Coura este ano. Metade levantou o braço e Tiago Brandão Rodrigues sorriu e fez as contas: “São mais do que no ano passado”. Raio-x feito pelo governante da terra, uma terra perto da fronteira que foi o primeiro contacto que teve com ser europeu: “Ir a Espanha era ir à Europa”.

Brandão Rodrigues viveu fora muitos anos: deixou Cambridge para aceitar ser ministro. Desafiado a dizer “sim” ou “não” sobre se aceitaria um convite de António Costa para continuar a ser ministro da Educação, o governante admitiu um segundo mandato: “Eu sempre me sinto motivado para servir. Para servir e fazer serviço público”.

Tiago Brandão Rodrigues recordou que foi isso que aconteceu há quatro anos: “Foi por isso que quando me sentia motivado para estar, para servir e fazer serviço público como cientista, numa altura da minha vida em que tudo me corria, e isso é dizer muito, de feição, e tinha todos os graus de liberdade para ficar por lá, por Cambridge, onde tinha uma vida fantástica, estava na Disneylândia dos cientistas e onde era feliz. Depois de ter os graus de liberdade para dizer que não. Disse que sim. Por isso, eu nunca disse que não“.

E o moderador insistiu: “Então agora ficou preso?“. O ministro respondeu que até ganhou “graus de liberdade também principalmente  por entender este país com muito mais plenitude e poder ter a oportunidade de fazer serviço público”.

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O discurso perigoso sobre “os malandros do ensino profissional”

Falou de Portugal como um país onde “não há igualdade de oportunidades à partida” por um lado, e onde o ensino profissional não pode ser “uma via periférica”, por outro. Quantos destes 40 alunos fizeram o secundário numa escola profissional? Nenhum braço no ar.

Sem dúvidas de que há quem olhe para “os malandros do ensino profissional que vêm roubar as nossas vagas”, o ministro pediu “cuidado com esse tipo de discurso”. E assumiu: “Acredito na discriminação positiva quando é necessária”. Uma “via de ensino de corpo inteiro”, reforçou Tiago Brandão Rodrigues. Os jovens com esse tipo de percurso “têm uma vantagem clara relativamente a vocês: dupla certificação académica”.

As universidades e os politécnicos “estão ávidos” de receber esses alunos, garantiu. Mas apenas 13 a 14% destes estudantes estão a seguir para o ensino superior. Falta “criar condições”. Ficou para segundo plano num “conjunto de governos” anteriores, argumenta: “É importante dizer que este é o resultado disso”.

E demora até mudar o paradigma: “Muitas vezes em turmas do ensino profissional, os alunos com quem contacto são os primeiros da família a fazer o ensino secundário”. Levará “cinco gerações para subverter o determinismo da condição social”. O ministro defende “uma igualdade de oportunidades à saída, tentando mitigar essa diferença” .

Alerta jornalistas: “Temos aqui parangona”

Outros problemas já serão mais difíceis de resolver. À queixa de uma universitária sobre a falta de formação de alguns professores catedráticos em pedagogia, o ministro virou editor de jornais: “Temos aqui parangona [manchete] se estiverem aqui jornalistas”. Ficou dada a confirmação: “É verdade que não necessariamente alguém com capacidade técnica e científica dará um bom professor”.

Daí a ser obrigatória formação adicional, “muito dificilmente acontecerá, pelo menos a curto prazo. Noutras sociedades acontece. Mas é uma boa discussão”.

Outro bom debate será a forma de avaliar a aprendizagem. Brandão Rodrigues critica o “peso excessivo” dos exames e da avaliação contínua. “Cada cabeça sua sentença” nas universidades. “Têm de começar essa discussão”.

Foi o que não faltou em quase hora e meia de debate. O ministro respondeu, interrompeu, foi interrompido… viu um estudante interromper a pergunta de outro: “Coup d’état…. Isto em francês chama-se golpe de Estado”. Espicaçou os alunos, deu-lhes luta. Esquivou-se também. Depois de ter defendido as ilhas, acabou por remeter problemas insulares para outros. Um aluno dos Açores contou que participou num clube sobre a Europa, mas a professora que coordenava o clube tinha de repor depois as aulas associadas a deslocações. “Há uma coisa chamada autonomia regional… Deverias estar a falar com o secretário de Estado regional”.

Mil professores com menos de 30 anos em Portugal

São as estatísticas que o dizem – e são recentes – e sobre isso o ministro já responde: as escolas “não são caso isolado”, o problema é geral. “Toda a administração pública está envelhecida”. “Durante a troika, reduziu-se o número de professores em 20 mil. A educação foi excluída durante a troika”.

Houve mais Portugal e mais Europa neste encontro, mas também mais uma dúvida sobre pronúncia. O ministro da Educação foi professor de português por uns segundos. Depois de Paulo Sande, o assessor do Presidente da República, que ontem contou histórias para não adormecer durante a beer call, e questionou como é que se lê SummerCEmp, Tiago Brandão Rodrigues fez o mesmo… Não só questionou, como corrigiu: “Lê-se Summer Camp”. A organização diz que não. Ficou criada a gíria do “summercampês”. A palavra é do ministro.

Nota: Após a publicação desta notícia, o gabinete do ministro enviou um esclarecimento ao Observador a explicar que na intervenção no SummerCEmp o ministro não manifestou a vontade, de uma forma direta, de continuar no governo. Após o esclarecimento do executivo, às 13h28, o Observador alterou o título original da notícia que dizia que o ministro “quer” e “espera” integrar o governo. No registo de áudio, que o Observador voltou a ouvir, é claro que o ministro mantém a disponibilidade e abre a porta a continuar no governo num segundo mandato — como pode ser comprovado nas declarações que deram origem à notícia, e que o Observador transcreve na íntegra neste artigo.